Considerando o fim iminente da parceria entre a Netflix e a
Marvel, além do fato de que todas as séries fruto dessa parceria já foram
oficialmente canceladas pela gigante do streaming,
era de se imaginar que a Netflix ia buscar outras fontes para abastecer seu
catálogo de histórias de super-heróis. Uma das escolhidas foi a graphic novel Umbrella Academy (que não
li) criada por Gerard Way e Gabriel Bá, que tem uma boa temporada de estreia.
A trama é praticamente uma versão mais pé no chão do que
aconteceria se alguém juntasse um grupo de adolescente e os treinasse para ser
super-heróis (pensem nos X-Men). Uma ocorrência extraordinária faz quarenta e
três mulheres ao redor do mundo parirem filhos mesmo sem que estivessem
grávidas. O bilionário Reginald Hargreeves (Colm Feore) reúne sete dessas
crianças e as treina para utilizar suas habilidades especiais combatendo o
crime. A equipe se revela ao público quando eles ainda são adolescentes, mas
com o tempo ela se dissolve. A equipe se reencontra anos depois quando Reginald
morre misteriosamente. Luther (Tom Hopper), o antigo líder da equipe desconfia
que ele pode ter sido assassinado e as coisas ficam ainda mais estranhas quando
Cinco (Aidan Gallagher), que tinha desaparecido anos atrás ao tentar viajar no
tempo, reaparece através de um portal, ainda com a mesma aparência de quando
sumiu.
A narrativa aborda de modo mais realista as consequências de
pegar um bando de crianças e praticamente transformá-los em uma milícia. Sob
esse olhar, os personagens são praticamente crianças-soldado não muito
diferente do que vemos em conflitos ao redor do mundo e logicamente ser exposto
a essa violência e brutalidade, normalizando esse comportamento desde cedo, tem
consequências sobre os personagens.
Luther é o único ainda devotado ao “pai”, como um soldado
traumatizado que não consegue se adaptar ao mundo real, ainda acreditando na
missão e nos valores que foram treinados para cumprir. Diego (David Castañeda)
atua como vigilante por conta própria, fazendo justiça ao seu modo, enquanto
Alisson (Emmy Raver-Lampman) se tornou atriz e Klaus (Robert Sheehan) se afunda
em drogas para “calar” sua habilidade de se comunicar com os mortos. Enquanto
isso, Vanya (Ellen Page) lida com o trauma de ser a única entre os irmãos sem
poderes, sendo constantemente tratada como alguém inferior ou indesejável pelo
pai e pelos irmãos.
A trama é mais focada em lidar com os traumas e inadequações
de cada um dos membros da equipe e é eficiente em fazer isso criando conflitos
críveis para essas pessoas que viveram situações tão extremas desde muito
jovens. O destaque fica por conta do garoto Aidan Gallagher, que realmente
convence que Cinco é um homem de quase sessenta anos por trás de sua aparência
juvenil. Quando há ação, os embates são bem conduzidos e usam com criatividade
os poderes de cada personagem, além de não economizarem na violência.
Os vilões Cha-Cha (Mary J. Blige) e Hazel (Cameron Britton,
da série Mindhunter) contribuem para
excentricidade do universo construído pela série, ainda que a escolha deles
usarem grandes máscaras de mascotes não faça muito sentido dentro da estética
realista da série, já que as máscaras provavelmente diminuem o campo de visão
deles o que não é algo ideal se você é um matador profissional. Sim, isso já
está nos quadrinhos, mas nem tudo que funciona em páginas desenhadas funciona
com pessoas de carne e osso, não é à toa que outros visuais, como o de Luther,
foram modificados para ficarem mais realistas.
A série, no entanto, sofre com o já manjado “inchaço da
Netflix” com ocasionais perdas de ritmo e episódios em que nada muito relevante
acontece e a trama parece não estar caminhando.
Por ser uma brincadeira com histórias típicas de super-heróis, há também
um certo grau de previsibilidade. Desde o primeiro episódio fica evidente que
Vanya irá descobrir que tem poderes ou que seu estudante de violino, Leonard
(John Magaro), é na verdade um vilão.
Mesmo com alguns problemas, a primeira temporada de The Umbrella
Academy é um consistente estudo sobre o impacto do vigilantismo nos jovens
super-heróis, embalado por um universo excêntrico e cheio de personalidade.
Nota: 8/10
Trailer
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