Baseado
no sequestro real de Alfred Heineken, criador da cerveja de mesmo nome, que
aconteceu em Amsterdã em 1983 e resultou no maior resgate pago até então, este Jogada de Mestre certamente tinha
elementos que poderiam torná-lo interessante. No entanto, passa longe de uma
história de crime verdadeiro tão boa quanto o excelente Foxcatcher: Uma História que Chocou o Mundo ou mesmo minimante
apreciável quanto o curioso Sem Dor, Sem
Ganho (2013), na verdade é um suspense completamente incompetente e
desprovido de qualquer tensão.
Acompanhamos
um grupo de amigos sem dinheiro, Cor (Jim Sturgess), Willem (Sam Worthington),
Cat (Ryan Kwanten), Brakes (Thomas Cocquerel) e Spikes (Mark VanEuwen) que
resolvem sequestrar o magnata Alfred Heineken (Anthony Hopkins) e pedir um
resgate de 35 milhões, na esperança de que o dinheiro resolva as suas vidas.
Os
problemas já emergem nos primeiros minutos do filme quando ele falha em
estabelecer a situação dos seus personagens. Somos informados que eles estão
sem dinheiro e tentam conseguir um empréstimo para montarem um negócio juntos,
que a namorada de um deles está grávida, mas não há nenhuma razão mais urgente
como uma notificação de despejo ou uma hipoteca prestes a vencer, nada
realmente desesperador que de fato os motive a recorrer ao crime. Se não
conseguimos compreender claramente o que motiva esses indivíduos, não temos
porque acompanhá-los.
Isso
se torna mais grave nas cenas seguintes quando eles roubam a remessa de
dinheiro de um banco e sem pensar duas vezes iniciam um tiroteio pelas ruas da
cidade, passando de cidadãos de classe média que recorrem ao crime por revolta
contra o "sistema" a sociopatas violentos sem qualquer consideração.
Essa impressão é reforçada em uma cena seguinte, na qual um deles diz que quer
usar o dinheiro para comprar uma Ferrari, deixando claro que não estamos diante
de pessoas com problemas financeiros graves, mas apenas indivíduos gananciosos.
Tudo isso combinado com o fato de que o filme sequer se esforça em dar qualquer
fiapo de personalidade a qualquer um desses sujeitos e com exceção da aparência
física, não consigo lembrar de nada que me faça vê-los como pessoas ao invés de
um bando de criminosos genéricos.
Se
não temos motivos para aderir aos criminosos, também não temos para aderir à
vítima, já que Hopkins trabalha no piloto automático como Heineken e,
estranhamente, faz parecer que o bilionário está se divertindo com tudo aquilo,
provavelmente porque ele próprio devia estar contente por estar recebendo um
alto cachê apenas para vestir um pijama e parecer entediado. Ainda assim,
Hopkins é melhor e mais interessante do que todo o restante do elenco combinado
Entediante
é também a direção, que opta por filmar tudo ao estilo "câmera na
mão", com a câmera trepidando até mesmo em cenas que não há nenhum
movimento, o que acaba nos distraindo, ao invés de nos deixar imersos no filme
ou de transmitir a sensação de "realismo documental" que normalmente
se pretende quando se filme assim. Além disso, a montagem exagerada somada à
tremedeira incessante da câmera transforma as cenas de ação em uma bagunça
aborrecida que sequer consegue deixar clara a lógica espacial de uma briga que
ocorre em um apertado corredor de apartamentos. O único momento que realmente
funciona e sentimos um mínimo de apreensão é quando eles dirigem em alta
velocidade na contramão, mas é algo mínimo frente aos mais de noventa minutos
de puro equívoco.
Ainda
assim, este não é o principal problema do filme, mas sua quase que completa e
irrestrita inabilidade em criar qualquer tensão ou incerteza, a pedra
fundamental de qualquer suspense. O diretor Daniel Alfredson ou tenta inserir
suspense em cenas no qual não há nenhum ou joga a esmo eventos climáticos na
tela, sem qualquer preparação ou construção desses, fazendo-os soar gratuitos.
Um
exemplo disso é a cena em que um dos personagens vai comprar comida e o
atendente nota que ele pediu molho picante ao invés do agridoce que sempre pede
e nesse momento a câmera dá um close em policiais que acabaram de entrar,
enquanto sobe um música carregada de tensão, porém, o que há de tenso ou
perigoso nessa cena? Não há a menor possibilidade de que os policiais façam
qualquer ligação entre a mudança de hábito do personagem. Tampouco há qualquer
indício de um olhar subjetivo sobre a cena, como se estivesse tentando nos
mostrar não como as coisas aconteceram, mas como o personagem viu, já que, como
já disse, todo o registro do filme segue uma estética que tenta se aproximar de
um documentário ou reportagem.
O
mesmo problema acontece nas cenas em que o personagem de Sam Worthington julga
está sendo observado por policiais, mas o filme não nos dá nenhum indício que
justifique a paranoia do personagem. Era algo simples de fazer, bastava colocar
alguns figurantes olhando-os rigidamente, ou encarando-os enquanto falam no
celular, mas não há nada. A efeito de comparação, observem como os irmãos Coen
constroem as cenas envolvendo o personagem de George Clooney em Queime Depois Ler (2008), tudo bem que
nesse exemplo nós sabemos com certeza que ele não está sendo observado, mas
pelo modo como as cenas são construídas entendemos porque ele acha que está.
Quanto
aos momentos climáticos, eles são jogados a esmo em nossa direção, sem a devida
preparação ou antecipação. Isso acontece, por exemplo, quando o primeiro deles
é preso, no qual ele é cercado por policiais que surgem literalmente do nada.
Assim sendo, ao invés de ficarmos surpresos ou apreensivos com a prisão, apenas
erguemos os ombros e dizemos "então tá". O filme tenta justificar
isso no letreiro final que diz que ele foi preso por uma denúncia anônima, mas
seria mais carregado de suspense e tensão se víssemos a polícia recebendo a tal
denúncia e se preparando para ir atrás dele. Assim haveria a tensão por
conhecermos uma ameaça que o personagem desconhece, portanto poderíamos
antecipadamente temer por seu destino pela incerteza se ele conseguiria ou não
escapar.
Algo
semelhante acontece quando outros três personagens brigam dentro de um carro e
posteriormente se separam, sem que houvesse qualquer construção de tensão ou
disputa para que a briga irrompesse. Pelo contrário, tudo está a favor dos
personagens naquele momento, eles estão com o dinheiro que queriam, prestes a
desaparecer e escaparem ilesos e ainda assim, dois deles começam a brigar de
maneira tão séria que resolvem se separar simplesmente porque um deles zombou
sua alergia, nos deixando com a sensação de que o conflito não foi merecido ou
bem estabelecido. Só quando os membros remanescentes descobrem a prisão dos
outros e tentar pensar no que fazer é que há uma mínima atmosfera de perigo e
incerteza, mas nesse ponto já estamos nos últimos minutos do filme, então é
tarde demais para que nos importemos com algo e apenas torcemos para que tudo
termine de uma vez.
Não
há, portanto, muito a dizer sobre este sonolento Jogada de Mestre a não ser que ele não consegue cumprir nada do que
promete, parecendo mais uma daquelas reconstituições de programas policialescos
do tipo Linha Direta ou Aqui e Agora do que um filme
propriamente dito.
Nota:
2/10
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