E
lá vamos nós para mais um terror barato (financeira e artisticamente) ao estilo
found footage que traz tudo aquilo
que todos os outros filmes nesse estilo fazem ao ponto de serem quase
indistinguíveis e basicamente tudo que eu tinha falado sobre o péssimo A Forca vale também para este A Possessão do Mal ao ponto em que eu
pensei em simplesmente dar um "copiar e colar" no texto e apenas
mudar o nome do filme. Mas como não sou adepto do autoplágio (ou qualquer tipo
de plágio para falar a verdade) e verdadeiramente creio que o esforço analítico
de uma obra fílmica sempre pode acrescentar algo ao nosso entendimento da arte,
da vida ou de nós mesmos, então vamos pensar um pouco a respeito desse filme e
ver o que sai.
O
filme acompanha o documentarista Michael King (Shane Johnson), um homem que
acabou de perder a esposa e resolve fazer um filme para provar que não existe
nenhum tipo de ocorrência sobrenatural. A filmagem é motivada pelo fato de que
ele deveria ter viajado com a esposa no período em que ela foi acidentalmente
atropelada, mas ela se recusou devido ao conselho de uma cartomante, então o
marido culpa a tal charlatã e decide mostrar que não há nada de sobrenatural no
mundo. Para tal resolve a se sujeitar a todo e qualquer ritual de magia negra,
conjuração demoníaca, necromancia, enfim, qualquer coisa que pareça terrível.
O
filme pede que simpatizemos com ele pela sua dor e usa o luto para justificar
as ações do personagem, o problema é que os roteiristas esquecem que o viúvo
tem uma filha pequena para cuidar, então por mais triste e magoado que ele
esteja, encher a casa de imagens demoníacas e se submeter a rituais envolvendo
LSD e outras drogas não parece a melhor maneira de dar apoio a uma garotinha
que acabou de perder a mãe em um acidente violento. Assim, ao invés de um pobre
viúvo Michael nos soa como um imbecil egoísta que se assume riscos tolos sem
pensar que é a única pessoa capaz de cuidar para filha e sem se preocupar com a
própria dor da garota, já que em nenhum momento vemos ele conversando com a
menina sobre a perda da mãe.
Aliás
o filme faz questão de lembrar o tempo todo da morte da esposa ao colocar
muitos planos nos quais a aliança de Michael está no centro do quadro ou pelo
modo como o ator Shane Johnson insiste
em passar os dedos sobre o anel o tempo todo em uma risível muleta de
interpretação já que Johnson jamais consegue convocar a profunda dor e
desamparo que poderia levar alguém a um experimento tão
imprudente (e nos fazer crer nisso). A noção de "construção de personagem" das pessoas
envolvidas neste filme passa longe do esforço em compreender e demonstrar
qualquer tipo de sentimento ou emoção humana genuína, mas apenas uma série de
cacoetes estilísticos e performáticos que servem apenas para lembrar que o
personagem possui apenas uma característica identificável.
A
tentativa inicial de colocar algum tipo de denúncia em relação a esse tipo de
cartomante e médium que vendem auxílio sobrenatural é defenestrada pelo fato da
narrativa deixar claro que ele está possuído por uma entidade demoníaca. Se o
filme deixasse em aberto se estamos diante de uma possessão verdadeira ou se
ele apenas está perdendo a cabeça, o questionamento inicial até faria sentido,
mas tal como está parece apenas perda de tempo, afinal, para que levantar uma
discussão se logo a seguir iremos ignorá-la. O formato de found footage também vai perdendo o sentido conforme o filme se
desenvolve e a entidade passa a tomar o controle do protagonista, já que não
faz sentido que um demônio saísse por aí com uma câmera filmando a si mesmo ou
suas atrocidades. Se o filme se limitasse a mostrar os eventos pelas câmeras
nos cômodos da casa até seria aceitável, mas um demônio viciado em selfies é difícil de engolir.
Nada
na trama funciona, mas pelo menos o filme dá medo, certo? Não, lamentavelmente
não. Os sustos consistem basicamente de imagens distorcidas e barulhos altos,
fora isso segue a mesma regra de qualquer outro filme ruim de found footage de que toda vez que a
câmera fica muito tempo fixa em algum lugar, algo irá subitamente acontecer ou
pular na frente da câmera. De resto temos aquela câmera ultra tremida que até faz sentido quando a obra é ancorada em filmagens amadoras, mas ao estabelecer o protagonista como um documentarista profissional, portanto alguém que sabe manejar uma câmera, não faz sentido que essa câmera vire para todos os lados, a menos, claro, que as pessoas envolvidas neste filme nunca tenham visto um documentário em suas vidas e acham que é apenas um bando de amadores filmando de modo improvisado, sem qualquer planejamento ou preocupação estética. Não há qualquer esforço em criar uma atmosfera de
medo ou incerteza como fez o bacana Corrente do Mal, há apenas uma coleção de sustinhos aleatórios jogados no público
sem muito critério. Além disso temos alguns momentos típicos de "filmes de
possessão" com o sujeito se contorcendo em poses impossíveis (como no
igualmente péssimo Exorcistas do Vaticano)
ou mutilando o próprio corpo, mas a menos que você tenha o estômago muito fraco
ou nunca tenha visto um filme de terror em toda sua vida nada disso choca ou impressiona como deveria.
Para
não dizer que este A Possessão do Mal é
completamente inócuo, falo que ele me levou a vários questionamentos sobre
minha vida, tais quais: Como me dispus a ver isso? Não seria melhor eu levantar
e ir embora? Será que eu sou um péssimo ser humano sem qualquer resquício de
autoestima, senso de vergonha ou amor próprio para me sujeitar a algo tão ruim?
Nota:
1/10
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