Mais
uma vez dirigida por Sam Mendes depois do ótimo 007: Operação Skyfall (2012), esta nova aventura do agente James
Bond parece encerrar a quadrilogia iniciada em 007: Cassino Royale (2006) e traz constantes referências a eventos
e personagens dos filmes anteriores. Ver ou lembrar dos outros três filmes que
trazem Daniel Craig como o famoso espião, no entanto, não é um requisito
indispensável para acompanhar esse filme, mas certamente irá adicionar algumas
camadas de entendimento.
Nessa
nova aventura, Bond (Daniel Craig) segue as últimas instruções da falecida M
(Judi Dench) para localizar um perigoso terrorista, que revela ligações com a
sombria organização Spectre, liderada pelo misterioso Oberhauser (Christoph
Waltz). Ao mesmo tempo, o novo M (Ralph Fiennes) enfrenta a desconfiança do
novo chefe dos serviços de inteligência britânica, C (Andrew Scott, o Moriarty
da série Sherlock), que deseja
encerrar o programa 00 e substituir os agentes de campo por drones e vigilância digital.
Toda
essa ideia da eficiência do 007 colocada em dúvida, bem como essa construção
dele como um sujeito analógico em uma era digital e também a noção de que
nenhum programa ou equipamento remoto substitui a perspicácia e capacidade de
julgamento e improviso de um humano em campo já tinha sido trabalhada (e
melhor) no filme anterior. Além dessas ideias repetidas, a fita também derrapa
em uma estrutura um pouco repetitiva e óbvia, principalmente no miolo de suas
quase duas horas e meia de projeção. O segundo ato consiste basicamente de Bond
indo a um local exótico, descobrindo uma nova pista que o leva para um novo
local exótico, onde descobrirá uma nova pista e assim por diante, alongando o
filme mais do que necessário e inchando uma trama que é relativamente simples. 007: Operação Skyfall tinha apenas cinco
minutos a menos do que este e nem de longe era tão cansativo.
Apesar
disso, Sam Mendes exibe aqui a mesma competência que no filme anterior. A cena
de abertura que se passa em meio a um amplo desfile de Dia dos Mortos no México
é certamente uma das melhores da franquia, desde o inicial plano sequência que
acompanha Bond pelas ruas e telhados da cidade sem nenhum corte, passando pela
luta no helicóptero que transcorre sem diálogos ou efeitos sonoros, apenas com
a música. As cenas de ação evitam abusar desnecessariamente de computação
gráfica, investindo sempre que pode em efeitos práticos e no trabalho dos
dublês e usando amplas panorâmicas para valorizar os espaços. Mendes ainda compõe
este universo de espiões e organizações secretas com uma ambientação sombria,
investindo em ambientes tomados por sombras ou névoa, como se os lugares
habitados por essas pessoas fosse tão soturno quanto eles próprios.
Daniel
Craig continua com a mesma competência no papel de Bond, enquanto que Q (Ben
Winshaw), Moneypenny (Naomie Harris) e M ganham um pouco mais de espaço na
trama, inclusive ajudando Bond em campo. A sempre ótima Lea Seydux (de Azul é a Cor Mais Quente e a versão
francesa de A Bela e a Fera do ano
passado) concebe sua Dra. Swann como uma mulher segura de si e que não aceita
ser arrastada por Bond como uma acompanhante passiva, desafiando-o e colocando
sua conduta em xeque durante vários momentos. É uma pena, portanto, que ela
seja reduzida a uma donzela em perigo no final do filme.
Já
o Franz Oberhauser interpretado por Christoph Waltz (o eterno Hans Landa) acaba
se revelando como uma grande decepção. Se no início o filme acerta ao mantê-lo
nas sombras, como uma força sombria manipulando todos os eventos, quando ele é
de fato posto cena no terceiro ato, acaba por ser uma caricatura risível. O
momento em que ele expõe suas motivações durante a praticamente
obrigatória cena de tortura (que é de fato angustiante) é simplesmente ridículo
ao ponto de beirar o autoparódico e parece mais algo de uma história do Austin
Powers do que um filme sério.
Seu
vilão é o tipo de personagem que funciona melhor como uma força da natureza,
uma pura encarnação do mal ou um bicho-papão e não precisa qualquer explicação, afinal um monstro é sempre mais assustador quando não se sabe nada a
seu respeito, o típico caso no qual menos é mais. Além disso, num ano em que
tivemos o ótimo e metalinguístico Kingsman: Serviço Secreto nos trazendo vilões que executam os espiões no momento
imediato da captura, ver um vilão como Oberhauser se entregar a esquemas e
armadilhas rocambolescas cujo fracasso é incrivelmente óbvio (e digno de um
desenho do Hortelino) é bem difícil de engolir, algo que acontece na cena final
envolvendo um prédio condenado.
Decepciona
também o misterioso Hinx vivido por Dave Bautista, que surpreendeu como o Drax
de Guardiões da Galáxia. Sua primeira
aparição envolve um brutal e inesperado assassinato, digno dos mais exóticos
"capangas silenciosos" da franquia como Jaws e Oddjob, mas depois
disso ele não apenas tem pouco a fazer, como também acaba sendo despachado cedo
e fácil demais, não tendo o devido espaço para mostrar a que veio.
007 Contra Spectre pode não superar a aventura anterior do agente
secreto, sendo prejudicado por um ritmo irregular e vilões caricatos, mas funciona
pelas cenas de ação e a ótima condução de Sam Mendes, além do carisma do elenco
principal.
Nota:
7/10
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