Hollywood tem feito vários filmes nos quais questiona a capacidade dos serviços de inteligência em verdadeiramente serem capazes de manterem a vigilância e segurança de seus países. Os irmãos Coen trataram isso de forma escrachada no ótimo Queime Depois de Ler (2008), e a recente
versão de O Espião que Sabia Demais
mostra como eles estão tão mergulhados em burocracia e disputas internas por
cargos e prestígio. Este O Homem Mais
Procurado, adaptação do romance de John Le Carré (que também escreveu O Jardineiro Fiel e outros romances de
espionagem que foram transformados em filmes), também irá tratar como espiões
estão mais preocupados com suas carreiras e com movimentos a curto prazo ao
invés de verdadeiramente coletar informações sobre os inimigos do Estado.
A trama é centrada em Gunther
(Philip Seymour Hoffman, em um de seus últimos trabalhos), um oficial da
inteligência alemã que recebe a tarefa de encontrar Issa (Grigoriy Dobrygin) um
muçulmano checheno que entrou ilegalmente na Alemanha a procura do banqueiro
Tommy (Willem Dafoe) e que aparentemente possui laços com organizações
terroristas. Enquanto seus superiores o pressionam para efetuar a prisão
imediatamente, Gunther prefere esperar para ver se Issa é realmente terrorista
e se ele pode leva-los a alvos mais importantes ou suas fontes de
financiamento. O espião alemão encontra ajuda na agente americana Martha (Robin
Wright) que tentará ajudá-lo a ganhar tempo para investigar o suspeito mais a
fundo.
O filme é bastante competente em
nos mergulhar em uma atmosfera de incerteza, nos fazendo questionar se Issa é
realmente um terrorista ou não. A tensão e incerteza são potencializadas por
algumas escolhas de fotografia, que investe em ambientes sombrios e cinzentos,
transformando-os espaços hostis e apáticos nos quais temos a impressão de que
um espião em vigília ou um terrorista prestes a atacar podem surgir ou
sugerindo uma conduta escusa para estes personagens. Outro grande mérito da
obra é como ele evita cair em longos diálogos expositivos e nos faz perceber os
movimentos e intenções dos personagens pelas nuances de suas condutas e
expressões. O diretor Anton Corbijn confia na inteligência do público e prefere
mostrar a explicar e, assim, nos atentamos a perceber os significados e
motivações nas próprias condutas destes personagens ao invés de apenas ouvi-los
passivamente.
Mas o que verdadeiramente carrega
o filme é o trabalho de Philip Seymour Hoffman que constrói Gunther como um
sujeito pragmático, mas que sente o peso de seu trabalho sobre si, exibindo um
olhar constantemente cansado. Diferente de outros colegas de trabalho, Gunther
prefere uma abordagem menos hostil aos seus contatos, entendendo que estímulos
positivos são mais úteis que negativos, como fica claro na cena em que ele
convence o filho de um filantropo muçulmano a entregar o pai. Entretanto, ele
não pensa duas vezes em agir de modo agressivo quando a situação pede, como o
momento em que empurra a advogada Annabelle (Rachel McAdams) contra a parede.
O ator russo Grigoriy Dobrygin
também faz um bom trabalho ao fazer de Issa um sujeito demasiadamente arredio,
com um linguagem corporal excessivamente defensiva com ombros levantados, peito
recolhido e um olhar baixo que sempre evita seus interlocutores. Sua construção
nos deixa na dúvida se ele é realmente um criminoso que quer se esconder e
passar despercebido ou se é fruto de algum trauma recente. Willem Dafoe chama a
atenção ao evitar o clichê do banqueiro inescrupuloso e insensível ao fazer
Tommy um sujeito que se sente verdadeiramente solitário em sua riqueza e
casamento de fachada. Ao mesmo tempo, tem clara consciência de sua
vulnerabilidade e que se meteu em uma situação para a qual é incapaz de lidar,
ficando preocupado não apenas com seu bem estar, mas com o da jovem Annabelle,
de quem não consegue disfarçar sua atração.
Enquanto seus superiores estão
mais preocupados em efetuar prisões rápidas para aparecerem na mídia e
alavancarem suas carreiras, Gunther se mostra efetivamente preocupado em
entender a estrutura das organizações terroristas para poder desmantela-las de
modo mais efetivo. Entretanto, como o final deixa claro, as estruturas de poder
que existem ao redor dos órgãos de inteligência não partilham dessa preocupação,
demonstrando uma conduta truculenta e pouco inteligente que serve mais para
alimentar o conflito do que resolvê-lo.
É uma decisão corajosa encerrar o
filme deixando o espectador com um gosto amargo na boca, já que o público tende
a confundir o fato de deixar um filme com uma sensação ruim com o fato dele ser
efetivamente ruim o que nem sempre é a mesma coisa. Afinal, nesse caso, a
sensação ruim é exatamente o que filme busca, ao nos colocar para fora com a
clara noção de que aqueles responsáveis por nossa segurança são uns brutos
estúpidos desprovidos de qualquer plano a longo prazo.
Nota: 8/10
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