Divergente não é lá um filme muito original. Tem elementos que
derivam de praticamente todas as narrativas fantásticas juvenis que apareceram
no cinema nas últimas décadas, bem como as convenções de cenários de
ficção-científica distópicos. Ainda assim seria possível que essa salada de
elementos preexistentes poderia funcionar bem se inserida em um universo
interessante e coeso com personagens carismáticos e bem construídos, mas
infelizmente isso não acontece.
O filme se passa na cidade de
Chicago em um futuro não especificado quando a sociedade passou a ser regida
por cinco facções que dividem a funções primordiais para o funcionamento da
cidade que passou a ser protegida por um enorme muro. No centro da trama está
Beatrice (Shailene Woodley), uma adolescente de dezesseis anos prestes a fazer
a escolha definitiva sobre qual facção irá integrar. Seu teste de aptidão
revela que ela é uma “divergente”, alguém capaz de assumir o papel de qualquer
facção e cuja potencialidade é considerada uma ameaça ao rígido sistema de
facções. Assim, ela tenta esconder de todos a verdade sobre si e entra para a
facção Audácia (na prática as forças armadas do local) porque...bem, porque parkour é legal e para que trama tenha
algumas sequências de ação, já que não
há nenhuma justificativa real para que a garota escolha esta em detrimento de
qualquer outra. Claro, é possível que isto esteja melhor resolvido no livro que
inspira esta obra, mas o filme deve se sustentar por conta própria e isso não
ocorre aqui, já que existem outros vazios além deste.
A trama se desenvolve de maneira
bastante previsível, com a protagonista sendo enviada para uma espécie de
escola não muito diferente do que já vimos em filmes como Harry Potter ou no recente O
Jogo do Exterminador onde aprenderá a ser uma membro da Audácia e fará
novos amigos e inimigos. Como acontece na maioria das distopias de
ficção-científica, ela inicialmente tentará esconder o fato de ser uma
divergente e tentará levar uma vida normal até perceber que é impossível viver
em um sistema tão rígido, acabando por integrar um movimento de resistência.
Já vimos tudo isso antes e, para
piorar, todo o universo que existe ao redor dessa trama é desprovido de
qualquer característica digna de nota. Nunca sabemos o que houve para a
sociedade ficasse do jeito que está, porque o sistema vigente existe ou que há
além da muralha, parece que os elementos apresentados aqui foram colocados
apenas para seguir os clichês e nada mais. A sensação que fica é que o universo
foi criado apenas para comportar a história contada aqui e não como um espaço
orgânico existe para além da protagonista. Se lembrarmos de filmes como o
primeiro Jogos Vorazes (2012), por
exemplo, veremos que lá temos uma construção clara de como funciona aquela
sociedade e como ela ficou daquele modo sem que precisemos ler o livro ou
assistir as continuações. A obra ainda tenta abordar temas como violência
contra menores e suicídio, mas eles passam tão rapidamente que não há realmente
qualquer construção em torno disso, parecendo mais uma tentativa vazia de
chocar.
Esse vazio também se verifica no design de produção já que os ambientes
do filme quando não são genéricos e impessoais parecem toscos e saídos de uma
produção de baixo orçamento, as armas, por exemplo, parecem feitas de plástico
vagabundo.
O filme ainda é prejudicado por
cenas de ação pouco inspiradas e demasiadamente burocráticas que raramente
conseguem criar uma sensação de tensão e perigo. Isso ocorre, em parte, pelo
fato de que muitas delas são apenas os treinamentos dos personagens, nas quais
sabemos que a protagonista não sofrerá nada grave, mas mesmo durante o clímax
do filme tudo segue sem empolgação. Os tiroteios durante o terço final são
estáticos e pouco empolgantes e o mesmo pode ser dito das lutas, que falham em
envolver.
A jovem Shailene Woodley até se
esforça para conferir um pouco de carisma à Beatrice, mas seu talento é
sabotado por um roteiro superficial e por diálogos que por vezes descambam para
o humor involuntário como a cena próxima ao fim em que ela tenta se proteger
dos tiros dos inimigos e grita “Parem!”
ao ver que sua mãe foi baleada, como se os antagonistas fossem simplesmente
parar e dar um tempo para que ela pudesse verificar o bem estar da aliada. O
mesmo pode ser dito da veterana Kate Winslet que até consegue conferir uma aura
fria e ameaçadora à sua Jeanine, mas não tem muito com que conseguir fazer a
personagem ir além do clichê da vilã fascista genérica.
Divergente não é exatamente um filme ruim, mas é apenas uma reprodução
vazia, sem graça e esquemática de tudo que já vimos na ficção adolescente dos
últimos anos. Os fãs do livro certamente conseguirão apreciar, mas os não
iniciados tem pouco o que aproveitar aqui.
Nota: 5/10
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