A trama é protagonizada pelo jogador de basquete LeBron James (interpretando a si mesmo). Quando LeBron e o filho Dom (Cedric Joe) são sugados para dentro do servidor da Warner Bros, LeBron é desafiado para um jogo de basquete pelo maligno Al G. Ritmo (Don Cheadle), o algoritmo que gerencia todo o universo Warner. Se LeBron perder, ele viverá para sempre nos servidores e Al poderá usá-lo como bem entender. Para ganhar, LeBron precisará da ajuda de Pernalonga para formar um time, mas Al consegue colocar o filho de LeBron contra ele, complicando as coisas.
Atletas não são atores profissionais. Pode parecer óbvio, mas nem todo filme que coloca um atleta de maneira proeminente parece estar ciente disso. O primeiro Space Jam entendia isso e colocava o drama principal do lado dos Looney Tunes, que precisavam reagir a alienígenas que queriam sequestrá-los. Isso tirava de Michael Jordan a responsabilidade de ter que atuar para criar algum drama, deixando o jogador de basquete ser ele mesmo e reagir às maluquices dos desenhos. Nesse sentido, o roteiro era esperto em basear a versão fílmica de Jordan na própria história real do atleta, pegando emprestado sua breve e fracassada tentativa de se reinventar no baseball.
São decisões acertadas para aproveitar os pontos fortes do atleta protagonista sem expor suas fragilidades. Este novo filme não faz nenhuma dessas escolhas. Ao centrar o drama em LeBron, isso obriga o atleta a exibir um alcance dramático que ele não tem e sequer devia ser exigido dele em um filme dessa natureza. Mais que isso, o LeBron do filme pouco tem a ver com o LeBron do mundo real, sendo construído como um sujeito sisudo que encara basquete como uma mera profissão e não tem qualquer alegria em quadra, distante do LeBron real e da persona enérgica e bem humorada que ele costuma ter.
Outro problema é que a narrativa dá muita evidência à questão das múltiplas propriedades da Warner Bros, sem necessariamente ter nada a dizer sobre elas. Ver LeBron e Pernalonga em meio a produtos como Game of Thrones ou Mad Max: Estrada da Fúria não serve a qualquer outro propósito além de nostalgismo rasteiro, como o fato de reconhecermos coisas das quais gostamos fosse o bastante para que gostássemos desse filme. É algo semelhante ao que fizeram filmes como Jogador Nº1 (2018) ou Emoji: O Filme (2017), que desfiam propriedades conhecidas sem o esforço de construir qualquer piada ou humor em cima delas, usando-as como uma muleta afetiva.
Algumas referências, inclusive, talvez escapem até mesmo ao público adulto, já que duvido que grande parcela do espectador médio de hoje tenha visto Casablanca (1942), por exemplo. Essas referências inanes se estendem à partida de basquete em si, já que a torcida, ao invés de apenas conter personagens dos Looney Tunes tem toda a sorte de propriedades da Warner Bros, como o Pennywise de It: A Coisa (2017), o King Kong, a Freira do universo Invocação do Mal e tantos outros. Logicamente nenhum desses personagens é interpretado pelos atores originais e sim por dublês fantasiados, o que faz tudo parecer algum tipo de vídeo tosco da Carreta Furação ao invés de um produto oficial da própria Warner.
Inclusive é estranho ver alguns desses personagens em filmes para crianças, principalmente quando a Warner criou toda uma celeuma em torno da remoção do Pepe Le Gambá por conta de seu humor se basear praticamente em cenas de assédio (e é mesmo), o que não seria apropriado para uma produção infantil. Por outro lado, o estúdio não vê problema em colocar os protagonistas de Laranja Mecânica (1971) ou personagens de Game of Thrones, dois produtos em que estupros são ocorrências recorrentes, além de referências aos filmes do Austin Powers (cujo humor era quase todo em cima de piadas sexuais de duplo sentido), em uma fita para crianças. Isso os faz soar hipócritas e poderia ter sido facilmente resolvido se eles não tivessem usado esse filme como uma espécie de publicidade estendida do catálogo da HBO Max. Bastava ter mantido a trama nos Looney Tunes.
A partida de basquete em si é construída de maneira problemática. Ao invés de se basear em regras comuns de basquete, ela é feita em cima de um game que Dom estava produzindo no começo do filme, mas cujas regras nunca são explicadas. Assim é difícil se importar ou sentir perigo porque nunca sabemos exatamente o que esperar conforme o roteiro joga todo tipo de power-up e modificadores de pontuação aleatoriamente diante de nós sem qualquer lógica pré-estabelecida. Há também o problema envolvendo a decisão final do Pernalonga, já que é óbvio que o filme não vai traumatizar uma geração inteira de crianças deixando o personagem morrer. Então quando ele aparece vivo no epílogo, é algo simultaneamente previsível e desonesto, que faz todo o drama que se tentou construir na cena do sacrifício soar como uma imensa perda de tempo.
Claro, o filme tem momentos de humor ao longo da partida quando se entrega à comédia anárquica do Looney Tunes, mas isso acontece tão pouco porque a trama está tão preocupada em nos mostrar todas as coisas que pertencem à Warner Bros que Pernalonga e sua trupe soam como coadjuvantes em seu próprio filme. Há também uma piada divertidíssima envolvendo o ator Michael B. Jordan e é uma pena que o resto do filme não tenha sacadas tão boas, preferindo se escorar em uma nostalgia preguiçosa.
Apesar de alguns momentos
divertidos, Space Jam: Um Novo Legado é
menos uma aventura engraçada de um jogador de basquete com a trupe do
Pernalonga e mais uma publicidade corporativa cínica disfarçada de filme
infantil.
Nota: 4/10
Trailer
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