São tempos difíceis para a
publicidade. Antigamente era certo de que as pessoas veriam ou ouviriam os
anúncios publicitários veiculados nos intervalos comerciais de rádio e
televisão e aqueles impressos em jornais. O consumo midiático migrou para
internet, com serviços de streaming
como a Netflix sem intervalos para publicidade e programas como Adblock que
bloqueiam desde pop-ups e janelas de
publicidade aos comerciais que passam no início dos vídeos de plataformas como
Youtube. A publicidade passou a ser um inconveniente a ser evitado. Como,
então, fazer publicidade em uma época na qual o consumidor foge dela como o
diabo da cruz? Este Emoji: O Filme
fornece uma resposta fácil para essa pergunta: simplesmente engane seu público.
Faça ele acreditar que está vendo uma narrativa de fantasia e aventura e então
despeje sem dó mensagens de consumo sobre ele.
Filmes feitos para venderem
coisas não são exatamente novidade. Uma Aventura Lego (2014) tinha o claro interesse de vender seus brinquedos, mas
fazia isso entregando uma narrativa genuinamente divertida e que lembrava do
valor do componente lúdico, cooperativo e imaginativo do ato de brincar. Emoji: O Filme, no entanto, sequer
parece se esforçar para encantar seu espectador, repetindo um monte de clichês
pouco inspirados e algumas frases de efeito cheias de sensos comuns para dar a
impressão de engajamento com uma determinada mensagem.
A trama é centrada em Gene (T.J
Miller), um emoji que deveria representar a expressão "meh", mas que
é capaz de exprimir muito mais do que a cara que foi designado para fazer.
Quando ele falha em expressar o "meh" no momento em que seu usuário,
Alex (Jake T. Austin), mandava uma mensagem para a menina de quem gosta, o
menino acha que seu celular tem um defeito e resolve levá-lo à assistência
técnica. Com medo que o garoto formate o aparelho, a Sorriso (Maya Rudolph),
chefe dos emojis, ordena que Gene seja deletado pelo antivírus para que Alex
deixe de pensar que o celular estava dando defeito. Como não quer ser deletado,
Gene foge de Textópolis com a ajuda do emoji Bate Aqui (James Corden) e busca
entre os demais apps do celular uma ajuda para corrigir seu problema.
O universo dentro do celular é
basicamente uma reciclagem de elementos de Detona Ralph (2012), Divertida Mente
(2015) e Tron (1982). É colorido e
vívido o bastante para chamar a atenção da garotada, mas por ser uma colcha de
retalhos de várias ideias de que já vimos antes e melhor concebidas, falta um
senso de novidade ou criatividade necessário para nos encantar ou deslumbrar.
Em nenhum momento da projeção temos aquela reação de "Nossa, que incrível!
Como pensaram nisso?" e sim "Já vi isso antes".
O humor consiste em trocadilhos
óbvios que fariam aquele seu tio, que sempre repete a velha piada do pavê nos
almoços de domingo, corar de vergonha. Um exemplo é quando Gene pergunta a um
trio de macacos qual o ramo de negócios deles e a resposta é um nada
surpreendente "macaquices" ou quando o emoji do Cocô (Patrick
Stewart) diz "eu sou o número 2!". Ao invés de fazer rir, o filme
constantemente provoca tédio e aborrecimento.
O miolo da narrativa consiste dos
personagens se escondendo entre diferentes aplicativos do celular, na grande
maioria das vezes com muitas falas que explicam o funcionamento de um
determinado jogo ou as funcionalidades de determinado programa. Quando eles
entram em um aplicativo de compartilhamento de arquivos, por exemplo, um
personagem é rápido em exaltar a segurança dele. É tudo tão inorgânico e
claramente feito para tentar vender essas marcas ao público que em muitos
momentos eu esperei que um letreiro aparecesse na tela informando algo como
"aplicativo x pode ser baixado
em dispositivos y e z". Boa parte desses segmentos,
como o que envolve um famoso jogo para celulares, podiam ser completamente
eliminados do corte final sem qualquer prejuízo à trama, deixando evidente que
estão ali meramente como informes publicitários.
Temas como "achar seu lugar
no mundo" e ensinamentos sobre o valor da amizade e da família, abordados
em 9 de cada 10 filmes feitos para o público infantil como Detona Ralph (2012), O Bom Dinossauro (2016), Operação Big Hero (2015), Turbo (2013) ou Aviões (2013), são aqui repetidos de
modo mecânico e sem brilho. Frases como "de que adianta alcançar seus
objetivos se você não tem amigos?" martelam de maneira pouco sutil as
mensagens e surgem em cena como se o roteiro apenas estivesse preenchendo um checklist de ideias que se espera
encontrar em uma animação feita para toda família para tentar disfarçar o fato
de que é uma publicidade insípida.
