Confesso que me aproximei deste Death Note sem conhecer muito do anime
ou do mangá que o inspirou. Não tenho, portanto, como falar sobre o quanto é
fiel ou deixa de ser ao material original, mas mesmo para alguém que conhece
pouco da obra que inspirou essa produção original da Netflix o resultado não
foi muito positivo.
A trama se passa nos Estados
Unidos, na cidade de Seattle, e acompanha o jovem Light Turner (Nat Wolff) que
acaba ficando em posse de um caderno místico chamado Death Note. O caderno pode
matar qualquer pessoa cujo nome seja escrito em suas páginas, desde que o
usuário também conheça o rosto da pessoa. Light decide usar o caderno para
matar criminosos e acaba recrutando a colega Mia (Margaret Qualley) para
ajudá-lo. Para que as mortes não sejam ligadas a ele, Light decide adotar o
codinome Kira, que logo passa a ser celebrado e temido ao redor do mundo. Os
crimes de Kira chamam a atenção do genial detetive L (Lakeith Stanfield) que
decide parar seus crimes. Light decide parar um pouco de usar o caderno para
não chamar tanta atenção, mas Ryuk (Willem Dafoe), a criatura sobrenatural
responsável pelo caderno, o pressiona a continuar.
A narrativa claramente sofre com
o fato de ter que condensar dezenas de episódios em 100 minutos e corre para
alcançar os pontos principais da trama. Nem bem chegou à meia hora de projeção
e o nome Kira já é celebrado e temido no mundo inteiro. Não há tempo de
repercutir as ações dos personagens e fazer o público sentir o peso e o
significado das ações deles. As questões morais sobre justiça, vigilantismo e
vingança também são passadas rapidamente através de poucos diálogos que mal
arranham a superfície da questão. Em um dado momento Light chega a questionar
Mia de que talvez os fugitivos que veem na internet possam ser inocentes, um
questionamento interessante que abre uma ampla discussão moral, mas que o filme
imediatamente deixa de lado e não toca mais. Na verdade, o foco fica mais na
disputa de gato e rato entre Light e L, mas como L rapidamente conclui que
Light é Kira, não há muita tensão a ser encontrada nisso.
Inicialmente Light é concebido
como um jovem brilhante e cheio de raiva reprimida, funcionando como uma
motivação para que ele use o caderno. A questão é que a partir do momento em que
ele de fato começa a usar o caderno, essa aparente inteligência inicial se
perde e a impressão que fica é que Light é um tolo que não tem a menor ideia do
que está fazendo e só no clímax do filme ele parece estar usando sua inteligência para antecipar os adversários. Mia, por outro lado, é tão mal desenvolvida que soa como uma
mera sociopata sádica dada a facilidade e rapidez com a qual ela acredita em
Light e escolhe acompanhá-lo. O romance entre eles parece acontecer por pura
necessidade de roteiro, já que o texto nunca chega a explorar o que ela vê nele
ou vice-versa e assim o público não tem lastro para se importar com o
relacionamento entre os dois.
O elo mais fraco do trio de
protagonistas, no entanto, acaba sendo L. A culpa é menos do ator Lakeith
Stanfield (do excelente Corra!) e
mais do material que ele tinha em mãos. Eu entendo que os trejeitos exagerados
e postura misteriosa e "trevosa" faziam parte da persona de L no anime e mangá, mas nem tudo que é bacana nessas
mídias funciona quando transcritos para pessoas reais de carne e osso. Toda
aquela linguagem corporal cartunesca, os montes de doces que ele consome e sua
coleção de tiques o fazem mais ridículo do que intrigante. O filme é bem realista
em sua abordagem estética (no sentido de que parece algo que acontece no nosso
mundo) e a esquisitice de L acaba destoando de um modo negativo e o detetive
parece pertencer a uma obra completamente diferente. Ver um homem adulto sentar
de cócoras em cima de uma cadeira é uma imagem risível ao invés de uma postura
estilosa, diferenciada e "não conformista". Algumas cenas do
personagem inclusive soam diretamente inverossímeis, como o primeiro encontro
entre ele e Kira. É difícil aceitar que um homem mascarado entre em uma
lanchonete de uma grande cidade como Seattle e comece a gritar com um dos
clientes e jogar coisas pra cima sem que as pessoas ao redor se assustem,
corram ou chamem a polícia.
Se tem uma coisa que o filme
acerta é na escalação de Willem Dafoe para dar voz ao shinigami Ryuk. O ator
faz bom uso de sua voz áspera na composição de uma fala que soa carregada de um
tom de malícia jocosa que torna o personagem igualmente divertido e ameaçador,
fazendo suas cenas ficarem entre as mais marcantes do longa. As mortes
sangrentas e gráficas resultante do uso do caderno também rendem alguns
momentos impactantes, em especial quando Light pede a decapitação de colega.
No fim Death Note se revela uma adaptação decepcionante. O diretor Adam
Wingard, do fraco Bruxa de Blair
(2016), tinha um material promissor em mãos, mas ele é desperdiçado em uma
trama rasa e apressada permeada por personagens pouco interessantes.
Nota: 4/10
Trailer
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