É difícil não olhar para este Interestelar de Christopher Nolan e não
pensar em 2001: Uma Odisseia no Espaço
(1968), de Stanley Kubrick, pela jornada grandiosa de exploração espacial que
ambos trazem, muitos irão usar o clássico de Kubrick como medida de comparação
com este filme, mas tentarei não cair nessas comparações. Cada um deles usa o tema das
viagens espaciais sob olhares diferentes e com propósitos diferentes, mas,
ainda assim, tocam em questões semelhantes como a capacidade humana de superar
barreiras e o nosso ímpeto em rumar ao desconhecido em busca de algo melhor,
seja conhecimento ou uma nova morada.
A trama se passa num futuro no
qual a atmosfera da Terra vai aos poucos tornando o planeta inabitável para os
humanos e prejudicando a produção de alimento. Para evitar a extinção, a única
solução possível parece ser a colonização de outros planetas que possuam
condições favoráveis à nossa existência. Para isso, o piloto Cooper (Matthew
McConaughey) e uma equipe de cientistas liderada pela doutora Brand (Anne
Hathaway) é designada para viajar através de um buraco de minhoca (ou wormhole) para poder chegar a uma
galáxia que possua planetas habitáveis.
Como toda a divulgação do filme
manteve em segredo muitos detalhes da obra e considero que este desconhecimento
faz parte do tipo de apreciação que o diretor planejava para a obra, tentarei
não dar muitos detalhes sobre a trama ou que acontece durante o filme.
O filme se baseia em parte nas
teorias do físico Kip Thorne, mas obviamente o filme extrapola esses conceitos
uma vez que muitas das implicações de se viajar através do espaço-tempo são
desconhecidas. A questão de tratar ideias tão complexas acaba gerando uma
grande quantidade de diálogos expositivos na tentativa de garantir que o
público compreenda exatamente aquilo que se quer dizer para não ficar perdido
no universo de relatividade temporal construído por Nolan. Ainda assim, por se
tratar de um assunto tão amplo, complexo e com várias implicações metafísicas,
fica difícil deixar de lado a sensação de que em alguns momentos o filme tenta
explicar mais do que realmente é capaz.
Esse excesso de exposição acaba
sacrificando um pouco a construção das relações entre os personagens, em
especial entre Cooper e sua filha. Felizmente o talento do elenco suplanta as
falhas do texto e o carisma e a intensidade de McConaughey, Jessica Chastain e
Anne Hathaway nos faz nos importar e nos comover com as lutas e sofrimentos
destes personagens mesmo quando o texto não os faz justiça.
Toda a ciência, no entanto, está
ali apenas como pano de fundo para uma história sobre a natureza humana. O
filme traz a tona temas como sobrevivência, legado, o uso que fazemos do tempo
e o quanto ele é precioso. A obra reflete sobre como aquilo nos une e nos faz progredir enquanto espécie
não é apenas o saber ou o conhecimento que progredimos, mas os laços de afeto
que construirmos e compartilhamos. É justamente o afeto e o desejo de algo
melhor para aqueles que amamos que nos faria seguir adiante, que nos faz buscar
forças quando não temos e nos move a tentar resolver o insolúvel. É por amor
aos filhos que Cooper aceita a missão, é para reencontrar o amado que Brand
embarca e é essa a força que os move.
Enquanto isso, aqueles
personagens mais distanciados da humanidade que justificam suas ações através
do valor histórico de seus feitos ou por um “bem maior” genérico que não tem
ninguém em vista agem de maneira inescrupulosa, mentindo e manipulando outros
para conseguirem o que querem e nem veem problema em matar ou deixar pessoas
morrerem. Na verdade, ficamos com a sensação de que o altruísmo impessoal
desses antagonistas parece mais como uma forma de alimentar seus próprios egos
do que efetivamente de nascido de uma empatia genuína pelos membros de sua
espécie.
O final deixa evidente como somos
movidos por afeto ao mostrar Cooper literalmente transpondo o tempo e o espaço
para ajudar a filha e se a solução parece como um deus ex machina, pelo menos reverbera as ideias trabalhadas pelo
filme. Além disso, esse final me fez recordar uma fala de Cobb (Leonardo
DiCaprio) em A Origem (2010), também
de Nolan, quando ele diz que o estímulo de uma emoção positiva é sempre mais
eficiente que o de uma emoção negativa e o desenvolvimento deste Interestelar mostra exatamente isso,
revelando como o cineasta é tematicamente coeso em seus trabalhos. No entanto,
clímax da obra enfraquece um pouco na tentativa forçada de criar um conflito
entre os dois filhos de Cooper, já que não faz sentido que seu filho mais velho
hostilize a irmã quando ela apenas tenta ajudá-lo, quebrando o ritmo da trama
para promover uma subtrama que pouco lhe acrescenta.
O aspecto visual da obra chama a
atenção, tanto nos cenários, quanto nos figurinos e em todo o desenho daquele
universo futurista que consegue soar ao mesmo tempo fantástico e crível. Desde
a Terra estéril e tomada por poeira, passando pelas naves e os planetas que
eles visitam ou tecnologias que usam, temos a sensação de que tudo aquilo
poderia realmente existir. Embora o som e música composta por Hans Zimmer
também sejam muito boas, em alguns momentos os efeitos sonoros e a música
interferem diretamente nos diálogos, prejudicando a compreensão de algumas
falas.
A montagem ajuda a dar a sensação
de atemporalidade que os protagonistas experimentam, visto que para eles o
tempo é relativo, dificultando que enxerguemos os eventos de maneira linear,
servindo assim a um propósito estético e narrativo, não sendo um mero cacoete
estilístico. O filme exibe também cenas de ação bastante tensas e envolventes,
em especial o confronto entre Cooper com outro astronauta já no terço final.
Apesar de seus problemas, Interestelar é um filme extremamente
rico, que empolga, emociona e nos faz pensar, mais uma vez demonstrando a
capacidade do diretor Christopher Nolan em casar temas complexos e
entretenimento.
Nota: 7/10
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