Seja
por falta de ideias ou pela certeza de retorno financeiro, a Disney tem
investido bastante em novas adaptações de contos de fadas e histórias famosas,
muitas delas já adaptadas anteriormente em animações, com resultados que vão do
minimamente aceitável, como Oz: Mágico e
Poderoso (2013), ao completamente execrável, como o Alice no País das Maravilhas (2010) cometido por Tim Burton.
Felizmente este Cinderela se destaca
acima dos demais e é certamente o melhor desse ciclo recente de novas
adaptações.
A
trama tentar se manter fiel ao conto com a jovem Ella (Lily James) sendo
explorada por sua madrasta, Lady Tremaine (Cate Blanchett), e suas duas
meio-irmãs, mas apesar dos abusos mantém sua personalidade gentil e bondosa.
Sua sorte parece mudar quando o príncipe Kit (Richard Madden) anuncia um baile
para todo o reino.No entanto, Ella precisará de ajuda se quiser ir ao baile.
O
filme investe em uma atmosfera fantástica desde o uso de uma paleta cheia de
cores saturadas, passando pelo design
dos castelos e paisagens que conferem uma natureza onírica aos ambientes e
figurinos. Ainda assim é louvável o esforço do diretor Kenneth Branagh em fazer
o máximo possível com cenários e ambientes físicos deixando a computação
gráfica preencher apenas aquilo que seria impossível realizar. Os efeitos
digitais em geral conseguem convencer, em especial com os ratos que acompanham
a protagonista. Assim, há uma constante sensação de encantamento diante de tudo
que acontece, inclusive diante da esperada cena com a Fada Madrinha (Helena
Bonham Carter), e o fato de conseguirmos nos deslumbrar com esta história mesmo
já sabendo o que acontece é uma evidência do senso de espetáculo preciso que a
obra possui.
O
roteiro tenta trazer novos elementos, mas luta contra a natureza e moral
arcaicas da obra original. Sim, esta Cinderela é menos passiva quantos aos
abusos e chega a confrontar sua madrasta sobre os maus tratos, no entanto ela
ainda é incapaz de resolver sozinha a situação e literalmente senta e espera
seu príncipe chegar para salvá-la. Sim, o príncipe se encanta mais com a
personalidade e valores da heroína que questiona a ordem social das coisas (ao
invés de apenas sua beleza, como se fosse um objeto a ser apreciado), mas ela é
quase que puramente definida por suas "prendas domésticas", normalmente
exaltadas como sua principal virtude, refletindo a ideia antiquada de que o
valor da mulher residiria em sua capacidade de cuidar de uma casa. O resultado
disso tudo acaba sendo um meio-termo que evita ser anacrônico demais ao mesmo
tempo que foge de um revisionismo mais crítico. Não chega a incomodar, mas é
menos progressista do que outros contos de fada recentes como Frozen: Uma Aventura Congelante (2013).
A
jovem Lily James consegue transmitir a natureza humilde e encantadora que se
espera de Cinderela, enquanto que Richard Madden consegue fazer de seu príncipe
um jovem monarca que sente o peso da responsabilidade que pende sobre seus
ombros e seu preocupa com o futuro de seu reino, não sendo apenas um galã
superficial. No entanto, quem rouba a cena é a Lady Tremaine de Cate Blanchett,
uma mulher altiva, mas cheia de malícia e tomada por ciúme e amargura. Sua
presença é genuinamente ameaçadora, cada instante que ela está em cena nos
deixa inquietos, temendo pela próxima maldade ou ofensa que sairá de seus lábios.
É possível compreender muito bem o que motiva seu comportamento e embora isso
não o justifique, a torna uma figura mais interessante já que entendemos que
ela é assim por saber que jamais será tão reconhecida ou virtuosa como a
primeira esposa de seu marido (afinal, é impossível competir com a imagem
idealizada de uma morta) e Cinderela representa um constante lembrete de tudo
que ela jamais será. Deste modo a atitude de rebaixar a enteada é seu modo
deturpado de mostrar que é realmente melhor e superior ao que sua antecessora
representava.
Assim
sendo, Cinderela é um encantador,
ainda que tradicional, conto de fadas, conseguindo manter aceso o deslumbramento e a magia que tornam este tipo de narrativa tão atraente.
Nota:
7/10
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