segunda-feira, 28 de março de 2016

Crítica - Visões do Passado




Uma pessoa começa a ver gente morta e aos poucos ela vai percebendo que esses mortos estão querendo lhe dizer algo, como que lhe pedindo ajuda, e decide então seguir o caminho que os mortos lhe indicam na esperança de que isso lhe dê alguma paz. Esse é o enredo de O Sexto Sentido (1999) de M. Night Shyamalan, mas também é perfeitamente aplicável a este péssimo Visões do Passado, que tem problemas muito maiores do que apenas o plágio da trama.

O psicólogo Peter Bower (Adrien Brody) está com a vida em frangalhos desde a morte de sua filha. Tentando retornar ao trabalho depois do trauma, ele começa a receber pacientes indicados por seu amigo Duncan (Sam Neill). Coisas estranhas começam a acontecer durante as sessões até que Bower se dá conta de que todos os seus pacientes estão, na verdade, mortos.

O pior nem é a sensação de que já vimos tudo isso antes e sim o filme ser completamente incompetente em manejar a intriga e o suspense, já que cada reviravolta é terrivelmente óbvia, pode ser antecipada com enorme antecedência e algumas delas até comprometem a coesão interna do universo narrativo. Em dado momento Peter diz que o acidente da filha aconteceu por ter distraído por um instante, mas não consegue se lembrar o que estava vendo e nesse momento qualquer espectador minimamente atento saberá que isso é a chave para resolver tudo, mas o filme segue por um bom tempo sem tocar nisso, como se não tivéssemos reparado. Do mesmo modo, assim que sabemos que Peter se envolveu em um acidente de trem em sua juventude, fica completamente óbvio que aquilo que o distraiu foi algo relacionado a trens, mas ainda assim a narrativa irá demorar até chegar a essa conclusão.

Em outra cena uma personagem escreve alguns números em um papel e como anteriormente um personagem citou o ano 1987 e o escrito da personagem termina com estes mesmos algarismos, fica totalmente evidente que se trata de uma data, mas ainda assim tudo é conduzido como se fosse um grande mistério e mais uma vez uma revelação óbvia demora a vir. Assim, ao invés de nos mergulhar em um clima de suspense e incerteza, apenas nos brinda com um aborrecido teste de paciência enquanto cruzamos os braços e esperamos que o filme nos diga algo que já sabíamos.

Para compensar a pobreza na construção do suspense, o filme investe em alguns sustos súbitos bem gratuitos que raramente funcionam. Em parte porque fica claro que é um dispositivo safado usado apenas para nos impedir de cair no sono. Também por serem telegrafados com antecedência pela trilha sonora excessivamente intrusiva que berra em nossos ouvidos que um susto está a caminho. Já que falei em composições óbvias, tenho que mencionar a fotografia que faz questão de que tudo seja o mais escuro e carregado de sombras possível ao ponto que chega a soar falso e até ridículo o quanto tudo é terrivelmente sombrio.

Completando o desastre ainda temos a quantidade enorme de buracos que fazem a trama parecer um queijo suíço, além de várias inconsistências tonais. Inicialmente o filme parece querer pôr em dúvida se os fantasmas são alucinações ou assombrações verdadeiras, mas na verdade fica óbvio lá pela metade que são de fato fantasmas já que eles dão informações que o protagonista não tinha como saber.

Além do vai e vem desnecessário, algumas reviravoltas ainda contradizem informações anteriores. Quando um amigo de Peter se revela ser um fantasma, ficamos nos perguntamos como ele não sabia que esse grande amigo do mesmo ramo profissional tinha morrido, afinal é 2016 e mesmo em outro país esse tipo de coisa nos chega fácil via redes sociais, aplicativos e outras coisas, fazendo tudo soar incoerente em relação a amizade próxima que o filme estabelece entre os dois. Do mesmo modo, quando ele acessa suas reais memórias do que aconteceu no acidente de trem, não vemos em nenhum momento a participação de seu antigo colega de escola e assim questionamos seu suicídio pouco antes da revelação, afinal se o sujeito não participou de nada, o que motivou o suicídio?

As mesmas lacunas aparecem ao fim quando descobrimos que os fantasmas podem aparecem para outras pessoas que não Peter e podem até mesmo interagir diretamente com os vivos. Se eles podiam fazer isso e tinham interesse em punir o verdadeiro culpado, então qual o motivo de esperar tanto anos e ainda conduzir Peter nessa investigação ao invés de ir assombrar o criminoso e matá-lo?

A última cena que visa dar uma sensação de "final feliz" com Peter e a esposa falando em filhos também soa forçada e artificial, primeiro porque depois do primeiro ato o filme praticamente esquece da esposa e ela não é mais citada ao ponto em que imaginei que logo descobriríamos que ela também já tinha morrido, segundo porque tudo que aconteceu serviu para que ele tenha superado seu trauma de adolescência, mas em nenhum momento o filme se abre para abordar o fato dele eliminar de si a dor e o pesar pela morte da filha.

Adrien Brody trabalha no piloto automático e em boa parte do filme parece estar apenas entediado, assim como Sam Neill cuja expressão parece sempre dizer "vamos acabar logo com isso para eu receber meu cheque". O personagem de Brody é o típico pai traumatizado e jamais vai além do clichê e todos os personagens restantes são inócuos demais para despertar qualquer interesse. O único ponto positivo do filme é o fato dele ser relativamente curto, com um pouquinho menos de noventa minutos.

Visões do Passado nunca consegue afastar a sensação de que é um plágio mal feito de O Sexto Sentido, prejudicado ainda por um roteiro cheio de falhas, personagens desinteressantes e uma condução cheia de excessos.

Nota: 2/10

Trailer:

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