Eu confesso que às vezes é
difícil entender a lógica das distribuidoras brasileiras. Porcarias que nos
Estados Unidos são lançadas direto para home
video e execradas por público e crítica como o pavoroso Visões do Passado (2016) são lançados
aqui nos cinemas. Enquanto que bons e premiados filmes, como o caso do
excelente Ex Machina: Instinto Artificial
(2015) são lançados no Brasil diretamente em DVD de modo totalmente
displicente. O mesmo aconteceu com este The
Invitation, elogiado suspense da diretora Karyn Kusama (de Garota Infernal e Boa de Briga) que chega ao nosso país diretamente pelo serviço de streaming da Netflix.
A história acompanha Will (Logan
Marshall-Green), que recebe um convite para um jantar na casa da ex-mulher,
Eden (Tammy Blanchard), a quem não vê a dois anos. Chegando lá, Will descobre
que o jantar é mais do que um evento para reencontrar velhos conhecidos depois
de anos ausente, mas uma tentativa de apresentá-los a um culto ou seita ao qual
se juntou durante suas viagens para tentar afastar o trauma que se abateu sobre
ela e Will e acabou com seu casamento. Aos poucos, Will começa a suspeitar que
há algo errado com sua esposa e seu novo namorado, David (Michiel Huisman, o
Daario de Game of Thrones).
A premissa aparentemente simples
esconde uma multitude de camadas sob si. É uma história sobre a dificuldade do
luto e como não há uma maneira simples de lidar com isso, mas também trata de
nossa complexa (e complicada) relação com as religiões e o modo como muitas
vezes as usamos para preencher e esquecer nossos próprios vazios internos.
A tensão vai se construindo aos
poucos e com cuidado, dando pequenos indícios aqui e ali que algo errado pode
estar acontecendo naquela casa, da conduta de Eden e seu namorado, aos
convidados estranhos que eles trazem ou ao fato de quererem manter a casa
trancada. Para além da sensação de perigo iminente, a tensão também vem do fato
de durante boa parte do tempo não sermos capazes de ter certeza de onde a
ameaça realmente vem, já que num instante suspeitamos das intenções de Eden e
David para no seguinte considerarmos a possibilidade de que é Will quem não
está em seu juízo perfeito, implodindo sobre o peso das memórias dolorosas que
inundam sua mente ao retornar para sua antiga casa.
Há um jogo lento, mas bastante
hábil de manejo da tensão e relaxamento, construindo aos poucos as tensões
entre os velhos conhecidos e novos estranhos até que tudo exploda violentamente
no terceiro ato. O elenco é preciso em nos fazer crer que aquelas pessoas se
conhecem há um bom tempo e tem bastante intimidade entre si, do mesmo modo como
são capazes de dizer muito uns para os outros mesmo através de longos silêncios
e gestos. A confiança que o filme tem na inteligência e atenção de seu público
é outro ponto positivo já que muito não é falado ou mostrado explicitamente,
deixando os indícios para que o público seja capaz de preenchê-los ao seu modo.
Inclusive no angustiante e desolador desfecho que parece apontar para uma
sociedade tão afundada em suas próprias angústias e vícios que se dispõe a
qualquer coisa para eliminar de si os sentimentos que considera negativos.
Assim sendo, The Invitation não é apenas um eficiente suspense, mas um cuidadoso
estudo sobre luto, trauma e religião.
Nota: 9/10
Trailer
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