segunda-feira, 6 de abril de 2020

Crítica – A Máfia dos Tigres


Análise Crítica – A Máfia dos Tigres


Review – A Máfia dos TigresA realidade muitas vezes pode ser mais bizarra e absurda do que qualquer roteiro de ficção. A minissérie documental A Máfia dos Tigres é um claro exemplo disso. O documentário acompanha um grupo de donos de “zoológicos” que exibem primordialmente grandes felinos como tigres, leões e leopardos. Coloco o termo entre aspas porque apesar dos personagens chamarem seus negócios de zoológicos, eles são mais circos, nos quais os animais são explorados (e maltratados em muitos casos) para o entretenimento alheio e não para serem preservados ou estudados.

Entre os personagens principais está Joe Exotic, um sujeito, como o próprio nome diz, exótico. Um caipira que ostenta um mullet descolorido é amante de tigres e de armas de fogo, assumidamente gay e polígamo, Joe já tentou ser candidato a presidente dos EUA e também governador do estado de Oklahoma. Joe tem uma violenta rixa com Carole Baskin, uma hippie velha que também é dona de um viveiro de grandes felinos, diz ser defensora dos direitos desses animais, inclusive propondo leis que deem ao governo mais supervisão e controle sobre quem pode lidar com esses animais, mas, paradoxalmente, seu viveiro também é aberto a visitação e ela também permite que o público interaja com os animais, não sendo muito diferente de outros circos do gênero, exceto, talvez, por seu tratamento dos animais não ser tão negligente.

A eles se soma o esquisito (e também dono de zoológico) “Doc” Antle. Apesar de se apresentar como doutor, Antle nunca deixa claro em que é doutor ou qual sua formação. Ele fala pausada e controladamente como um professor que tenta explicar algo muito complexo, mas na verdade ele tem uma postura delirante e paranoica, agindo com rispidez toda vez que os documentaristas perguntam algo que não lhe agrada. Aparentemente ele também lidera um estranho culto sexual no qual as funcionárias de seu parque se tornam parte de seu harém particular.

O documentário deixa claro que as pessoas que mais se interessam em ter tigres são as últimas pessoas que deveriam possuir esses animais perigosos. Os personagens da série são socialmente desajustados, desequilibrados, ególatras e sem escrúpulos, prejudicando muitas pessoas na tentativa de se firmarem nesse mercado. A trama também mostra como a falta de dispositivos legais permite que essas pessoas operem com certa liberdade, já que, diferente do Brasil, o comércio de animais silvestres não parece ser crime, com as pessoas só sendo presas em casos de negligência ou crueldade. Essa permissividade jurídica permite que figuram como Joe ou Antle se multipliquem com facilidade.

A trama é cheia de reviravoltas bizarras, que provavelmente acharíamos pouco críveis se estivéssemos diante de um produto ficcional. Um exemplo é o misterioso e conveniente desaparecimento do marido de Carole, que curiosamente deixou uma procuração dando a ela poder sobre todas as suas posses em caso de desaparecimento, algo bastante suspeito já que esse tipo de procuração só costuma ser feita prevendo casos de morte ou doença. Existem inúmeras outras reviravoltas que não mencionarei aqui para não estragar a experiência de ninguém, mas a maioria dessas situações só contribui para que percebamos o quão despirocadas e tóxicas essas pessoas são principalmente quando ouvimos depoimentos de ex-funcionários e ex-companheiros que tiveram suas vidas (e ocasionalmente algumas partes do corpo) destruídas.

São tantas coisas malucas acontecendo que a série parece não dar conta de tudo, com o último episódio se concentrando em mostrar as principais reviravoltas envolvendo um processo federal contra Joe que o restante dos personagens fica esquecido e seus destinos são relegados a breves cartelas de texto. Teria sido melhor um ou dois episódios a mais para amarrar todas essas histórias do que tratá-las de modo tão acelerado. Claro, sempre é possível retornar a tudo isso em uma segunda temporada, mas considerando o que aconteceu com Making a Murderer e o quão arrastado foi seu segundo ano, talvez seja melhor não continuar a menos que se tenha um material que realmente sustente mais meia dúzia de episódios.

De todo modo, A Máfia dos Tigres é uma docussérie surpreendente, repleta de reviravoltas inesperadas e personagens insólitos que, ainda assim, chama a atenção para um problema real envolvendo o comércio e exploração de animais selvagens.

Nota: 8/10


Trailer

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