O mesmo pode ser tido das
tentativas de usar a emoji Rebelde (Anna Faris) para falar da falta de
representação feminina. A personagens fala palavras de ordem do tipo "as
mulheres não precisam ser só princesas ou noivas" ou "não preciso de
um príncipe encantado" fazendo parecer que o filme tem algo a dizer sobre
isso (e seria importante que dissesse), mas nunca sai da superfície dessas
frases que são lugares-comuns. Para piorar, apesar do discurso a personagem
termina se contentando em ficar em Textópolis e mantendo sua imagem de
princesa. O percurso dramático da personagem é diametralmente oposto ao seu
discurso. Sim, ela voltou para ajudar Gene, mas uma vez resolvido o problema,
nada a impedia de correr atrás de seus sonhos e voltar ocasionalmente para
visitar os amigos de Textópolis. Basta comparar o que é feito aqui com essa
personagem e a complexidade ou variedade de personagens femininas em animações
como Moana: Um Mar de Aventuras ou Smurfs e a Vila Perdida (ambas desse
ano) ou Frozen: Uma Aventura Congelante (2013), para ver como essas questões são trabalhadas de modo extremamente raso.
São usadas para dar a aparência de um engajamento, mas sem realmente
concretizá-lo.
O pior, no entanto, é como o
filme aborda (ou não aborda), a presença cada vez maior da tecnologia nas
nossas vidas e o modo como somos cada vez mais dependentes de smartphones. Em um dado momento os
personagens entram rapidamente no Facebook e há um comentário sobre como amigos
virtuais não são a mesma coisa que amigos reais. É algo que ouvimos
constantemente e dá a impressão que a narrativa irá questionar essa
digitalização da vida e o fato de passarmos mais tempo em nossos celulares do
que com pessoas reais. Isso, no entanto, não acontece, já que em nenhum momento
é posto em questão o fato do garoto Alex pensar em seu celular como a única
maneira de se comunicar com a garota da qual gosta, quase como se vivessem em
algum cenário distópico digno de Black Mirror no qual é necessário ter contato no mundo virtual antes de qualquer
interação no mundo real.
A centralidade do uso de recursos
virtuais nas interações humanas é tratado como um paradigma pétreo que nunca é
posto em questão e em nenhum momento ninguém sugere ou encoraja que Alex vá
diretamente falar com sua paixão já que seu celular não está funcionando
direito. Nesse ponto, o que o filme faz é mostrar o smartphone como a única alternativa viável para se aproximar de
alguém, o mediador-mor e inquestionável das relações humanas. Que um filme
voltado para o público infantil sequer questione a necessidade de se fazer
tudo, inclusive se comunicar com alguém que está ao seu lado, através de
aplicativos de internet é algo no mínimo negligente.
Há uma tentativa de exaltar o uso
dos emojis como forma de comunicação, algo evidente na cena em que o professor
explica como civilizações antigas, como os egípcios, se comunicavam através de
símbolos pictóricos. Nesse sentido, o discurso fílmico visa tratar o uso de
emojis como uma espécie de "retorno às origens", uma retomada à nossa
essência e uma forma de comunicação mais "pura". Seria um argumento
interessante se não fosse completamente furado. Os três roteiristas do filme
esquecem ou ignoram (o que é muito grave de qualquer maneira), que as letras
dos diferentes alfabetos (latino, grego, cirílico, etc), bem como ideogramas de
idiomas orientais (japoneses, chineses, etc) também são símbolos imbuídos de
significados que são usados para transmitir emoções, conceitos, ideias, estados
de espírito e tudo mais. Não há retorno ou resgate de coisa alguma, não há nada
de especial em relação aos emojis, que os torna uma forma
"diferenciada", melhor ou pior de comunicação. Claro, emojis não são
a mesma coisa que letras, mas ambos são sinais socialmente construídos e
compartilhados com finalidade comunicacional, mas a exaltação que o filme tenta
fazer aos emojis não faz o menor sentido.
Vazio, equivocado e sob certos
aspectos repreensível, Emoji: O Filme
não passa de uma publicidade cínica e conformista. Um filme que parece ter sido
concebido por executivos em uma sala de reunião e uma síntese de tudo que há de
errado no cinema hollywoodiano.
Nota: 1/10
Obs: Há uma cena adicional no meio dos créditos.
Obs: Há uma cena adicional no meio dos créditos.
Trailer
Um comentário:
Foi muito divertido. Não sou muito fã dos filmes de Columbia Pictures mas essa animação, que comecei a ver com baixas expectativas, é fantástica, um dos melhores em todos os aspectos pelos qual uma produção cinematográfica é avaliada. Acho que as imagens das animações são cada vez mais realistas e os personagens melhores caracterizados. Além, acho que a trama de Emoji tem uma história que fala de amor, amizade, família, etc. de uma maneira muito original e divertida, é um dos melhores filmes de animação não tem dúvida que o filme se tornara num clássico.
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