A temporada anterior de Crazy Ex-Girlfriend terminava com a
promessa de que o terceiro ano colocaria Rebecca (Rachel Bloom) para se vingar
de Josh (Vincent Rodriguez III) por tê-la abandonado no altar. A trama desta
terceira temporada começa praticamente no ponto em que a última acabou e seu
começo funciona como uma espécie de paródia de filmes como Atração Fatal (1987) e Fixação
(2002), mas não se limita a apenas fazer graça com esses clichês da
"mulher louca e vingativa", usando essa trama de vingança para fazer
Rebecca perceber seus reais problemas.
O percurso da vingança leva a
protagonista a perceber que ela não amava realmente Josh e sim a ideia que
fazia dele. Esse momento de virada a faz confrontar todos os excessos que
cometeu em seus relacionamentos e como ela sempre colocou sua felicidade como
dependente dessas relações idealizadas. É impressionante que apesar de todo o
seu bom humor, a série não se furta em tratar com seriedade os aspectos mais
sombrios da espiral de Rebecca ao fundo do poço, deixando clara a gravidade
representada por sua tentativa de suicídio.
Seria fácil demais para uma série
que é primordialmente uma comédia relativizar a depressão e conduta da
personagem, mas o roteiro acerta ao tratar o problema com a seriedade que ele
merece, mostrando que o caminho para a melhora de Rebecca é lento e irá
requerer uma boa dose de esforço e autoconsciência da parte dela. Mesmo diante
dessas questões sérias, o texto consegue encontrar momentos de leveza e humor
sem parecer que está menosprezando o problema, a exemplo do número musical com
a terapeuta de Rebecca, no qual a profissional tenta se convencer que as coisas
serão diferentes e a protagonista finalmente irá ouvi-la.
Além de Rebecca, os demais
personagens também se dão conta de seus próprios defeitos e problemas. Josh
finalmente percebe que vivia uma vida de comodismo e falta de perspectiva,
empurrando sua vida com a barriga sem fazer nada relevante com ela, algo pontuado
pela divertida canção Get Your Ass Outta
My House (algo como "Leve Seu Traseiro pra Fora da Minha Casa")
cantada pela mãe de Josh. Do mesmo modo, Paula (Donna Lynne Champlin) percebe
que todos os seus esquemas com Rebecca eram uma tentativa de fugir de uma vida
familiar da qual ela se sentia desconectada e tenta se reaproximar do marido e
dos filhos. Há ainda o arco de Heather (Vella Lovell) que precisa descobrir sua
identidade agora que terminou a faculdade e não é mais uma estudante.
A trama também resiste à tentação
de seguir adiante na jornada de cura da protagonista sem exibir consequências
pelo egoísmo e erros dela no passado, colocando a personagem para finalmente
admitir tudo que fez para as pessoas ao seu redor e deixando-a confrontar as
duras implicações de revelar a verdade. Se no meu texto sobre a temporada
anterior eu mencionava que ela enrolava demais para retratar o amadurecimento
emocional de Rebecca, essa daqui compensa esse problema ao colocá-la para
reconhecer sua conduta tóxica. Algumas decisões e desenvolvimentos da trama por
vezes soam gratuitos, como a decisão de Heather em aceitar ser a barriga de
aluguel de Darryl (Pete Gardner), que vem completamente do nada. Eu entendo que
a série tem um senso de humor calcado no absurdo, em comentários metaficcionais
e na excentricidade de seus personagens, mas mesmo assim incomoda um pouco como
certos elementos surgem sem nenhuma construção prévia.
Falando em senso de humor
absurdo, a série segue ótima em criar momentos de puro nonsense como o relato de Trent (Paul Welsh) sobre ter sobrevivido
um atropelamento e morado com os coiotes do deserto ou o número musical em
Darryl canta My Sperm is Healthy
("Meu Esperma é Saudável" em português), cuja melodia e construção
visual remetem ao clipe Me Too de
Meghan Trainor. Paula rouba para si alguns dos melhores momentos musicais da
temporada como em sua descrição gráfica de um parto em The Miracle of Birth (algo como "O Milagre do
Nascimento") ou quando ela reencontra seu primeiro namorado no número The First Penis I Saw ("O Primeiro
Pênis que Eu Vi" em português). A temporada também mantêm a verve paródica
dos números musicais a exemplo daquele que envolve Rebecca e o pai de Paula,
com Rebecca dançando e usando um figurino que lembra bastante os antigos filmes
de Shirley Temple, ou quando Nathan canta uma canção sobre o zoológico que
parece uma paródia de Hotline Bling do
Drake, exibindo uma melodia bem similar.
A terceira temporada de Crazy Ex-Girlfriend dá um passo na
direção correta ao colocar sua protagonista no caminho de evolução emocional,
conseguindo equilibrar seu bom humor com a seriedade dramática que a situação
requer. O gancho final desta temporada me deixou bastante curioso para o que
virá a seguir no quarto (e talvez último) ano da série.
Nota: 8/10
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