quinta-feira, 11 de julho de 2013

Crítica – O Homem de Aço

Ao contrário da Marvel, que conseguiu consolidar seu universo cinematográfico nos cinemas, os personagens da DC não tiveram exatamente a mesma sorte. Claro, os três Batman dirigidos por Christopher Nolan fizeram grande sucesso entre público e crítica, mas o fracasso retumbante de Lanterna Verde (2011) fez o estúdio colocar seu próximo projeto de super-heróis sob a coordenação de Nolan, que escreveu (ao lado de David Goyer) e produziu este O Homem de Aço, deixando a direção a cargo de Zack Snyder (Madrugada dos Mortos, 300).
O filme reapresenta a origem do herói, mostrando o planeta Krypton como um mundo estéril, controlado por um rígido sistema de castas e uma ideologia eugênica, uma abordagem que se assemelha bastante à seminal história em quadrinhos O Homem de Aço (o filme ainda remete a outros arcos como O Legado das Estrelas e o recente Superman: Terra Um), escrita por John Byrne na década de 80. A destruição de Krypton se dá pela exaustão dos recursos do núcleo do planeta e o cientista Jor-el (Russel Crowe) envia seu único filho à Terra para salvá-lo. Clark (Henry Cavill) é um jovem com um forte senso de inadequação, divido entre sua herança extraterrestre e sua criação terrena. Na sua busca por compreender quem é e de onde veio seu caminho se cruza com o da repórter Lois Lane (Amy Adams) e chama atenção dos militares, em especial do Coronel Hardy (Christopher Meloni). As coisas se complicam quando o implacável General Zod (Michael Shannon) e sua tropa de kryptonianos chegam ao nosso planeta, obrigando Clark a tomar uma decisão quanto ao seu lugar neste mundo. É uma história de origem bem aos moldes de Batman Begins (2005) e com a mesma atmosfera realista, tentando entender que impacto teria se um ser quase que onipotente se apresentasse diante do mundo.

É interessante a composição de Henry Cavill como o personagem, que nos apresenta um Superman melancólico e incerto quanto ao seu papel neste mundo, sendo bastante eficiente em evocar seu sentimento de deslocamento. Ao mesmo tempo, ele também evoca o peso que seus poderes representam e o temor pelas consequências de seu uso. É interessante perceber o amadurecimento do personagem ao longo do filme e como ele vai se mostrando mais sereno e confiante conforme vai abraçando sua responsabilidade e seu destino (o filme é permeado de simbolismos messiânicos) perante o planeta. Chama a atenção também o trabalho de Kevin Costner como Jonathan Kent, que incorpora os valores e a sabedoria de um homem comum que pode não ser capaz de compreender exatamente a situação de Clark, mas sabe o que é correto e tenta orientar o filho nesse sentido ao mesmo tempo em que teme o impacto de sua revelação ao mundo.
No quesito narrativo, o principal problema reside na estrutura e no ritmo da obra. O filme é entrecortado constantemente por flashbacks que mostram a juventude de Clark e mostram como ele se tornou o homem que é, mas estas informações passadas são jogadas de forma tão picotada, pontual e pouco orgânica que prejudica o desenvolvimento do arco dramático do personagem. Batman Begins, também escrito por Nolan e Goyer, apresenta um uso muito mais comedido do recurso, embora entrecortado pelos flashbacks, o passado de Bruce Wayne é apresentado em sequências mais longas e menos pontuais.  O ritmo e a cadência da narrativa é outro problema, a obra é tão focada no desenvolvimento de sua trama que não há quebras, pausas ou respiros durante fluxo do filme, é apenas trama, trama e mais trama, o que dá uma sensação maçante ao filme e a impressão de que estamos ouvindo uma música de uma nota só.
O diretor Zack Snyder, famoso por seu apuro estético, apresenta-se aqui de modo bastante contido. Por um lado isso é bastante benéfico, já que algumas de suas opções e preferências (em especial o uso da câmera lenta) se transformaram em cacoetes aborrecidos que prejudicaram suas obras mais recentes como Sucker Punch (2011) e Watchmen (2009). Por outro lado havia a expectativa de que a plasticidade do diretor trouxesse algo diferenciado à obra, mas isso não chega a ocorrer. Aqui e ali temos algumas escolhas interessantes como a paleta de cores escuras e frias, dando um tom sóbrio e até mesmo mais realista ao filme, evitando um colorido que fizesse tudo soar demasiadamente cartunesco.
Chamam atenção também as composições utilizadas nos flashbacks, contemplativas e cheias de planos-detalhe de elementos da natureza, como borboletas voando ou o vento batendo sobre roupas no varal. Numa comparação meio grosseira, remetem um pouco a Terrence Malick (Árvore da VidaAlém da Linha Vermelha) e sua reverência a natureza, aqui parece que o filme quer mostrar o encantamento que o mundo desperta em Clark, como se mostrasse a ele que cada pequeno pedaço do planeta é dotado de uma beleza e vida que vale a pena ser defendida e preservada, contrapondo assim a Terra com a infértil Krypton.
Já as cenas de ação são primorosamente bem realizadas, mostrando com competência a escala e o impacto do poder dos personagens. O voo é um movimento veloz e violento que rasga o ar, desloca as águas e racha o chão. Cada soco, cada impacto tem a força de uma grande explosão e a luta entre esses seres produz uma imensa destruição ao seu redor e seria ingenuidade pensar que seres tão poderosos deixassem tudo inteiro a sua volta. Esses elogios podem parecer simplórios, mas se lembrarmos do vexatório clímax de O Incrível Hulk (2008) onde Hulk e Abominável apenas trocam socos como se fosse um filme do Rocky Balboa ou a confusão de câmera e montagem da trilogia Transformers de Michael Bay deixam claro que cenas de ação em escala tão grandiosa não são exatamente fáceis de serem executadas. O único problema fica por conta dos “dublês digitais” que por vezes parecem demasiadamente artificiais.
Próximo do fim o Superman toma uma decisão que certamente irá despertar alguma polêmica e incomodará alguns fãs do personagem (eu mesmo me incomodei inicialmente). Entretanto essa não é a primeira vez que ele realiza uma ação do tipo, seja no cinema, seja nos quadrinhos (em O Homem de Aço do Byrne ele faz algo similar), sem falar que ela está totalmente conectada ao arco dramático do personagem e marca o momento em que ele definitivamente abraça sua herança terrestre e detrimento da kryptoniana e rompe definitivamente com seu planeta natal. O final ainda traz a perspectiva de uma nova e interessante dinâmica entre ele e Lois, sem mencionar as indicações de que o personagem habita em um universo maior, como o logo das Empresas Wayne que aparece em um satélite e as muitas menções à Lexcorp que deixam evidente a presença de certo careca megalomaníaco em uma inevitável continuação.
O Homem de Aço pode não estar à altura de toda a expectativa que criou em torno de si, mas ainda assim é uma aventura bem bacana e um recomeço digno para o personagem nos cinemas que aponta novos rumos para ele e, timidamente, para o universo cinemático da DC.
Nota: 7/10
Obs. O 3D convertido é completamente inútil e não acrescenta nada à experiência, basicamente apenas as legendas são tridimensionais. Melhor assistir no 2D normal e economizar a grana extra do ingresso.

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