O diretor Steven Soderbergh tem
constantemente experimentado com gêneros, formatos e maneiras de filmar. Distúrbio, seu mais recente filme, por
exemplo, foi quase que inteiramente filmado com um iPhone 7 (em alguns momentos
também dá para perceber imagens captadas por drones). Poderia ser meramente uma estratégia publicitária da Apple
para promover seu produto, mas Soderbergh consegue criar um suspense
psicológico satisfatório dentro dessa proposta de filmar.
A trama acompanha Sawyer (Claire
Foy), uma mulher que recentemente mudou de cidade e está se acostumando ao seu
novo emprego. Sua mudança foi decorrente de ter sido vítima de um stalker e as marcas do trauma de ser
perseguida permanecem com ela ao ponto que a protagonista decide procurar ajuda
médica. Após a consulta com a médica, Sawyer é internada em uma clínica
psiquiátrica, descobrindo que alguns dos papéis que assinou durante a consulta
eram formulários de internação voluntária. Aos poucos, Sawyer começa a perceber
coisas estranhas acontecendo, pondo em questão se tudo aquilo é real ou fruto
de seu estado mental.
A narrativa apresenta várias
ideias interessantes no começo, como a crítica ao sistema de saúde mental e a
banalização dos diagnósticos de transtornos mentais para poder ganhar dinheiro
dos planos de saúde com internações. Também aborda as consequências duradouras
e sombrias de abuso psicológico e gaslighting
conforme Sawyer começa a ficar em dúvida se ela ainda está sendo perseguida ou
não. Essas ideias poderiam render um ótimo terror psicológico, mas tal como fez
em Terapia de Risco (2013), Soderbergh
prefere abandonar as reflexões críticas pelo meio do caminho, preferindo tecer
um suspense mais típico de uma mulher perseguida por um homem obsessivo.
Mesmo entrando por um território
mais “banal”, por assim dizer, o filme acaba funcionando pelo hábil manejo do
suspense e em como Soderbergh explora os poucos espaços da narrativa para criar
um sentimento de claustrofobia e opressão. Essa sensação é construída muitas
vezes pela câmera estar sempre muito próxima dos personagens, reduzindo os
espaços entre eles e deixando tudo sempre na nossa cara. A montagem abrupta
constrói uma impressão de tempos e espaços demasiadamente fragmentados, nos deixando
imersos na realidade desconexa da personagem e nos fazendo questionar se o que
ela está vivenciando é real ou está em sua mente.
Claire Foy é ótima em construir o
sentimento de confusão e indignação que toma conta de Sawyer conforme ela se vê
presa na instituição psiquiátrica sem entender o motivo de estar ali. A atriz
também é convincente em nos mostrar a instabilidade que a personagem carrega em
si como fruto de seu trauma. Há de se destacar também o trabalho do comediante
Jay Pharoah como um carismático e ambíguo interno que a todo momento nos faz
questionar se o sujeito é de fato são ou se ele está tão imerso em seus
próprios delírios ao ponto de ser completamente seguro de tudo que diz.
O desfecho acaba retornando a
alguns temas e ideias tratados no início, como a questão da exploração dos
planos de saúde, mas essa volta parece visar mais evitar encerrar com pontas
soltas do que produzir alguma reflexão consistente, mais uma vez
subaproveitando temáticas que poderiam enriquecer a trama. Assim, Distúrbio é um competente suspense
graças ao modo como aproveita seus espaços e dispositivos de filmagem, ainda
que não aproveite bem as ideias que apresente e sua trama descambe para algo
mais banal do que seu começo indicava.
Nota: 7/10
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