quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Crítica - A Possessão do Mal


E lá vamos nós para mais um terror barato (financeira e artisticamente) ao estilo found footage que traz tudo aquilo que todos os outros filmes nesse estilo fazem ao ponto de serem quase indistinguíveis e basicamente tudo que eu tinha falado sobre o péssimo A Forca vale também para este A Possessão do Mal ao ponto em que eu pensei em simplesmente dar um "copiar e colar" no texto e apenas mudar o nome do filme. Mas como não sou adepto do autoplágio (ou qualquer tipo de plágio para falar a verdade) e verdadeiramente creio que o esforço analítico de uma obra fílmica sempre pode acrescentar algo ao nosso entendimento da arte, da vida ou de nós mesmos, então vamos pensar um pouco a respeito desse filme e ver o que sai.

O filme acompanha o documentarista Michael King (Shane Johnson), um homem que acabou de perder a esposa e resolve fazer um filme para provar que não existe nenhum tipo de ocorrência sobrenatural. A filmagem é motivada pelo fato de que ele deveria ter viajado com a esposa no período em que ela foi acidentalmente atropelada, mas ela se recusou devido ao conselho de uma cartomante, então o marido culpa a tal charlatã e decide mostrar que não há nada de sobrenatural no mundo. Para tal resolve a se sujeitar a todo e qualquer ritual de magia negra, conjuração demoníaca, necromancia, enfim, qualquer coisa que pareça terrível.

O filme pede que simpatizemos com ele pela sua dor e usa o luto para justificar as ações do personagem, o problema é que os roteiristas esquecem que o viúvo tem uma filha pequena para cuidar, então por mais triste e magoado que ele esteja, encher a casa de imagens demoníacas e se submeter a rituais envolvendo LSD e outras drogas não parece a melhor maneira de dar apoio a uma garotinha que acabou de perder a mãe em um acidente violento. Assim, ao invés de um pobre viúvo Michael nos soa como um imbecil egoísta que se assume riscos tolos sem pensar que é a única pessoa capaz de cuidar para filha e sem se preocupar com a própria dor da garota, já que em nenhum momento vemos ele conversando com a menina sobre a perda da mãe.

Aliás o filme faz questão de lembrar o tempo todo da morte da esposa ao colocar muitos planos nos quais a aliança de Michael está no centro do quadro ou pelo modo como o ator Shane Johnson insiste  em passar os dedos sobre o anel o tempo todo em uma risível muleta de interpretação já que Johnson jamais consegue convocar a profunda dor e desamparo que poderia levar alguém a um experimento tão imprudente (e nos fazer crer nisso). A noção de "construção de personagem" das pessoas envolvidas neste filme passa longe do esforço em compreender e demonstrar qualquer tipo de sentimento ou emoção humana genuína, mas apenas uma série de cacoetes estilísticos e performáticos que servem apenas para lembrar que o personagem possui apenas uma característica identificável.

A tentativa inicial de colocar algum tipo de denúncia em relação a esse tipo de cartomante e médium que vendem auxílio sobrenatural é defenestrada pelo fato da narrativa deixar claro que ele está possuído por uma entidade demoníaca. Se o filme deixasse em aberto se estamos diante de uma possessão verdadeira ou se ele apenas está perdendo a cabeça, o questionamento inicial até faria sentido, mas tal como está parece apenas perda de tempo, afinal, para que levantar uma discussão se logo a seguir iremos ignorá-la. O formato de found footage também vai perdendo o sentido conforme o filme se desenvolve e a entidade passa a tomar o controle do protagonista, já que não faz sentido que um demônio saísse por aí com uma câmera filmando a si mesmo ou suas atrocidades. Se o filme se limitasse a mostrar os eventos pelas câmeras nos cômodos da casa até seria aceitável, mas um demônio viciado em selfies é difícil de engolir.

Nada na trama funciona, mas pelo menos o filme dá medo, certo? Não, lamentavelmente não. Os sustos consistem basicamente de imagens distorcidas e barulhos altos, fora isso segue a mesma regra de qualquer outro filme ruim de found footage de que toda vez que a câmera fica muito tempo fixa em algum lugar, algo irá subitamente acontecer ou pular na frente da câmera. De resto temos aquela câmera ultra tremida que até faz sentido quando a obra é ancorada em filmagens amadoras, mas ao estabelecer o protagonista como um documentarista profissional, portanto alguém que sabe manejar uma câmera, não faz sentido que essa câmera vire para todos os lados, a menos, claro, que as pessoas envolvidas neste filme nunca tenham visto um documentário em suas vidas e acham que é apenas um bando de amadores filmando de modo improvisado, sem qualquer planejamento ou preocupação estética. Não há qualquer esforço em criar uma atmosfera de medo ou incerteza como fez o bacana Corrente do Mal, há apenas uma coleção de sustinhos aleatórios jogados no público sem muito critério. Além disso temos alguns momentos típicos de "filmes de possessão" com o sujeito se contorcendo em poses impossíveis (como no igualmente péssimo Exorcistas do Vaticano) ou mutilando o próprio corpo, mas a menos que você tenha o estômago muito fraco ou nunca tenha visto um filme de terror em toda sua vida nada disso choca ou impressiona como deveria.

Para não dizer que este A Possessão do Mal é completamente inócuo, falo que ele me levou a vários questionamentos sobre minha vida, tais quais: Como me dispus a ver isso? Não seria melhor eu levantar e ir embora? Será que eu sou um péssimo ser humano sem qualquer resquício de autoestima, senso de vergonha ou amor próprio para me sujeitar a algo tão ruim?

Nota: 1/10

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