quarta-feira, 1 de abril de 2015

Crítica - O Ano Mais Violento

Análise O Ano Mais Violento

ReviewEste O Ano Mais Violento é basicamente um filme de máfia sem os elementos que normalmente se espera de um filme de máfia. É um testamento à confiança e talento de um cineasta quando ele resolve tratar algo que já foi tão reproduzido e ao invés de confortavelmente embarcar nas convenções dos gêneros ou subgêneros com os quais está trabalhando, resolve seguir uma lógica própria que se conforma com o universo e personagens que se quer desenvolver e não com expectativas e relações extra-textuais pré-fabricadas. Digo isso porque aqueles que entrarem para ver este filme esperando apenas um "filme de máfia" estarão cometendo um erro tão grande quanto as pessoas que foram assistir Amantes Eternos (2014), de Jim Jarmusch,  esperando apenas um "filme de vampiro". Se, no entanto, conseguir abandonar noções pré-concebidas e se deixar levar pelo que J.C Chandor quer fazer aqui, certamente irá aproveitar este relato soturno e melancólico de um homem que tenta não agir como um criminoso.

A trama se passa no inverno de Nova Iorque em 1981, estatisticamente um dos anos de maior criminalidade da cidade. A história segue o imigrante Abel (Oscar Isaac) que tenta expandir seu negócio de óleo, mas uma disputa de território entre outros distribuidores, bem como um indiciamento de um promotor (David Oyelowo) que parece focado apenas em Abel e problemas com sindicatos parecem se colocar no caminho do empresário.

Apesar de saber que não dirige o mais limpo dos negócios, Abel tenta ao máximo se comportar como um homem de negócios respeitável e evita ações que possam chamar demasiada atenção das autoridades, como armar seus caminhoneiros para resistirem aos constantes assaltos. Sua aparência bem cuidada e sua fala calma e cautelosamente cadenciada mostram seu esforço em se diferenciar de outros "empresários" do seu ramo, mas ainda assim, o personagem parece sempre distante de seus objetivos. Enquanto ele reluta, seu sócio, Andrew (Albert Brooks), e sua esposa, Anna (Jessica Chastain), lhe oferecem soluções menos legítimas. A esposa, aliás, é praticamente uma Lady Macbeth, tentando a todo momento tornar seu marido um homem implacável, pedindo que ele deixe de lado sua fachada de empresário e o terrível sorriso de satisfação que exibe ao matar um cervo deixa clara a sua inclinação à violência.

A história caminha construindo aos poucos o acúmulo de situações que irá atingir o personagem. Os diálogos, muito mais do que a ação, estabelecem as tensões que vão crescendo aos poucos, conforme o personagem vai se recusando a abraçar seu lado criminoso. O trabalho de Oscar Isaac como o personagem é carregado de nuances e nunca nos permite decifrar Abel por completo. Se ele é apenas um homem correto tentando sobreviver em ambiente corrupto ou se ele é um escroque cuidadoso que prefere não deixar transparecer sua natureza criminosa é algo que fica a cargo do público.

O ritmo lento, no entanto, não torna a situação menos tensa. Na verdade, o crescente de tantas situações, como os roubos de carga, os capangas armados que aparecem na casa de Abel, os crimes noticiados no rádio, tudo vai nos deixando cada vez mais inquietos em relação ao momento em que tudo irá explodir sobre o protagonista. A música ajuda a delinear essa tensão subjacente ao mesmo tempo que adiciona um certo tom de melancolia à ação, como se lamentasse as escolhas que o protagonista inevitavelmente terá de fazer. Do mesmo modo, a fotografia fria e carregada de sombras, mostra os espaços pelos quais Abel transita como ambientes hostis e opressivos, contrastando com sua aparência de novo-rico e nos lembrando que apesar da fachada apresentável, ele ainda é um sujeito do submundo. Todo esse cuidado irá culminar na cena final que deixa que o "sonho americano" da conquista da fortuna e independência empreendedora não pode ser alcançado sem derramamento de sangue ou acordos escusos.

O Ano Mais Violento é um relato cuidadosamente bem construído sobre crime, corrupção e riqueza. Seu estilo seco e ritmo pouco convencional podem não agradar a todos, mas é preciso, pelo menos, respeitar uma obra que é capaz de seguir uma lógica própria ao invés de se conformar a padrões narrativos pré-determinados.


Nota: 8/10 

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