quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Crítica - Interestelar

Análise Interestelar

Review InterestelarÉ difícil não olhar para este Interestelar de Christopher Nolan e não pensar em 2001: Uma Odisseia no Espaço (1968), de Stanley Kubrick, pela jornada grandiosa de exploração espacial que ambos trazem, muitos irão usar o clássico de Kubrick como medida de comparação com este filme, mas tentarei não cair nessas comparações. Cada um deles usa o tema das viagens espaciais sob olhares diferentes e com propósitos diferentes, mas, ainda assim, tocam em questões semelhantes como a capacidade humana de superar barreiras e o nosso ímpeto em rumar ao desconhecido em busca de algo melhor, seja conhecimento ou uma nova morada.

A trama se passa num futuro no qual a atmosfera da Terra vai aos poucos tornando o planeta inabitável para os humanos e prejudicando a produção de alimento. Para evitar a extinção, a única solução possível parece ser a colonização de outros planetas que possuam condições favoráveis à nossa existência. Para isso, o piloto Cooper (Matthew McConaughey) e uma equipe de cientistas liderada pela doutora Brand (Anne Hathaway) é designada para viajar através de um buraco de minhoca (ou wormhole) para poder chegar a uma galáxia que possua planetas habitáveis.

Como toda a divulgação do filme manteve em segredo muitos detalhes da obra e considero que este desconhecimento faz parte do tipo de apreciação que o diretor planejava para a obra, tentarei não dar muitos detalhes sobre a trama ou que acontece durante o filme.

O filme se baseia em parte nas teorias do físico Kip Thorne, mas obviamente o filme extrapola esses conceitos uma vez que muitas das implicações de se viajar através do espaço-tempo são desconhecidas. A questão de tratar ideias tão complexas acaba gerando uma grande quantidade de diálogos expositivos na tentativa de garantir que o público compreenda exatamente aquilo que se quer dizer para não ficar perdido no universo de relatividade temporal construído por Nolan. Ainda assim, por se tratar de um assunto tão amplo, complexo e com várias implicações metafísicas, fica difícil deixar de lado a sensação de que em alguns momentos o filme tenta explicar mais do que realmente é capaz.

Esse excesso de exposição acaba sacrificando um pouco a construção das relações entre os personagens, em especial entre Cooper e sua filha. Felizmente o talento do elenco suplanta as falhas do texto e o carisma e a intensidade de McConaughey, Jessica Chastain e Anne Hathaway nos faz nos importar e nos comover com as lutas e sofrimentos destes personagens mesmo quando o texto não os faz justiça.

Toda a ciência, no entanto, está ali apenas como pano de fundo para uma história sobre a natureza humana. O filme traz a tona temas como sobrevivência, legado, o uso que fazemos do tempo e o quanto ele é precioso. A obra reflete sobre como aquilo  nos une e nos faz progredir enquanto espécie não é apenas o saber ou o conhecimento que progredimos, mas os laços de afeto que construirmos e compartilhamos. É justamente o afeto e o desejo de algo melhor para aqueles que amamos que nos faria seguir adiante, que nos faz buscar forças quando não temos e nos move a tentar resolver o insolúvel. É por amor aos filhos que Cooper aceita a missão, é para reencontrar o amado que Brand embarca e é essa a força que os move.

Enquanto isso, aqueles personagens mais distanciados da humanidade que justificam suas ações através do valor histórico de seus feitos ou por um “bem maior” genérico que não tem ninguém em vista agem de maneira inescrupulosa, mentindo e manipulando outros para conseguirem o que querem e nem veem problema em matar ou deixar pessoas morrerem. Na verdade, ficamos com a sensação de que o altruísmo impessoal desses antagonistas parece mais como uma forma de alimentar seus próprios egos do que efetivamente de nascido de uma empatia genuína pelos membros de sua espécie.

O final deixa evidente como somos movidos por afeto ao mostrar Cooper literalmente transpondo o tempo e o espaço para ajudar a filha e se a solução parece como um deus ex machina, pelo menos reverbera as ideias trabalhadas pelo filme. Além disso, esse final me fez recordar uma fala de Cobb (Leonardo DiCaprio) em A Origem (2010), também de Nolan, quando ele diz que o estímulo de uma emoção positiva é sempre mais eficiente que o de uma emoção negativa e o desenvolvimento deste Interestelar mostra exatamente isso, revelando como o cineasta é tematicamente coeso em seus trabalhos. No entanto, clímax da obra enfraquece um pouco na tentativa forçada de criar um conflito entre os dois filhos de Cooper, já que não faz sentido que seu filho mais velho hostilize a irmã quando ela apenas tenta ajudá-lo, quebrando o ritmo da trama para promover uma subtrama que pouco lhe acrescenta.

O aspecto visual da obra chama a atenção, tanto nos cenários, quanto nos figurinos e em todo o desenho daquele universo futurista que consegue soar ao mesmo tempo fantástico e crível. Desde a Terra estéril e tomada por poeira, passando pelas naves e os planetas que eles visitam ou tecnologias que usam, temos a sensação de que tudo aquilo poderia realmente existir. Embora o som e música composta por Hans Zimmer também sejam muito boas, em alguns momentos os efeitos sonoros e a música interferem diretamente nos diálogos, prejudicando a compreensão de algumas falas.

A montagem ajuda a dar a sensação de atemporalidade que os protagonistas experimentam, visto que para eles o tempo é relativo, dificultando que enxerguemos os eventos de maneira linear, servindo assim a um propósito estético e narrativo, não sendo um mero cacoete estilístico. O filme exibe também cenas de ação bastante tensas e envolventes, em especial o confronto entre Cooper com outro astronauta já no terço final.

Apesar de seus problemas, Interestelar é um filme extremamente rico, que empolga, emociona e nos faz pensar, mais uma vez demonstrando a capacidade do diretor Christopher Nolan em casar temas complexos e entretenimento.

Nota: 7/10


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