Dor e Glória é
provavelmente o melhor trabalho do diretor espanhol Pedro Almodóvar desde A Pele que Habito (2011). O filme é uma
espécie de autoficção na qual Almodóvar reflete sobre suas paixões, frustrações
e o move sua arte. É, talvez, o mais perto que o diretor chegou de uma
autobiografia.
A narrativa é centrada no diretor de cinema Salvador Mallo
(Antonio Banderas) que começa a enfrentar sérios problemas de saúde e, em
decorrência disso, começa a refletir sobre sua trajetória de vida e a arte que
produziu.
Desde o início fica evidente que o personagem vivido por
Banderas foi concebido como um simulacro do próprio Almodóvar, dos figurinos e
maneirismos, passando pelo penteado, tudo remete ao célebre diretor espanhol.
Não temos como saber o que Almodóvar tirou diretamente da própria biografia ou
do que é ficção, mas não importa. O que importa é como o filme, possivelmente
mais que qualquer outro filme do diretor, nos proporciona esse mergulho pelo
fluxo de consciência do realizador.
É um estudo sobre a arte e como ela nos move, como dá
sentido a nossas vidas mesmo diante das dificuldades, mesmo com todos os
problemas de saúde que parecem tornar nossas vidas insuportáveis. Dando sinais
de depressão e recorrendo ao uso de drogas para conviver com a dor, Salvador
vai aos poucos sendo tirado do seu estupor conforme revisita obras antigas e
essas obras, além do contato com seus antigos colaboradores, o impelem a voltar
a escrever.
O que acompanhamos é uma espécie de processo dialógico no
qual o fazer artístico de Salvador o leva a reencontros e reexames de sua vida
e experiências afetivas, como se o contato com a arte o fizesse entrar em
contato maior consigo mesmo, gerando um impulso maior para transformar essa
vivência em arte em uma espécie loop.
Através da jornada de seu protagonista, Almodóvar nos instruiu no que o fazer
artístico significa para ele.
Sob os olhar de Almodóvar vemos a arte como uma celebração
da vida, da experiência humana, dos afetos, dos dissabores. A arte é a razão
para que Salvador continue vivo, permitindo que ele se reconecte com pessoas,
sentimentos e memórias que acreditava já ter esquecido, dando a ele motivação
para tentar resolver seus problemas de saúde.
Além de Banderas, o filme também conta com um ótimo trabalho
de Penélope Cruz como a mãe de Salvador em cenas que parecem ser flashbacks da infância do protagonista.
Como em outros filmes de Almodóvar, o entendimento da relação do personagem
(que aqui é praticamente um simulacro do próprio diretor) é essencial para
entender como esse protagonista lida com o mundo.
Em seu trabalho mais pessoal em anos, em Dor e Glória, Pedro Almodóvar nos leva
para dentro de sua relação intelectual e afetiva para a arte, mostrando como o
labor artístico é central para a vida.
Nota: 8/10
Trailer
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