Quando escrevi sobre Interestelar (2014) mencionei que o
diretor Christopher Nolan estava criando uma armadilha para si mesmo ao fazer
filmes que trabalhassem com conceitos (temáticos e estruturais) cada vez mais
complexos ao ponto em que ele não conseguiria dar conta das próprias ambições.
Parece que ele percebeu que estava se perdendo em seus próprios maneirismos e
decidiu fazer algo mais simples com este Dunkirk
ao contar a história sobre a retirada das tropas britânicas das praias de Dunquerque
na França durante a Segunda Guerra Mundial.
A trama acompanha a retirada sob
diferentes pontos de vista. Vemos a perspectiva dos soldados na praia a espera
de resgate, seguindo o soldado Tommy (Fionn Whitehead) e seus esforços para se
manter vivo conforme as tropas aliadas vão sendo acuadas por soldados alemães.
Seguimos a movimentação dos barcos de resgate, incluindo embarcações civis, a
partir do navegador civil Dawson (Mark Rylance), que tenta chegar ao local da
batalha enquanto resgata soldados de outras embarcações naufragadas pelo
inimigo. Por fim, no ar seguimos o piloto Farrier (Tom Hardy) que tenta abater
os bombardeiros inimigos antes que eles afundem os barcos de resgate.
O filme segue a predileção de
Nolan por estruturar seus filmes com temporalidades diferentes. Se a trama dos
soldados em terra se dá ao longo de vários dias, os eventos em mar se passam ao
longo de um dia e os no ar ao longo de algumas horas. Parece complicado no
papel, mas é bem orgânico em tela e para o que se deseja com o filme, passar a
tensão e a busca pela sobrevivência, acaba funcionando. Se ele tivesse seguido
a cronologia linear dos eventos acabaria tendo que introduzir personagens
importantes como Dawson e Farrier nos minutos finais, o que prejudicaria o
fluxo da trama ao obrigá-la a parar para dar ao público o contexto de quem são aquelas pessoas.
Usando vários planos abertos, a
narrativa é competente em construir o senso de escala do conflito. Não só pelas
largas paisagens da praia ou do horizonte marítimo cheio de barcos, mas também
pelo uso de efeitos digitais e figurantes para dar a impressão do enorme número
de soldados que estavam acuados ali. A música, composta por Hans Zimmer,
contribui para o senso de desespero e desolação. O som (e é difícil dizer até
que ponto isso faz parte da música) também traz um constante tique quando Tommy
está cena e só para próximo ao fim do filme, como que tentando evocar o
constante estado de alerta do personagem e o incessante funcionamento de sua
mente enquanto lutava para sobreviver.
Chega a ser curioso que em meio a
todo esse conjunto de sons, o filme consiga passar vários minutos sem nenhum
diálogo. Seus personagens estão preocupados demais em avaliar os riscos ao
redor deles para aquelas tradicionais conversas sobre o que faziam antes da
guerra e a família que os aguarda ou discursos inspiradores sobre superação e mesmo sem saber muito sobre eles tememos por suas vidas porque o filme é competente em convocar a urgência da situação em que se encontram. Na
verdade, o maior encadeamento de diálogos acaba sendo entre os dois oficiais,
Bolton (Kenneth Branagh) e Winnant (James D'Arcy, o Jarvis de Agente Carter), tem um caráter
excessivamente explicativo conforme eles discorrem sobre as dificuldades
logísticas em
Em uma situação tão
desesperadora, os personagens muitas vezes são confrontados com escolhas
difíceis, como a tensa cena de Tommy e outros soldados no porão de um navio, ou
a decisão de Dawson e seu filho no modo como tratam um soldado traumatizado que
comete um erro fatal. As cenas de destruição que mostram as embarcações sendo
destruídas e os soldados em pânico contribuem para o senso de perigo constante
e não se furta a mostrar os soldados envoltos por chamas ou se afogando, ainda
que a ausência de uma violência mais explícita diminua um pouco o impacto
dessas mortes. A narrativa é esperta ao não tentar julgar as condutas extremas
dos personagens reconhecendo a precariedade da situação e o abalo psicológico
daqueles indivíduos que deixaram qualquer sofisticação de raciocínio para
apenas pensarem em se manterem vivos.
Assim sendo, Dunkirk é um grandioso e tenso drama sobre um grupo de pessoas
fazendo o melhor possível para sobreviver a uma situação limite, lembrando que
numa guerra as vezes a maior vitória é simplesmente sobreviver.
Nota: 8/10
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