quinta-feira, 14 de março de 2013

Crítica - A Fuga

Creio que nunca o título de um filme transmitiu tão bem a sensação que eu tive durante a apreciação da obra. Durante os cerca de noventa minutos do filme (mas que pareceram durar muito mais) tudo que eu sentia era vontade de fugir da sala de cinema e tirar da memória esse desastre horrendo.
O filme acompanha um trio de ladrões que, depois de um assalto bem sucedido, rumam para a fronteira dos Estados Unidos com o Canadá. Quando o carro em que viajam sofre um acidente, apenas os irmãos Addison (Eric Bana) e Liza (Olivia Wilde) sobrevivem e decidem se separar para terem melhores chances de chegar à fronteira do Canadá. Em paralelo, o ex-boxeador Jay (Charlie Hunnam) acaba de sair da prisão e mata acidentalmente seu antigo treinador, com medo de voltar para cadeia, segue para a casa dos pais, uma fazenda próxima à fronteira do Canadá.
Até então nada que já não tenhamos visto anteriormente nesses suspenses pés-de-chinelo que passam direto no Supercine da Globo. A premissa, apesar de bem básica, poderia até render um caldo razoável ao tratar dessas pessoas que seguem em fuga não apenas de seus atos, mas de seu passado, entretanto, a execução é péssima e a sensação é que os realizadores simplesmente não sabiam o que fazer com sua narrativa, todo desenvolvimento do filme acontece apenas por necessidade do roteiro e nunca por algo realmente motivado pelos personagens ou pelo contexto.

O fato das transformações dos personagens soarem gratuitas é ainda mais prejudicado pelo fato do filme sequer saber quem são seus personagens, falhando em estabelecer para eles qualquer característica digna de nota ou carisma próprio. Assim, quando Liza se tranca no banheiro depois de transar com Jay e chora por estar se apaixonando por ele, é impossível acreditar em seu sentimento, já que tudo que fizeram foi trocar meia dúzia de palavras (os diálogos são péssimos, por sinal). A ação soa ainda mais incoerente quando lembramos que ela deliberadamente seduziu Jay para poder manipulá-lo. Tudo isto ainda é piorado pelo desempenho de Olivia Wilde, cuja atuação limita-se a arregalar seus grandes olhos azuis toda vez que precisa demonstrar qualquer emoção, usando-os como mera muleta de interpretação.
O filme é permeado por esse tipo de acontecimento gratuito e injustificado, mas este não é o pior problema na história. O que absolutamente faz o filme ir ladeira abaixo é a mudança sem sentido que acontece com o personagem Addison. Nos primeiros minutos o filme faz questão de mostrar ele pedindo desculpas ao policial que está prestes a matar por ter presenciado seu acidente de carro, mostrando que ele não exatamente gosta de eliminar pessoas, mas o faz por ter chegado a um ponto onde não tem outra escolha. O personagem parece ser alguém que fez escolhas erradas na vida e não vê mais volta, mas que não é essencialmente maligno.
Os confrontos seguintes corroboram essa ideia e também parecem motivados apenas pela necessidade de fugir ou por ainda demonstrar algum senso de justiça como o momento em que ele elimina um caçador que deixa a esposa e dois filhos morrerem de frio. Momentos depois, no entanto, o personagem se transforma como que num passe de mágica e se torna um psicopata sádico que sente prazer em matar e torturar suas vítimas. Simplesmente é impossível comprar essa transformação e o fato do Eric Bana compor o personagem como um lunático caricato também não ajuda.
A todos os problemas de coerência de roteiro somam-se algumas sequências de ação com uma montagem exageradamente acelerada que falha em estabelecer uma mínima lógica espacial, em especial na perseguição com trenós motorizados onde é bem difícil saber quem está aonde e fazendo o quê com quem. Sem falar no erro de continuidade que dá início à sequência e sem ele a perseguição nem deveria acontecer.
Desta bagunça salva-se apenas a fotografia que se aproveita bem das tundras desoladas do norte dos Estados Unidos usando sombras e cores frias para potencializar o vazio e a hostilidade do ambiente frio, bem como a “cegueira branca” provocada pelas nevascas que ocorrem a todo momento. Uma pena essa bela fotografia estar a serviço de um produto tão mal formulado. No fim das contas, A Fuga é, com o perdão do trocadilho, um filme do qual se deve fugir.
Nota: 2/10

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