James Cameron tenta há cerca de vinte anos levar aos cinemas
o mangá e anime Gunnm (ou Battle Angel). Nesse meio tempo ficções
distópicas voltadas ao público jovem se tornaram um grande filão comercial,
atingiram um apogeu e agora caminham ao declínio dado o recente fracasso de
produtos como Mentes Sombrias (2017)
ou Máquinas Mortais (2018). O timing não poderia ser pior para Alita: Anjo de Combate, dirigido por
Robert Rodriguez e produzido por Cameron, mas o que faz dele problemático não é
o fato de que talvez o público esteja cansado desse tipo de história.
A história é praticamente a mesma da animação: em um futuro
distópico, o doutor Ido (Christoph Waltz) encontra uma garota ciborgue em um
ferro-velho e descobre que seu cérebro ainda está intacto. Ele a leva para sua
clínica e lhe dá um novo corpo, mas quando a garota não lembra nada sobre o seu
passado, nem mesmo seu nome, o doutor decide chamá-la de Alita (Rosa Salazar).
Aos poucos Alita demonstra um talento para o combate e isso a coloca na mira de
Vector (Mahershala Ali), o sujeito que comanda a cidade.
É curioso que apesar de reconstruir boa parte das
cenas-chave do anime e ter o dobro de sua duração, além de referenciar eventos
apenas mostrados no mangá, o filme tenha tão pouco a dizer sobre aquele
universo ou personagens, talvez menos do que a animação ou o quadrinho, o que é
decepcionante considerando que ele tenha bem mais tempo à sua disposição. Sim,
os fãs do material original provavelmente vão apreciar a reprodução fidedigna,
mas é um fanservice vazio que só
repete o que já é conhecido e faz pouco para acrescentar um olhar ou
personalidade próprias a esta adaptação.
Talvez parte do problema seja a saturação desse tipo de
narrativa, mas tudo aqui soa manjado e lugar comum. Da protagonista
desmemoriada que é uma arma viva, à distopia no qual uma pequena elite vive na
opulência enquanto uma maioria vive na pobreza, passando pelo cientista bondoso
que serve de figura paterna (pensem no Gepeto de Pinóquio ou no Tenma de Astro
Boy), até o esporte violento que serve de estratégia para a alienação das
massas e fantasia vã de ascensão social, que é incomodamente similar ao que é
visto em Rollerball: Os Gladiadores do
Futuro (1975). Toda essa colcha de retalhos nunca consegue formar um todo
coeso (diferente do anime) ou de personalidade.
Boa parte do bom elenco coadjuvante é mal aproveitado em
personagens engessados a lugares comuns e mesmo intérpretes competentes, como
Mahershala Ali, tem passagens esquecíveis. O vilão Nova (Edward Norton) é
apresentado como uma figura elusiva, poderosa e enigmática, mas como nunca o
vemos fisicamente ou sabemos qualquer coisa a respeito de seus planos em
relação a Alita ou motivações, ele mais soa como um indivíduo desinteressante e
inócuo ao invés de misterioso.
A subtrama romântica entre Alita e Hugo (Keean Johnson)
nunca funciona como deveria, em parte por conta do roteiro, que nunca justifica
a paixão arrebatadora de Alita pelo rapaz e, assim, cenas como a que a
protagonista literalmente retira o coração para oferecer a ele são forçadas e
imerecidas. O fato de Hugo ter fornecido a arma usada para Gerwishka (Jackie
Earle Haley) que quase mata Alita praticamente não repercute na protagonista,
que parece não se importar que as ações do amado tenham posto sua própria vida
em risco.
Além das falhas de texto, há a inexpressividade de Keean
Johnson, que é uma página em branco em cena, não conseguindo angariar qualquer
simpatia pelo seu personagem ou pelo sucesso de seu romance. Na verdade, minha
torcida é que ele morresse de uma vez para me livrar de sua presença
entediante. Keean Johnson é uma presença tão nula e desprovida de carisma que
tira todo o impacto emocional da cena final, já que não conseguimos nos
importar com ele. Rosa Salazar, no entanto, é carismática o bastante para
tornar sua Alita envolvente, acertando tanto no deslumbramento ingênuo dela com
todo esse mundo novo a ser descoberto quanto no lado guerreiro e feroz da
personagem.
As cenas de ação são o ponto alto do filme, com a câmera de
Robert, ressaltando a força dos ciborgues e as consequências brutais de cada
embate, com peças e membros se destroçando para todos os lados. Quando vemos Alita em ação, de fato sentimos
que a protagonista é uma irrefreável máquina de guerra. O design de produção acerta ao misturar influências de diferentes
partes do mundo na concepção visual da cidade em que os personagens vivem,
denotando o aspecto multicultural do lugar.
Apesar da condução hábil das cenas de ação, Alita: Anjo de Combate acaba sendo uma
aventura bem derivativa e sem personalidade. É daqueles filmes que você começa
a esquecer assim que sai do cinema.
Nota: 5/10
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