quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Crítica - A Pelada



Apesar de todos os avanços e todas as liberdades que temos hoje para falar abertamente sobre os mais diversos temas, sexo ainda é um tabu em boa parte da nossa sociedade. Quando uma mulher demonstra interesse em se engajar em práticas sexuais pouco usais, isso torna-se ainda mais tabu. Afinal, vivemos em uma sociedade patriarcal na qual a admissão de uma mulher em querer experimentar algo como sexo a três imediatamente a renderia adjetivos negativos como “vadia” e “piranha”, enquanto que se um homem expressa essa mesma intenção isso reforçará a sua “macheza” e virilidade. É justamente sobre essa discrepância de tratamentos que a comédia A Pelada irá abordar. A tentativa de romper tabus e buscar algo novo, não é exatamente um tema inédito, muitas comédias americanas, brasileiras (como o segundo longa de Os Normais) ou argentinas (como Dois Mais Dois), mas se não reinventa a roda, A Pelada pelo menos é competente no que faz.

A trama é centrada em Caio (Bruno Pêgo) um limpador de piscinas que passa seus dias fantasiando em fazer sexo com mulheres bonitas em locais exóticos, narrando os frutos de sua imaginação como verdades a seus amigos, tentando construir uma fama de “pegador” para si. Apesar disso, ele ignora sua esposa, Sandra (Kika Farias), esquecendo seu aniversário de casamento e tratando-a com indiferença. Sentindo que seu relacionamento caiu na rotina, Sandra começa a pensar em apimentar a relação chamando outra mulher para ir para cama junto com ela e o marido.

O que se segue é uma tradicional comédia de erros cheia de desencontros na qual eles tentam desajeitadamente arrumar uma terceira pessoa ao mesmo tempo em que as lorotas de Caio começam a se acumular e lhe gerar consequências. O roteiro é muito bem amarrado, desenvolvendo esses desencontros de forma crível sem fazê-los parecerem forçados, ao mesmo tempo que desenvolve e resolve os arcos que constrói e todas as ações dos personagens repercutem conforme a trama avança, como a decisão do casal dar carona a uma desconhecida na saída do motel.

O timing cômico também é competente e as piadas saem de maneira natural e orgânica, como parte verdadeira das condutas daqueles personagens ao invés do histerismo forçado de boa parte das comédias com o tacanho “padrão Globo Filmes” que invadem os grandes circuitos de exibição. Por ser uma produção sergipana, também não temos aqui a tradicional redução dos personagens ao estereótipo de nordestino genérico que normalmente acontece. Os maneirismos e modos de falar aparecem naturalmente e sem excessos, evitando tornar tudo uma representação caricata e rasa.

A relação do casal também é construída de modo competente, evitando a armadilha de vilanizar algum dos dois personagens, principalmente Caio, cuja atitude de metido a machão poderia descambar para o endosso de uma conduta machista que o tornaria detestável. Entretanto, aos poucos vamos vendo que por debaixo dessa pretensa fachada de “macho alfa” ele é um indivíduo inseguro e relativamente patético em suas mentiras para tentar se auto-afirmar perante aos amigos.

O único problema fica por conta da conclusão, já que é construída uma enorme expectativa em relação ao ménage do casal e tudo se resolve de forma um pouco anticlimática. Tudo bem que era bastante previsível e até esperado que os dois se reaproximassem e redescobrissem a paixão e afeto um pelo outro, mas que eles (principalmente Sandra) simplesmente perderem a vontade e a curiosidade num estalar de dedos parece simples e conveniente demais.

A Pelada pode não ser exatamente original, pode ser até previsível, mas é uma história bem resolvida e bem contada, além de ter carisma e identidade próprios, sendo um respiro bem vindo em relação às comédias nacionais desgastadamente formulaicas que invadem os cinemas.


Nota: 6/10

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