A narrativa conta a história da QuadrigaCX uma empresa de corretagem de criptomoeda que ganhou proeminência no Canadá quando o Bitcoin começou a se tornar uma tendência na especulação financeira. O fundador da empresa, Gerry Cotten, se tornou uma figura proeminente no mercado financeiro e promotor da importância das criptomoedas. Anos depois, a empresa se viu enrolada em escândalos que culminaram com muitos clientes não sendo capazes de retirar seus investimentos, algo que piora quando Gerry inesperadamente morre em uma viagem à Índia, sendo que ele tinha todas as senhas para as carteiras virtuais de Bitcoin da empresa.
O primeiro problema são as escolhas que a trama faz em relação a como contar a história e a quem delegar essa narração. Embora tenha entrevistado repórteres, especialistas de TI e contadores forenses que trabalharam no caso, o documentário prefere deixar a narração a cargo de antigos clientes da Quadriga que se juntaram em um grupo de Telegram para fomentar teorias conspiratórias sobre a empresa e Gerry. Assim, muito tempo do filme é gasto com ilações com pouca ou nenhuma base factual, apenas para sugerir grandes reviravoltas que nunca acontecem, porque estamos diante de pessoas conjecturando na internet sem fazer nenhum trabalho investigativo real.
A sensação é que o documentário faz essa escolha para dar a impressão de uma grande conspiração, de um caso insólito com viradas inimagináveis, no entanto, quando a trama se detêm sobre os indícios concretos e factuais vemos que era um esquema pirâmide bem simples. A maneira como o filme dá ampla latitude para que os conspiracionistas de internet ventilem sobre a possibilidade de Gerry ainda estar vivo apesar de nenhum indício real (no máximo elementos circunstanciais e olhe lá) chega a ser irresponsável. Primeiro porque dá um ar de legitimidade a isso e segundo porque, como não tem fundamento material, chega a ser um desrespeito com a família do morto (apesar de Gerry ser um escroque oportunista, isso não justifica pisotear o luto de seus parentes).
Não ajuda que os personagens selecionados sejam um bando de ancaps toscos fizeram apostas estúpidas e irresponsáveis com o próprio dinheiro na esperança de virarem milionários do dia para a noite. Quando eles se atentam para o risco de, por exemplo, vender o próprio apartamento (um bem material com valor estável e fácil de aferir) por criptomoedas voláteis e sem regulação num espaço dominado por espertalhões e golpistas, soam menos como vítimas que foram trapaceadas injustamente e mais por um bando de babacas recebendo o que mereciam por conta da própria ganância.
O fato deles ficarem vomitando preconceito, xenofobia e misoginia em um grupo de Telegram enquanto fomentam teorias da conspiração infundadas é apenas a cereja no bolo para detestemos esses indivíduos. O documentário, por sinal, nunca confronta a conduta desses personagens, deixando apenas a fala de uma das jornalistas que investigou o caso denunciando o preconceito e estupidez desses sujeitos em um segmento muito breve perto do final do filme.
O expediente de contar a história como se fosse a linha do tempo de um aplicativo de mensagens soa como uma escolha preguiçosa e pouco inventiva, limitando o espectador a ler mensagens de texto aparecendo na tela, com nenhum elemento para nos deixar imersos nessa trama. A única coisa que o documentário faz bem é mostrar como funciona esse mercado e o sistema de blockchain, revelando como a falta de regulação torna as criptomoedas algo volátil e fértil para golpes financeiros. No entanto, tudo isso está perdido em meio a um oceano de sensacionalismo barato que raramente leva a algum lugar.
Preferindo um sensacionalismo
rasteiro e a divulgação irresponsável de teorias da conspiração, Não Confie em Ninguém: A Caça ao Rei da
Criptomoeda é também prejudicado por um ritmo arrastado e escolhas
preguiçosas de estrutura narrativa.
Nota: 3/10
Trailer
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