As cinebiografias de músicos tem
sido um formato bastante explorado pelo cinema comercial brasileiro e é fácil
entender os motivos. De um lado temos o apelo popular de suas canções que serve
para chamar a atenção da audiência e de outro temos a curiosidade de público em
saber mais sobre os bastidores da vida dessas celebridades. Baseado no best-seller escrito por Nelson Motta,
este Tim Maia talvez seja o melhor
dentre este recente ciclo de cinebiografias.
Ao longo do filme acompanhamos a
trajetória do cantor e compositor Tim Maia (Robson Nunes e Babu Santana) de
seus primeiros esforços para formar um conjunto musical ainda na juventude,
passando por sua ascensão ao sucesso e os problemas de seus últimos anos. É uma
narrativa bem tradicional e comum para esse tipo de filme, mostrando os anos de
formação, a chegada do sucesso, os amores e a decadência, mas a trajetória de
Maia é tão repleta de eventos pitorescos e sua personalidade é tão singular que
até ignoramos o fato de que estamos diante de uma estrutura narrativa tão
padronizada.
Além disso, evita a tradicional
armadilha desse tipo de filme que é passar tão rápido pelos marcos da vida do
biografado que mal temos tempo de nos envolver com o que acontece. Com suas
duas horas e vinte de duração, temos tempo suficiente para entender o
personagem, suas motivações e as mudanças ocorridas em sua vida. Apesar disso,
não resiste a determinados vícios deste estilo, como tentar colocar outros
músicos contemporâneos ao biografado para aparecerem em cenas que pouco acrescentam
à obra, como aquela em que ele vai uma apresentação de Nara Leão (Mallu
Magalhães) apenas para gerar algumas gags
cômicas.
No entanto, ganha pontos por não
fugir da questão do preconceito racial da época, que é inerente à trajetória do
cantor. Afinal ele e Roberto Carlos (George Sauma) começaram juntos, eram ambos
talentosos, mas um se tornou estrela facilmente enquanto o outro precisou
passar por muitas tribulações para ser reconhecido. Afinal de contas, nos anos
50 (e no período de repressão da ditadura que veio depois) era muito mais fácil
para um branco bem arrumado e com jeito de bom moço (parecido com Elvis, como
ele mesmo diz no filme) ser aceito pelo público e alcançar a fama do que um
negro contestador e de personalidade forte como Tim Maia.
Isso fica claro pelo modo como
ele é tratado por seguranças e produtores no início de sua carreira, tanto que
em determinado momento um produtor lhe pergunta “vocês são uma banda ou uma quadrilha?”. Difícil imaginar que uma
pergunta dessas seria feita a uma banda só de brancos ou que Tim teria tantas
dificuldades de penetrar no meio artístico fosse outra a sua cor de pele, tanto
que sua subida começa justamente quando ritmos originados da cultura afro como
o funk e soul tornam-se mais “mainstream” e, portanto, mais maciçamente
aceitáveis pelo público geral e mais fáceis de vender.
Logicamente os excessos de sua
conduta também respondem por uma parcela de seus problemas em alcançar e manter
o sucesso. Nesse sentido o elenco é outro grande mérito do filme. Os dois
atores que vivem Maia captam muito bem sua personalidade debochada, malandra e
instável do cantor, além trazerem grande semelhança física, e carregam muito
bem a obra, acertando tanto nos momentos mais cômicos do personagem quanto
naqueles mais dramáticos. George Sauma se esforça para criar um retrato mais
naturalista e pé no chão de Roberto Carlos, no entanto sua composição derrapa
aqui e ali em maneirismos mais caricatos que parecem algo saído do Casseta e
Planeta ou do Pânico, mas como ele aparece relativamente pouco e esses arroubos
exagerados não são tão constantes, não chega a comprometer muito.
A reconstrução de época é muito
bem realizada, tanto nos figurinos quanto nos cenários das cidades brasileiras
e estrangeiras. O único problema fica por conta de algumas cenas musicais nas
quais percebemos com clareza a falta de sincronização entre a música e os
movimentos dos personagens, quebrando a ilusão que a dublagem deveria criar.
Ainda assim, Tim Maia é um filme envolvente que retrata com competência a
trajetória de uma das mais interessantes e controversas figuras da nossa
música.
Nota: 7/10
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