Com a Marvel/Disney e a DC/Warner
faturando em cima dos seus respectivos universos cinematográficos compartilhados, era natural
que outros estúdios também tentassem entrar para a festa e de algum modo
desenvolvessem um universo compartilhado para tentar explorar em múltiplos
filmes. A Universal resolveu remeter aos seus monstros dos filmes dos anos 30
para criar um universo povoado por poderosas criaturas. Este A Múmia seria o pontapé inicial deste
universo, mas o resultado está longe de ser um bom começo.
O militar Nick (Tom Cruise) está
em missão no Iraque, mas ao invés de seguir ordens prefere seguir uma pista que
pode levá-lo a valiosas relíquias que visa vender no mercado negro. Sua busca,
no entanto, o leva a um achado arqueológico sem igual, o sarcófago da princesa
egípcia Ahmanet (Sofia Boutella), que teria sido mumificada ainda viva depois
de matar a própria família. Com a ajuda da arqueóloga Jenny (Annabelle Wallis),
ele retira o sarcófago de sua tumba, mas no meio da viagem de avião, tudo dá
errado e eles caem em Londres. Com a múmia de Ahmanet à solta, Nick descobre
que foi escolhido por ela para completar um ritual sombrio interrompido
milênios atrás e o soldado precisa arrumar um jeito de detê-la para salvar a
vida.
Há um claro conflito interno na
trama entre contar a história de Nick e Ahmanet e a necessidade de apresentar
os elementos do universo maior. Em determinado momento, lá pela metade, o filme
simplesmente para todo o desenvolvimento da trama principal para nos apresentar
à organização liderada pelo Dr. Jekyll (Russell Crowe) e o que se segue é um
longo segmento no qual nada acontece e longas cenas explicativas se encadeiam
para ditar as regras e o funcionamento desse mundo de "deuses e
monstros" (um diálogo que foi tirado de A Noiva do Frankenstein de 1935). A sensação é algo como estar
dirigindo na quinta marcha em uma rodovia vazia quando de repente uma parede de
concreto surge do nada e você se espatifa completamente, já que o crescente
dramático é sabotado pela necessidade de parar a história para "construir
o universo". A ideia de um espaço compartilhado entre vários filmes
deveria trabalhar a favor da obra e não contra.
A narrativa tenta fazer de Nick
um personagem ambíguo, mas como o excesso de explanações acaba tomando o tempo
do desenvolvimento de personagem, toda possibilidade de nuance ou complexidade
vai para o ralo. Fica evidente que a ideia era fazer dele um tipo de
"canalha charmoso" tipo o Rick (Brendan Fraser) do outro A Múmia (1999) ou Indiana Jones, no
entanto como o material não sai da superfície e frases feitas sobre bem e mal,
o protagonista não consegue ser nada além de um mentiroso oportunista que calhou
de estar no lugar certo na hora certa.
Falta química à relação entre
Nick e Jenny e o envolvimento entre eles parece ocorrer por pura necessidade da
trama. Como não conseguimos acreditar ou torcer pela relação entre eles, a
escolha final de Nick acaba sendo esvaziada de peso e tensão dramáticas,
fazendo o clímax e o confronto final com Ahmanet soar incomodamente insosso.
Se o protagonista não é lá muito
interessante, a "criatura" também não é lá muito digna de nota. O
Imhotep vivido por Boris Karloff no A
Múmia (1932) original (e por Arnold Vosloo no filme de 99) tinha uma origem
trágica envolvendo um amor não vivenciado que nos fazia ter certa simpatia por
ele e compreender porque ele fazia o que fazia. Com Ahmanet isso não acontece,
uma vez que ela já é mostrada como uma homicida implacável ainda viva e agora
como múmia ela tem um objetivo vago e genérico de destruição generalizada. A
sua primeira aparição, ainda em sua forma decomposta, evoca o cinema de terror
com sua forma grotesca, desconjuntada, se arrastando de uma maneira não natural
e com os efeitos sonoros marcando o trincar e estalar dos ossos tentando se
encaixar. Depois de recobrar suas forças, porém, seu visual não tem nada muito
digno de nota, exceto as pupilas duplicadas. O mesmo pode ser dito do visual
genérico e pouco ameaçador do Mr Hyde (Russell Crowe). Os filmes de monstro da
Universal das décadas de 30, 40, 50 eram famosos pela sua inventividade,
criando visuais que se tornaram icônicos para suas criaturas e isso passa longe
deste filme.
As cenas de ação são
burocráticas, muitas vezes atrapalhadas pela câmera tremida e excesso de
cortes. Tom Cruise é famoso por fazer suas próprias cenas de ação, mas
capacidade física do ator acaba desperdiçada por essa ação fragmentada. A
exceção fica por conta da queda do avião em gravidade zero na qual ele tenta se
segurar em algo para poder sobreviver. Até mesmo a inevitável cena de corrida
(a maioria dos filmes de ação de Cruise tem uma longa cena dele correndo
freneticamente) soa como algo feito no piloto automático, não empolgando como
deveria.
Em alguns momentos A Múmia nos dá vislumbres da aventura
bacana que poderia ser, mas acaba soterrada por personagens sem carisma, cenas
de ação sem energia e uma construção de universo compartilhado que prejudica o
ritmo da trama.
Nota: 4/10
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