Em termos de formato, é idêntico a todos os outros documentários sobre crimes reais que vemos na Netflix ou em outras plataformas, recorrendo a entrevistas imagens de arquivo e encenações. O diferente, além da história singular que narra, é como a montagem confere ritmo à trama, mantendo tudo ágil, tenso e constantemente apresentando novas guinadas. Ao longo da projeção a trama passa de algo curioso, para revoltante, para catártico e então revoltante de novo. Dizer mais seria estragar as surpresas da narrativa.
Mais que narrar a história insólita de um crime, o filme também pondera sobre como a ficção e histórias românticas tipo “príncipe e plebeia” tornam as pessoas suscetíveis a acreditarem que um príncipe encantado está à espera na esquina (ou no Tinder), nublando o juízo crítico . Afinal, se as vítimas parassem para analisar friamente, veriam que tudo é muito suspeito. Porque um bilionário estaria se expondo no Tinder sob o perigo de ser roubado, sequestrado ou vítima de um golpe quando existem apps de encontro exclusivos para ricos como o Raya? Mais que isso, se o sujeito está no ramo de diamantes, pedras valiosas e fáceis de transportar, porque precisaria de dinheiro da namorada? Não bastaria carregar consigo algumas pedras e vendê-las quando precisassem de dinheiro? Logicamente, não estou dizendo que a culpa é das vítimas, longe disso, mas como a sociedade cria as mulheres para esperarem esse "príncipe salvador" e o quão danoso pode ser esse "complexo de Cinderela".
Nesse sentido, o filme deixa evidente a paciência do golpista em levar um mês seduzindo essas mulheres, levando-as a lugares luxuosos para fazê-las acreditar em sua riqueza e seu amor durante mais de um mês até efetivamente pedir dinheiro, mostrando como ele enredava essas mulheres, evitando culpabilizar as vítimas. Há um trabalho consistente de pesquisa e jornalismo investigativo para mostrar as evidências de como ele lidava com as mulheres, o que ele fazia com o dinheiro e qual a real identidade do golpista.
De certa forma, a produção também fala sobre sororidade, mostrando como foi através da união das vítimas e da rede de apoio mútuo que elas criaram entre si para reunir provas para levar tudo à imprensa e às autoridades que conseguiram expor o golpista para o mundo. Que a punição tenha sido menor a que imaginado só mostra as limitações legais de se punir esse tipo de golpe quando não há uma trilha de papel até o criminoso e tudo está no nome das vítimas.
Por outro lado, apesar da consistência da investigação e de todos os argumentos, é curioso que ao final o documentário decida indagar sobre o papel do Tinder em tudo isso e simplesmente inocente com alguns segundos de frases das vítimas dizendo que o aplicativo não tem culpa de nada. Claro, o Tinder em si não era cúmplice do sujeito e não estava envolvido diretamente nos golpes, mas é estranho que em momento algum o documentário pare para ponderar se não existem possíveis medidas de segurança para coibir práticas de pessoas que dão uma identidade falsa no aplicativo. O fato do Tinder ter recentemente anunciado o banimento da conta do golpista só mostra como o filme simplifica demais o debate. Se a diretora Felicity Morris não queria alongar demais o filme falando sobre essa questão, melhor seria nem abordar do que passar tão rápido e de maneira tão simplista.
De todo modo, O Golpista do Tinder vale pela natureza
insólita da história que conta e o ritmo que a montagem consegue dar à trama.
Nota: 7/10
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