Em
tempos nos quais os blockbusters
insistem em levar a sério repetições de fórmulas desgastadas (estou olhando
para você O Destino de Júpiter)
Kingsman corre na direção oposta e resolve não se levar nem um pouco a sério,
deixando claro a natureza absurda e datada do universo apresentado ao mesmo
tempo em que ousa subverter convenções e estruturas.
A
trama acompanha Eggsy (Taron Egerton) um problemático jovem inglês que é
recrutado pelo agente Harry (Colin Firth) a fazer parte da misteriosa
organização de espionagem chamada Kingsman. Durante seu treinamento Eggsy
precisará lidar com os colegas almofadinhas que não aceitam a presença de
alguém, digamos, "classe-média" como o protagonista, além de ajudar
seu mentor a investigar o misterioso bilionário Valentine (Samuel L. Jackson).
O
filme é basicamente uma grande e calorosa homenagem aos antigos filmes de
espionagem, em especial os antigos 007, com seus espiões elegantes e refinados
cheios de tranqueiras absurdas como pistolas guarda-chuva e bombas-isqueiro,
bem como os vilões megalomaníacos com seus covis em topos de montanha e
capangas exóticos. O filme trata tudo isso com grande irreverência e humor auto-referencial,
consciente do exagero e do absurdo do universo que nos apresenta ao mesmo tempo
que brinca com as convenções e tenta trazer novos elementos.
Colin
Firth é preciso com seu Harry Hart, tudo bem, nós já sabíamos o quanto o ator
era capaz de ser um perfeito cavalheiro inglês, mas nunca imaginei que ele
conseguisse ser tão convincente como herói de ação. Claro, ele é auxiliado em
parte por um dublê digital, mas os efeitos e a edição são tão competentes em
mascarar as transições que realmente cremos que é Firth descendo o braço em
todos aqueles vilões, em especial na espetacular luta na igreja. O estreante
Taron Egerton não faz feio ao lado do veterano ator e capta muito bem a
personalidade descolada e estoica de Eggsy e, apesar do percurso do personagem
ser bastante familiar, seu carisma nos faz embarcar na jornada sem tornar as coisas enfadonhas. Já Samuel L.
Jackson parece se divertir bastante com sua caricatura de língua presa dos
tradicionais supervilões de filmes de espionagem. Sim, o personagem é exagerado
e afetado, mas a ideia é mesmo deixar todo o absurdo exalar. Ainda assim, o
filme subverte algumas convenções, produzindo pelo menos uma reviravolta que
irá pegar boa parte do público desprevenido. Além disso temos Mark Strong e
Michael Caine que são, respectivamente, o Q e o M do Bond de Harry.
Já
que falei em subversão, o filme não traz apenas a subversão de clichês
narrativos, mas há uma questão de subversão de classes e ordem social presente
em todo o filme. Certo já vimos muitas vezes o conflito do herói de classe
média que precisa provar seu valor frente a um bando de esnobes de classe alta,
mas aqui esses embates entre noções do que é considerado culto e refinado (e
portanto superior) contra o que é popular (e inferior) são constantemente
desafiadas na tentativa de quebrar esses tabus e essas barreiras culturais
arbitrárias criadas meramente para a auto estima das elites. Um exemplo disso é
quando o refinado Harry diz que não há nada melhor do que beber cerveja em um pub ou o chique jantar entre ele e
Valentine no qual ambos comem fast food.
No entanto, a prova de que o filme leva sua luta de classes a sério é pelo fato
de que os principais líderes mundiais (incluindo o presidente de uma
superpotência) e ricaços do mundo inteiro apoiam o plano do vilão e ao final
são todos eliminados pelos heróis em hilárias explosões multicoloridas enquanto
a solene marcha "Pompa e
Circunstância" toca ironicamente como um grande "foda-se"
para as elites e aristocracias.
As
cenas de ação são cheias de energia e bastante movimentadas, com coreografias
ágeis e criativas que nos mostram todo o poder e habilidade dos agentes. Apesar
dos muitos movimentos de câmera, da câmera lenta e montagem rápida, nunca
perdemos o sensação de unidade e coesão espacial dos combates. O filme não
economiza na violência e transmite a intensidade da ação, bem como uma clara
noção perigo, de que os personagens podem realmente falhar, algo potencializado
pelas mortes de personagens importantes que vão acontecendo ao longo da trama.
Assim
sendo, este Kingsman: Serviço Secreto
é uma movimentada aventura, cheia de irreverência e espírito subversivo.
Nota:
8/10
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