sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Crítica - Straight Outta Compton: A História do N.W.A


Análise  Straight Outta Compton: A História do N.W.A

Review Straight Outta Compton: A História do N.W.A
Um grupo de pequenos traficantes discute negócios em uma casa na periferia, de repente um veículo policial blindado munido de um aríete na dianteira arrebenta a parede frontal da casa e dezenas de policiais fortemente armados invadem o recinto. Podia ser algo saído de algum daqueles filmes de ação exagerados da década de 80 tipo Stallone Cobra (1986) ou Comando Para Matar (1985), mas na verdade foram eventos reais ocorridos na região de Compton em Los Angeles e é nesse cenário de gangues e forte intervenção policial que surge o grupo de rap N.W.A (Niggaz Wit Attitudes).

A trama acompanha a trajetória do grupo, de suas origens humildes em Compton aos anos de sucesso, focando principalmente em Ice Cube (O'Shea Jackson Jr, filho de Cube na vida real e parecidíssimo com o pai), Dr. Dre (Corey Hawkins) e Eazy-E (Jason Mitchell). O filme vai seguir aquela estrutura básica de cinebiografias de artistas, tratando das dificuldades, da inspiração para suas músicas, dos conflitos internos e brigas com gravadoras, nada muito diferente do que já vimos em outros filmes sobre músicos.

Outro problema é que por tratar de muitos personagens em um período de tempo relativamente amplo tudo acaba se desenvolvendo rápido e fragmentado demais, não nos dando o devido tempo para nos envolver com os personagens ou suas situações, um problema que costumeiramente acomete este tipo de filme, como já tinha acontecido com Jersey Boys: Em Busca da Música (2014). Em um momento conhecemos o irmão de Dre, para no seguinte descobrirmos que ele morreu em um acidente e tudo é tão rápido que mal podemos reagir, pois nem conhecíamos o personagem direito e assim o impacto de sua morte é diminuído, não fosse o competente trabalho de Corey Hawkins ao evocar a dor de Dre, seria bastante difícil aderir ao acontecimento. Temos também muitas menções rápidas a eventos ou trabalhos marcantes dos artistas que nos são apresentados ao estilo "piscou, perdeu" de tão rápido que passam pela tela, como a breve menção de Cube sobre estar trabalhando no roteiro de Sexta-Feira em Apuros (1995) ou o momento em que Dre apresenta sua mais recente descoberta, Snoop Dogg (Keith Stanfield) aos amigos.

Acerta, no entanto, ao mostrar todo o clima de repressão policial ao qual os personagens eram submetidos constantemente e que motivou a seminal canção Fuck The Police composta por Cube, um intenso e raivoso protesto contra a brutalidade policial. O diretor F. Gary Gray ainda evita de cair no erro de martirizar os personagens, deixando claro o envolvimento de alguns deles com o crime, mas ainda assim deixa claro que independente de serem ou não criminosos, de estarem ou não cometendo um crime, eles são tratados do mesmo modo pelas autoridades e são constantemente abordados, humilhados e revistados. O ápice disso é a cena em que saem do estúdio de gravação para comer e são abordados por um grupo de policiais sem nenhum motivo além de serem um grupo de jovens negros parados na frente de um prédio chique, um momento que consegue gerar em nós a mesma indignação que os abusos de autoridade vistos no recente Selma: Uma Luta Pela Igualdade.

Acompanhamos também toda a reação da mídia e das autoridades à canção, tratando-a como uma glorificação do crime e um ataque subversivo ao Estado, mas a construção cuidadosa de Gray nos faz ir além desse olhar superficial, compreendendo que na verdade é um raivoso grito de denúncia e resistência a um abuso cotidiano de direitos civis. Uma pena, então, que o resto do filme não seja tão bem construído, em especial se considerarmos que todo o segmento envolvendo essa canção e sua repercussão se encerra antes do filme chegar na metade e não há nada que seja tão envolvente e poderoso quanto essa parte, já que o resto é bastante apressado e superficial. Apenas perto do fim, quando se dedica a falar da doença de Eazy-E é que temos outro arco dramático relativamente bem construído.

Isso é ainda mais lamentável por causa da dedicação do trio de atores principais. Em especial Jackson Jr, que além de ser idêntico ao pai, também acerta na postura imponente e irritadiça de Cube. Corey Hawkins acerta na personalidade de Dr Dre, enquanto que Mitchell traz uma boa dose de carisma a E, um rapper de voz aguda, quase que infantil, que canta sobre sexo, drogas e gângsteres. O trio, assim como os demais membros do grupo, consegue recriar com precisão as performances enérgicas e furiosas do N.W.A, transmitindo bem a força do grupo, sua presença de palco e o fascínio que gerava em seus fãs. Paul Giamatti interpreta o primeiro empresário do grupo e responsável pelas rusgas entre eles, apesar do habitual talento do ator, ele não tem muito a fazer além do típico agente manipulador que rouba dos clientes enquanto que os convence de estar cuidando de seus interesses.

Deste modo, embora por vezes soe superficial e não consiga dar conta de todas as histórias que se propõe a contar, o filme acerta no modo como levanta a discussão sobre direitos civis e abuso de poder por parte das autoridades ao mesmo tempo que relata todo o legado musical e cultural deixado por esse grupo de artistas.

Nota: 7/10

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