Uma
narrativa policial que narra a busca por um serial
killer na União Soviética stalinista parecia bastante promissor, já que o
cinema de gênero em Hollywood raramente faz algo do lado de lá da Cortina de
Ferro durante o período de tensões ampliadas entre os soviéticos e os Estados
Unidos. Lamentavelmente qualquer frescor que este cenário poderia oferecer é
limado por problemas sérios de estrutura e ritmo narrativo.
Neste
Crimes Ocultos acompanhamos Leo (Tom
Hardy), um herói de guerra soviético que se tornou investigador da MGB, o
Ministério de Segurança do Estado. Leo cai em desgraça quando se recusa a
denunciar a esposa, Raisa (Noomi Rapace), como traidora e ambos são exilados de
Moscou e enviados para uma erma cidade no interior. Em meio a isso tudo Leo se
depara com a morte em série de crianças e desconfia se tratar da obra de um serial killer. A hipótese, no entanto, é
rechaçada por seus superiores, já que consideram assassinato algo parte do
capitalismo e dentro da utopia em que vivem tal coisa não pode existir. Assim
sendo, Leo deve ir contra as próprias estruturas do regime, incluindo um agente
rival da MGB, Vassili (Joel Kinnaman) para por um fim às mortes.
O
filme faz uma reconstrução competente da União Soviética stalinista, dando aos
prédios e figurinos uma aparência desgastada, suja e puída, transmitindo que
não são tempos fáceis para aquelas pessoas e elas tem de se virar como podem. A
fotografia contribui para isso investindo em sombras e tons cinzentos que
ressaltam a sensação de tristeza e desesperança.
A
questão é que tudo é tão sujo e mal iluminado que em algumas cenas de ação
chega a ser difícil discernir quem é quem, em especial numa luta dentro de um
trem e no embate entre Leo e Vassili quando ambos rolam na lama. Tudo isso é
piorado pelo trabalho de câmera e montagem nos momentos de ação que recorrem a
uma interminável tremedeira da câmera e um número absurdo de cortes por segundo
deixando a ação praticamente incompreensível.
Isso
seria perdoável se o filme conseguisse criar com eficiência uma atmosfera de
tensão e incerteza, mas isso não acontece. Primeiramente por causa do ritmo
lento da narrativa, no qual as coisas demoram a se desenvolver e ainda por cima
realiza várias digressões que visam denunciar os vários problemas políticos e
sociais do país, sendo que a trama da investigação por si só já faria isso e
essas intervenções servem apenas para deixar o fluxo narrativo truncado.
O
segundo e mais grave é a inexplicável decisão de entregar ao público toda a
resolução do crime praticamente na metade do filme e assim cruzamos os braços
aborrecidos pela hora seguinte enquanto esperamos o protagonista tenta alcançar
o nosso patamar de informação. Isso faria sentido se o filme usasse isso para
criar alguma outra reviravolta ou surpresa para elevar novamente a tensão, no
entanto isso não acontece. Ao invés disso o filme se transforma em um exercício
de paciência, desprovido de qualquer sensação de suspense ou incerteza, já que
sabemos o mistério central da trama e assim perdemos o interesse nos percalços
do protagonista em alcançar a verdade, afinal já a alcançamos por conta
própria.
Apesar
disso, Tom Hardy consegue convencer como um homem bruto e intimidador, mas que
ainda mantêm uma certa ética. Do mesmo modo, Noomi Rapace nos traz uma mulher
que parece ter se resignado a sua infelicidade ainda que tente escondê-la do
marido e as cenas que ela divide com Hardy são possivelmente os únicos momentos
que o filme realmente consegue nos engajar. Joel Kinnaman, no entanto, lida com
um material limitado e não consegue fazer seu Vassili ir além de um vilão tolo
caricato.
Há
também um problema na construção das falas dos personagens. É compreensível que
todos falem em inglês, mas o que não faz muito sentido é que falem um inglês
torto e cheio de erros de concordância verbal e uso de preposições como se
tivessem aprendido o idioma com o Borat. Isso piora com a heterogeneidade de
sotaques que variam entre sutil (como Rapace) e o completamente carregado
(Hardy), nos deixando com a impressão de que não estamos vendo um conjunto de
russos e sim um bando de atores tentando, cada um a seu modo, fingir soar
russo.
Deste
modo, Crimes Ocultos desperdiça sua
competente reconstrução de época e a boa dupla principal em uma trama arrastada com sérios problemas na estruturação do mistério principal.
Nota:
4/10
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