terça-feira, 10 de novembro de 2015

Crítica - Aliança do Crime



Desde o sucesso do primeiro Piratas do Caribe, Johnny Depp vem repetindo o mesmo tipo esquisito em praticamente tudo que tem feito ultimamente e público provavelmente está percebendo o piloto automático do ator dado o enorme fracasso dos seus três últimos filmes como protagonista (Mortdecai: A Arte da Trapaça, Transcendence: A Revolução e O Cavaleiro Solitário). Logicamente não estou considerando aqui trabalhos nos quais ele fez pequenas pontas, como o recente Caminhos da Floresta, mas ultimamente colocar Depp à frente de um filme tem sido uma aposta ingrata. O ator, no entanto, parece disposto a provar mais uma vez seu talento ao se transformar em um chefão do crime neste Aliança do Crime, a questão é que o filme não parece a altura de seu esforço.

Inspirado pela história real de James "Whitey" Bulger (Johnny Depp), mafioso que fez um acordo com o FBI para se tornar um informante, ajudando-os a eliminar seus competidores enquanto ficava livre para espalhar suas atividades, tornando-se um dos maiores criminosos de Boston em um período que vai dos anos 70 aos 90.

Irreconhecível graças à ótima maquiagem, Depp compõe Bulger como um homem intenso, violento e paranoico, que jamais baixa a guarda e reage com extrema brutalidade a qualquer menção de ameaça. Filmado constantemente em ambientes sombrios que fazem seu rosto pálido e magro parecer uma caveira, Bulger é uma presença ameaçadora não apenas por sua aparência, mas por seu intenso olhar penetrante e a cadência de sua fala que faz qualquer diálogo parecer uma ameaça.

Ao seu lado está Joel Edgerton como John Connolly, o agente do FBI que acoberta Bulger. Edgerton consegue aqui usar a própria canastrice a seu favor ao compor seu personagem como um escroque cara de pau que mente o tempo para seus superiores para encobrir as atividades do amigo. Completando o elenco temos Benedict Cumberbatch como Billy, irmão de Bulger e senador, e chama atenção a composição vocal do ator, que abandona seu habitual tom de barítono para adotar uma fala mais aguda e analasada, além de incorporar muito bem o sotaque da comunidade irlandesa de Boston.

Lamentável, porém, que a trama não esteja a altura do trabalho dos atores, já que constantemente salta de um evento a outro com grande distância temporal entre eles e enchendo a narrativa de diálogos expositivos, terminando por contar mais do mostra. O filme tenta construir Bulger como um gângster genial que manipulou o FBI e se tornou um grande chefão do crime com amplos negócios e influência, mas tudo que vemos ao longo do filme é ele espancando, matando, ameaçando pessoas ou vendendo artigos ilegais, sempre acompanhado dos mesmos três ou quatro capangas. Assim, mesmo o filme nos dizendo que ele uma espécie de rei do crime, ele passa o filme inteiro parecendo um bandido de bairro. Quais são exatamente os negócios dele? Quem são as pessoas que ele controla? Qual a extensão do seu império criminal?

A título de comparação quando assistimos O Gângster (2007), temos uma clara noção do que Frank Lucas faz, qual o alcance de seu negócio e qual o tamanho de sua esfera de influência e, portanto, compreendemos perfeitamente o que faz dele um poderoso e influente criminoso. Aliança do Crime passa batido por todas essas questões e ao invés de vê-lo como um brilhante e estratégico criminoso (que ele provavelmente era), apenas o enxergamos como um sádico brutal que deu a sorte de ter um amigo de infância no FBI para cobrir os rastros dele.

A amizade de Connolly com Bulger é outra questão problemática. O filme nos fala o tempo todo que o agente do FBI auxilia e acoberta o mafioso por algo que aconteceu na infância, no entanto nunca é dito exatamente o que é. Deste modo fica difícil crer na lealdade extrema de Connolly, que sacrifica sua carreira, seu casamento e até a liberdade por causa do amigo de infância. Teria sido melhor dizer logo quais as razões para tal ao invés da genérica "somos amigos de infância", afinal é preciso algo muito grave e específico para gerar essa fidelidade. Falando em relacionamentos mal trabalhados, a relação entre Bulger e sua esposa, Lindsey (Dakota Johnson, a Anastasia de Cinquenta Tons de Cinza), é outra cujo arco parece incompleto.

Depois que o filho deles tem um grave problema de saúde, o casal tem uma acalorada discussão de como proceder e então o filme pula anos adiante e uma narração diz o que aconteceu com o filho. No entanto nada é dito do destino da esposa, se eles apenas se separaram, se ele a matou ou qualquer outra coisa e assim sentimos que faltou um fechamento dessa relação. Ao longo do filme, vários personagens vão falando sobre como a perda de entes queridos foi atingindo Bulger, no entanto não vemos essa mudança no personagem, que parece o mesmo sádico paranoico do início ao fim.

Aliança do Crime nos traz a melhor atuação de Johnny Depp em muito tempo, mas falha em examinar de modo satisfatório a trajetória criminosa de "Whitey" Bulger e das pessoas que o seguiam, revelando-se uma narrativa excessivamente expositiva e difusa. Se a ideia é conhecer mais sobre "Whitey" Bulger, o documentário Whitey: United States of America v. James J. Bulger, que está disponível no Netflix, traça um panorama muito mais amplo e complexo sobre a história do criminoso e as questões que dela emergem.

Nota: 6/10

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