A série O Mundo Sombrio de Sabrina faz pela famosa bruxinha adolescente o
mesmo que Riverdale fez pelas
histórias de Archie e seus amigos, reinventou-as sob um viés mais sombrio,
ainda que mantendo seu ar de drama adolescente. Ambas séries são produzidas por
Roberto Aguirre-Sacasa, responsável por reinventar esses personagens (tanto
Archie quanto Sabrina) nos quadrinhos. A bruxa se sai melhor que a turma de Riverdale pela liberdade dada pela
Netflix, não precisando lidar com questões de classificação indicativa que a
série do Archie (visto que o canal CW é TV aberta nos EUA), permitindo que a
narrativa realmente embarque em algo sombrio e violento.
Sabrina (Kiernan Shipka) é uma
adolescente filha de um bruxo e uma humana que vive com as tias, Hilda (Lucy
Davis) e Zelda (Miranda Otto), depois da morte dos pais. Prestes a completar
dezesseis anos, ela deve passar por seu “Batismo Sombrio” para se juntar ao
grupo de bruxas do qual sua família faz parte. A garota, no entanto, reluta em
jurar sua lealdade ao Senhor da Trevas por não querer abrir mão de sua vida
como humana e do namorado, Harvey (Ross Lynch).
Kiernan Shipka faz uma Sabrina
mais impositiva e confiante, alguém que não teme em enfrentar os adultos e
figuras de autoridade em prol do que acredita. É também menos boazinha do que a
versão tornada célebre por Melissa Joan Hart na série da década de noventa.
Aqui, tal qual em Riverdale, há muito
mais espaço para ambiguidades morais e mesmo quando Sabrina age por razões
corretas, por vezes realiza atos terríveis com sua magia.
Harvey, por sua vez, não se
resume a um mero interesse romântico da protagonista e tem seus próprios
conflitos a partir da complicada relação que tem com o pai e os negócios de sua
família, dona da mina da cidade. Na verdade, a ideia de que as escolhas dos
pais impactam (positiva e negativamente) na vida dos filhos é algo que perpassa
os arcos da maioria dos personagens, de Harvey e Sabrina a seus colegas de
escola, Roz (Jaz Sinclair) e Susie (Lachlan Watson).
O conflito de Sabrina em relutar
entrar para a “religião” da família pode ser entendido como uma metáfora para a
imposição religiosa que muitos nós recebem de nossos pais, que nos iniciam
dentro de doutrinas religiosas quando temos poucos meses de vida. O tema
reflete sobre o modo como isso pode produzir pessoas incapazes de questionar os
dogmas impostos por instituições religiosas, ignorando que há uma dimensão bem
humana (com ganância e interesses de poder) por trás de discursos de libertação
e desenvolvimento espiritual.
A série não se furta em mostrar
sangue ou criar imagens verdadeiramente sinistras, evidenciando a natureza
macabra das forças sombrias com as quais os personagens lidam cotidianamente.
Há momentos genuínos de tensão como a cena em que Sabrina caminha por um
labirinto de feno ou o episódio que a família Spellman fica presa em casa com
um demônio que invade seus sonhos. Há, no entanto, o típico “inchaço” de muitas
séries da Netflix, deixando a impressão de que poderia ter uns dois episódios a
menos.
O Mundo Sombrio de Sabrina é uma competente e sinistra reinvenção
da famosa bruxinha adolescente, explorando com habilidade o macabro universo
que ela habita.
Nota: 8/10
Trailer
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