A
discussão sobre os direitos da mulher, igualdade de gêneros e suas
representações tem sido bastante exploradas ultimamente no cinema. Apenas nos
últimos meses tivemos os ótimos Olmo e a Gaivota, filme da brasileira Petra Costa que trazia um olhar bem
interessante sobre a gestação, e o documentário Malala, sobre a jovem paquistanesa baleada pelo talibã depois de
protestar contra a proibição das mulheres frequentarem escolas. Esse As Sufragistas continua esse movimento
de falar a respeito dessas questões, mas lamentavelmente não chega a ser tão
interessante quanto os filmes anteriormente citados.
A
história se passa na Inglaterra no início do século XX quando as mulheres ainda
eram proibidas de votarem. Depois que o parlamento nega o mais recente pedido
pelo voto feminino, um grupo feminista começa a coordenar atos de desobediência
civil para chamar atenção para o problema. A operária Maud (Carey Mulligan)
entra em contato com o movimento graças a uma colega de trabalho e, apesar de
não nenhuma formação política, percebe que o direito ao voto poderia ser um
caminho para uma vida melhor e mais igualitária para as mulheres.
A
trama remonta a uma época na qual as mulheres eram tratadas praticamente como
objetos ou propriedade e eram consideradas naturalmente inferiores (e no qual
estupro era algo corriqueiro), com discursos sobre o seu desequilíbrio
emocional ou baixa capacidade intelectual servindo como justificativa para a
negação de direitos. Se parece que avançamos alguma coisa, tente substituir
"mulher" por "negro" ou "gay" em qualquer frase
preconceituosa do filme para ver que ainda temos um longo caminho a trilhar
para uma sociedade mais igualitária.
A
questão é que diferente do que fez o ótimo Selma: Uma Luta Pela Igualdade, As
Sufragistas não consegue oferecer um contexto apropriado do período. Nós
vemos a negação inicial do parlamento, mas em nenhum momento o filme tenta
explicar o que levou até esse momento e todas as outras negativas anteriores,
já que fica claro que o movimento existe a décadas. Deste modo, as ações
extremas do grupo, que poderiam ser perfeitamente compreensíveis caso
tivéssemos uma clara noção do quanto foram tapeadas ao longo dos anos pelo
Estado, não parecem plenamente justificadas, quase como se todas perdessem a
cabeça diante da primeira negativa. Ao invés de deixar claro que este é um
conflito que foi se desenhando ao longo de anos de luta e desgaste, o filme faz
tudo parecer uma reação a uma única ação do governo.
Da
mesma maneira, ao nos manter afastados do comando do movimento, cuja líder é
interpretada por Meryl Streep (mas que aparece por, no máximo, uns cinco
minutos), não temos acesso ao pensamento estratégico que norteia o planejamento
das ações e assim, o que deveriam ser atos pensados para chamar atenção para a
causa acabam parecendo fruto apenas de desejos ou caprichos aleatórios das
lideranças do movimento.
Apesar
do modo superficial que o filme trata o movimento, aderimos à história não
apenas pela sua temática, mas pela empatia que Carey Mulligan consegue trazer à
sua Maud. Inicialmente uma trabalhadora pacata, que se incomoda com o assédio
do chefe, mas não tem coragem de fazer nada a respeito e se comporta de modo
subserviente ao marido, dando-lhe todo seu salário como se fosse incapaz de
gerenciar o próprio dinheiro. No entanto, conforme se aproxima das militantes
vai percebendo como ela pode e deve lutar por igualdades e por direitos que lhe
foram negados, já que não há outra forma de romper este ciclo.
É
uma pena que acabe esquecendo da personagem em seu desfecho, concentrando-se
somente em falar sobre as conquistas e desafios do movimento feminista em seus
últimos momentos, mas esquece de dar qualquer senso de conclusão ao arco da
personagem, sabemos que ela continuou no movimento e só, mas, por exemplo, nada
é dito sobre a relação dela com o filho. Eu sei que este é um filme "de
tese", feito para apresentar um argumento e discorrer sobre ele, mas se
houve a escolha de ancorar a narrativa em uma determinada personagem e em seu sofrimento,
um sentimento de resolução deste arco é o mínimo que se pode esperar. Tropeça
também no modo como nos apresenta a morte de uma das mulheres do movimento, que
é retratado como um acidente estúpido e praticamente cômico ao invés do
sacrifício deliberado que praticamente foi.
As Sufragistas acaba sendo superficial demais em seu retrato sobre
o movimento que defendia o voto igualitário, mas funciona graças à boa
protagonista e pela importância do debate que propõe.
Trailer:
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