A trama é protagonizada por PJ (Rachel Sennott) e Josie (Ayo Edebiri), duas garotas pouco populares, solitárias e lésbicas que, na tradição das comédias adolescentes estadunidenses, decidem que o próximo ano escolar será finalmente aquele em que perderão suas respectivas virgindades. Para fazer isso inventam uma mentira de que passaram as férias em um reformatório e que tiveram que lutar contra toda sorte de agressor e abusador. A partir daí elas decidem iniciar um “clube da luta” supostamente para ensinar as garotas da escola a se defenderem, mas na verdade querem usar isso como um pretexto para se aproximarem das meninas de quem gostam.
Ao contrário do que acontece em muitas tramas adolescentes em que personagens agem de maneira extrema para não se sentirem invisíveis, aqui a narrativa deixa evidente desde o primeiro momento o quanto as protagonistas estão agindo de maneira egoísta, imatura e potencialmente egoísta. Seria possível até entender que essa trama serve como metáfora e sátira para o modo como muitas pessoas hoje se apropriam de discursos feministas para se promoverem ou ganhar empatia.
Por outro lado, quando as garotas começam a se reunir e a colocar para fora seus sentimentos nas rodas de conversa e nas lutas, vemos uma imensa agressividade fluir, que choca e faz rir pelo modo como essas adolescentes realmente se agridem com tudo que tem. É uma representação de uma frustração e agressividade reprimidas de garotas cansadas de serem subestimadas, invisibilizadas ou objetificadas. São sentimentos que essas personagens guardaram tempo demais e só agora, de um jeito meio torto, meio errado, encontraram um jeito de expressar.
Também típico de comédias adolescentes é o uso dos atletas da escola como vilões. Sempre vestindo os uniformes de futebol americano e exalando uma masculinidade hiperbólica, esses personagens funcionam como uma sátira aos clichês da ficção adolescente e também como uma ridicularização dos modos considerados tradicionais de masculinidade patriarcal. Interpretando o queridinho Jeff, o ator Nicholas Galitzine usa sua canastrice em seu favor para criar um antagonista cujos modos caricaturais são um exagero cômico de condutas bem reais de masculinidade tóxica. Quem também diverte é o ex-jogador de futebol americano Marshawn Lynch que interpreta o professor das garotas e transita o tempo todo entre tentar ser um aliado e um discurso antifeminista.
Inclusive o filme transita com muita habilidade entre o deboche de temas espinhosos e momentos dramáticos mais sérios em que expõe a solidão e o senso de inadequação de suas personagens, como o modo com o qual Hazel (Ruby Cruz) se dispõe a escalar ainda a agressividade do grupo só para se sentir aceita, culminando na hilária explosão do carro de Jeff. A transição entre esses momentos de absurdo grandiloquente e as cenas mais introspectivas das personagens poderia gerar uma grande inconsistência tonal, mas aqui tudo flui com naturalidade. Talvez porque o texto e as interpretações evidenciem que os momentos mais extremos sejam, de alguma maneira, uma externalização dos conflitos internos dessas jovens. Nesse sentido, o elenco, Sennot e Edebiri em especial, convence pela química genuína que constrói entre suas personagens e modo fluido com o qual elas dialogam, expõem seus sentimentos ou fazem piadas umas com as outras.
Se em Shiva Baby Emma Seligman trouxe um olhar mais naturalista para uma trama que se passava praticamente em uma única locação, aqui ela exercita sua capacidade de filmar em espaços mais amplos, com um grande número de figurantes e usar isso para construir cenas de ação que envolvem pela intensidade e exagero da violência. Algumas chocam pela brutalidade visceral apresentada, a exemplo da cena em que Hazel é forçada pelos atletas a lutar com um garoto muito maior e mais forte. Outras divertem pelo senso de absurdo como o embate final entre as garotas e os jogadores do time rival da sua escola que envolve todo tipo de manobra exagerada, incluindo o momento em que uma garota empala um adversário com uma espada.
Clube da Luta Para
Meninas transita com muita segurança entre a insanidade e a sensibilidade,
oferecendo uma sátira sobre a juventude atual que, ao mesmo tempo, simpatiza com suas
agruras.
Nota: 8/10
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