sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Crítica – Inside Llewyn Davis: Balada de um Homem Comum

Análise Inside Llewyn Davis: Balada de um Homem Comum

Review Inside Llewyn Davis: Balada de um Homem ComumO mundo das artes é um ambiente difícil, muitas vezes o reconhecimento demora a chegar e demora também para que conseguir se sustentar apenas com a arte. Para muitos, inclusive, o reconhecimento nunca chega e estes se voltam para outras ocupações ou morrem desconhecidos e com o mundo da música não é diferente. Alguns se tornam músicos pela fama, outros pelo dinheiro, mas muitos o fazem pelo amor a arte, porque a usam para tirar algo do fundo de suas almas e expor para mundo. Inside Llewyn Davis: Balada de um Homem Comum trata sobre as dificuldades do meio musical, afinal além de arte a música é também um comércio, uma indústria, e para ser reconhecido, se destacar e se sustentar, não basta ser um artista competente, outros atributos são necessários e as vezes grandes artistas acabam no anonimato por não serem “comercialmente viáveis”.
A trama é levemente baseada na vida do músico Dave Van Ronk (1936-2002), músico importante do cenário da musica folk de Greenwich Village nos anos 60 de onde saíram artistas famosos como Bob Dylan. O filme acompanha Llewyn Davis (Oscar Isaac) e seus percalços para tentar vencer como músico. Sem dinheiro, Llewyn vive como um eremita dormindo na casa de amigos enquanto espera seu agente mandar material para o famoso empresário Bud Grossman (F. Murray Abraham), que pode fazer sua carreira deslanchar.

O filme investe em espaços diminutos, corredores estreitos e enquadramentos próximos para revelar o quão pouco esses personagens têm e a situação precária em que se encontram. Do mesmo modo, a fotografia se vale predominantemente de uma paleta de cores de baixa saturação tornando os ambientes pelos quais Llewyn transita como lugares frios e hostis, que lhe oferecem mais dificuldades e problemas do que conforto.
Toda a obra é permeada por esse clima de fatalismo e falta de esperança no futuro, como se Llewyn soubesse que o ostracismo é seu destino final e ainda assim, por devoção a sua arte, se mantem em seu caminho, mesmo com a clara noção de que isso pode não levá-lo a lugar algum. Tudo isso é beneficiado pela condução sóbria e sem concessões dos irmãos Coen, famosos por não aliviarem a barra de seus protagonistas, nem oferecerem soluções ou catarses fáceis e aqui não é diferente. Os problemas se acumulam sem dó sobre os ombros do protagonista, contrariando a tradicional jornada rumo ao sucesso que se espera de filme assim. Neste filme, no entanto, cada reviravolta serve apenas para reforçar que nada de bom deve aguardar Llewyn no fim de sua caminhada e em geral essas viradas acontecem de forma bastante orgânica, sem nunca parecer que os diretores estão pesando a mão apenas para fazer o personagem sofrer.
Nada disso, no entanto, se sustentaria sem a sólida performance de Oscar Isaac, que constrói o personagem como um homem cansado e frustrado que há algum tempo já se deu conta de que suas chances de sucesso são poucas e diminuem cada vez mais. Seu olhar parece o de alguém que não dorme e não come direito há tempos e seu sentimento de fracasso é mascarado por um comportamento cínico e excessivamente sisudo, como se ele levasse seu ofício mais a sério do que deveria. Isso fica claro na cena em que ele explode diante de um casal de amigos que lhe pedem para cantar durante um jantar e Llewyn grosseiramente se recusa, afirmando ser um profissional.
Na verdade, o filme aponta que parte da razão do seu fracasso seja ele próprio, afinal, recusa-se a colaborar com o amigo Jim (Justin Timberlake) por considerar que suas canções são tolas demais, aceitando o pagamento apenas pela gravação e abrindo mão dos royalties de reprodução da música, e também por insistir em se apresentar sozinho mesmo quando todos dizem que por mais competente que seja, por mais que suas músicas sejam um retrato genuíno de sua alma, falta-lhe algo para chamar atenção para si mesmo quando sobe no palco.
Tudo bem que ele tem motivos de sobra para querer se apresentar sozinho depois do que ocorreu com seu antigo parceiro, mas Llewyn não parece disposto a fazer qualquer tipo de concessão para fazer sua carreira progredir. Afinal, como já disse, música é simultaneamente arte e comércio e talento sozinho não basta para atingir o sucesso, já que muitos tem habilidade musical, então algo mais seria necessário. Assim, a jornada de Llewyn não poderia ter um desfecho que revelasse mais a natureza impiedosa do mundo musical, no qual alguns são esquecidos enquanto outros são louvados, do que a imagem final do protagonista em paralelo com a música de Bob Dylan que toca em um clube próximo.
Inside Llewyn Davis: Balada de um Homem Comum é um triste e melancólico conto sobre aqueles que, a despeito de sua competência, acabam nas notas de rodapé da história da música ou são condenados à irrelevância e ao esquecimento.
Nota: 10/10

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