Quando escrevi sobre a primeira temporada de Good Girls, mencionei que apesar de boas
ideias e do carisma do trio principal, a série tinha inúmeros problemas de
roteiro que prejudicavam a experiência. Eu esperava que essa segunda temporada
melhorasse esses problemas, mas ao invés disso continua a apresentar a mesma
quantidade de furos e incongruências de antes. Aviso que texto contem SPOILERS
da temporada.
A trama continua no exato momento em que a anterior, com Rio
(Manny Montana) tendo invadido a casa de Beth (Christina Hendricks) e tomando o
marido dela, Dean (Matthew Lillard, o eterno Salsicha dos filmes do Scooby Doo)
de refém. Dean é baleado, mas sobrevive. Enquanto isso, Beth, Annie (Mae
Whitman) e Ruby (Retta) precisam sumir com as evidências que existem contra
elas, já que o agente Turner (James Lesure) está próximo de localizá-las.
Tal como na primeira temporada, o texto é cheio de
inconsistências. Beth é extremamente inteligente e ardilosa, capaz de criar esquemas
de falsificação e até estar a um passo adiante de Rio, exceto quando o roteiro
decide que ela é uma completa idiota. Um exemplo é já no início da temporada
quando ela hesita em matar Boomer (David Hornsby). A hesitação em si já não faz
muito sentido, já que Boomer não só está prestes a delatar Beth e as amigas
para o FBI, como também tinha tentado estuprar Annie na temporada anterior e
tentado passar a perna nelas antes. Ou seja, Boomer é claramente uma ameaça e
um sujeito desprezível e ainda assim ela o trata como um sujeito completamente
inocente.
Pior, ela confia que dando um suborno, Boomer irá se calar
para sempre, o que é de uma ingenuidade tão grande que chega a soar estúpido,
já que todo chantagista sempre volta e o trio de protagonistas já tinham
passado por uma situação similar quando tentaram subornar Mary Pat (Allison
Tolman) na temporada anterior. O mesmo acontece com a confiança cega que Beth
tem em Rio, mesmo quando fica evidente que ele está tentando usar as
protagonistas como testa de ferro para seus crimes. Sim, Beth se envolve
sexualmente com Rio e isso pode tirar um pouco da sua objetividade, mas desde a
primeira temporada todas elas confiavam demais no criminoso, mesmo quando ele
não lhes dava razão para tal.
Outro problema é que a série tenta criar um universo de
moralidade cinzenta e pouco clara, mas constantemente sabota isso ao reduzir os
personagens a maniqueísmos simplórios. Quando as personagens começam a sentir o
peso da morte de Boomer, rapidamente Annie acaba descobrindo que Boomer roubava
todo o dinheiro da avó (June Squibb) e ela estava prestes a perder o
apartamento em que morava. Como a relação que ele tinha como a avó era a única
coisa de positiva do personagem, ao tirar isso a série tira das personagens e
do público qualquer desconforto pelo assassinato dele.
O mesmo acontece com o agente Turner, alguém que, apesar de
estar em uma posição antagônica às personagens, parecia ser um bom sujeito e
tinha um senso claro de dever e justiça. Então em um episódio ele prende o
marido de Ruby e admite durante o interrogatório que estaria disposto a fraudar
provas e testemunhos para prender Ruby, Beth e Annie. Assim, se antes ficávamos
divididos para quem torcer (pois Turner não estava errado em querer
prendê-las), ao descobrirmos que ele não tem escrúpulos fica fácil torcer para
o fracasso de Turner.
Muitos eventos também não tem qualquer repercussão ou são
negados por uma reviravolta posterior. Um exemplo é a já citada informação de
que Boomer roubava dinheiro da avó. Posteriormente, próximo ao fim da
temporada, descobrimos que não apenas Boomer está vivo, como estava se
escondendo esse tempo todo no apartamento da avó. Ora, se a residência da avó
era o esconderijo dele, porque deixar de pagar o aluguel e arriscar ficar sem teto?
Porque a avó o manteria escondido mesmo depois de descobrir que ele a estava
deixando sem nada. Sim, a avó eventualmente o entrega a polícia com o pretexto
que já deu guarita a ele tempo demais ao longo da vida, mas a decisão soa
gratuita porque nunca há um evento que justifique a mudança na personagem e
esse tipo de coisa acontece a todo momento ao longo da temporada.
O trio de protagonistas continua ótimo em convencer da
amizade e afeto longevo que existe entre elas e a temporada consegue ampliar os
núcleos familiares de cada uma das três aprofundando o entendimento que temos
da relação delas com suas famílias. As três também são eficientes em momentos
de humor, principalmente quando precisam interagir com a sonsa Mary Pat. O
principal acerto da série, porém, continua sendo seu olhar crítico sobre o
ideal de classe média trabalhadora estadunidense, mostrando como toda essa vida
suburbana idílica é um grande engodo feito para manter o trabalhador em
constante estado de endividamento e do qual é quase impossível sair por meios
honestos.
Desta maneira, a segunda temporada de Good Girls continua a não fazer valer o potencial de suas boas
ideias graças a um roteiro inconsistente e problemático.
Nota: 5/10
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