Um
dos benefícios de uma cinebiografia é trazer ao público fatos até então
desconhecidos sobre uma determinada pessoa e também sobre o período histórico
em que esta viveu. Muita coisa já foi feita sobre a Segunda Guerra Mundial,
sobre os esforços dos aliados em derrotar os nazistas, mas creio que poucos
conheciam a história do matemático Alan Turing, cujo trabalho foi de extrema
importância para o fim da guerra, e que posteriormente foi perseguido por sua
sexualidade, perdendo tudo que tinha.
A
trama foca no período em que Turing (Benedict Cumberbatch) trabalhou com o
governo britânico para quebrar a criptografia das mensagens nazistas da máquina
Enigma. Para tal, ele desenvolve uma máquina (que é basicamente um
proto-computador) que seja capaz de dar conta das possibilidades de resolução.
No entanto, ele precisará lidar com a impaciência de seus chefes e o
relacionamento com seus colegas. É importante lembrar que para além da guerra,
sua "máquina de Turing" ajudou a dar origem aos computadores
modernos.
O
filme adquire um tom de filme de espionagem, com conspirações políticas,
encobrimento de fatos, agentes duplos e um enorme senso de urgência, já que
cada dia que não resolvem o código os aproxima ainda mais da derrota. Nesse
sentido o filme consegue convocar muito bem o que está em jogo ao mostrar cenas
de arquivo ou as consequências dos bombardeios. Também pontua muito bem o peso
das escolhas dos personagens quando eles decidem não usar as informações
obtidas e vemos os soldados feridos chegando nos hospitais.
Mas
quem carrega o filme é mesmo o trabalho de Benedict Cumberbatch que faz do
personagem alguém tão complexo quanto os códigos com os quais ele trabalha. Um
sujeito movido pelo seu intelecto, mas destruído pelas convenções sociais da
época. A sensação que temos é que Turing vive mais na sua própria mente do que
no mundo real e ele observa as pessoas ao seu redor e seus comportamentos como
se tudo lhe fosse alienígena. Toda a sua proeza mental não lhe ajuda quando
descobrem que ele é homossexual e, a partir deste ponto, o filme trata de nos
revelar o tratamento desumano que recebido por ele, revelando sua decadência
física e mental, fruto da cruel castração química que lhe é forçada.
Se
Cumberbatch carrega o filme, é uma pena que o resto do elenco fique preso a
personagens tão unidimensionais. Keira Knightley aparece no piloto automático
como a adorável companheira de Turing, ela também vítima (embora em menor grau)
do preconceito de sua época. O mesmo pode ser dito de Mark Strong e seu soturno
agente do MI6. Matthew Goode exibe seu carisma habitual, mas também tem pouco a
fazer além mostrar o charme de seu enxadrista.
Outro
problema é o uso irregular que o filme faz dos flashbacks que mostram a infância de Turing em um colégio interno.
Embora alguns momentos realmente ajudem a decifrar sua personalidade, como a
cena em que ele sofre bullying ou
quando o diretor da escola lhe fala da morte de seu único amigo e o quanto isso
contribui para sua retração e inadequação social. Por outro lado, outras apenas
nos apresentam diálogos expositivos que mastigam aquilo que o filme nos
mostrou, uma delas é quando o jovem Turing diz que as interações das pessoas
são como um código criptografado para ele, algo que o público é perfeitamente
capaz de perceber pela inadequação social do personagem. Outro é quando seu
amigo lhe diz que é daqueles de quem menos se espera que vem as coisas mais
importantes, uma frase que será repetida algumas vezes ao longo do filme de
modo cansativo, resumindo de modo óbvio o percurso dos personagens.
Ainda
assim, O Jogo da Imitação é um
retrato competente de uma figura de grande importância que foi marginalizada e
destruída pela ação preconceituosa do Estado britânico, cuja trajetória merece
ser resgatada e reconhecida.
Nota:
7/10
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