Confesso
que não estava esperando muita coisa de Zootopia.
Aventuras animadas estreladas por animais antropomórficos são uma constante no
cinema e apesar do bom humor dos trailers,
nada indicava que poderia ser diferente de qualquer outra produção similar.
Assim sendo, fiquei bastante satisfeito ao perceber que tinha me enganado e
além de uma aventura ágil e divertida, o filme ainda traz um competente comentário social sobre intolerância.
A
história se passa em um universo sem humanos no qual os animais evoluíram e
formaram uma sociedade similar à nossa. A protagonista é a coelha Judy Hopps
(Ginnifer Goodwin/Monica Iozzi) que sempre sonhou em se tornar uma policial da
cidade de Zootopia, algo que nunca tinha sido feito por nenhum outro coelho.
Superando as dificuldades do treinamento ela entra para a polícia mas é
subestimada por colegas e superiores. Quando uma série de desaparecimentos
começam a acontecer na cidade, ela vê uma oportunidade de provar seu valor, mas
ao curso da investigação seu caminho cruza com a raposa Nick Wilde (Jason
Bateman/Rodrigo Lombardi), um malandro que vive de pequenos golpes, e juntos
eles tentam resolver o mistério.
A
cidade é extremamente criativa, dividida áreas que recriam os ecossistemas dos
diferentes animais que lá habitam e tudo é feito levando em consideração as
diferentes escalas dos diferentes animais, como os trens, que tem três portas
diferentes, ou o bairro dos pequenos roedores, no qual Judy se sente uma
gigante em relação ao tamanho diminuto das construções. A cada instante
encontramos algo interessante e cheio de frescor a observar neste universo e o
filme consegue extrair boas piadas das possibilidades criativas desta cidade,
como a cena do departamento de trânsito ou a sorveteria de elefantes. Alguns
momentos de humor inclusive parecem mais direcionados aos adultos do que aos
pequenos, como o casamento dos roedores mafiosos que faz uma menção direta a O Poderoso Chefão (1972), mas isso não
impede que os pequenos apreciem o filme.
Judy
e Nick são protagonistas extremamente carismáticos, ela com sua atitude sempre
otimista e cheia de energia e ele com sua malandragem e sarcasmo. A relação dos
dois se baseia no velho clichê da dupla que se detesta, mas se adora, com um
complementando e ensinando algo que falta ao outro. Ainda assim há charme o
suficiente para que esta se desenvolva de modo orgânico e fica fácil entender o
que um vê no outro, embora o filme escolha por deixar implícito e relativamente
em aberto a natureza do relacionamento deles ao fim.
A
força da obra, no entanto, reside no comentário social que ela faz. Assim como
qualquer grande metrópole do nosso mundo, Zootopia é uma cidade plural,
habitada por diferentes espécies, mas isso não significa que eles convivam em
harmonia e o filme exibe uma grande dose de preconceito existindo entre os
diferentes animais. Tanto que existem vários "estereótipos raciais"
do tipo "coelhos são fofos" e "raposas são traiçoeiras", que
visam não apenas diminuir essas espécies, como também colocá-las à margem da
sociedade. As relações em Zootopia parecem governadas por um tipo de
determinismo social, no qual cada um tem uma única e imóvel posição a
preencher, tanto que Judy só consegue entrar na força policial graças a um
programa do governo, demonstrando a importância do Estado em promover a
inclusão e igualdade, mantendo a aceitação das diferenças.
Além
disso, nos mostra como mesmo as mais racionais criaturas podem se render a
preconceitos antiquados e irracionais quando uma crise se abate sobre a
sociedade, transformando imediatamente em inimigos todos aqueles que são
diferentes de si. Há também uma crítica ao modo como o governo e imprensa usam
o medo como ferramenta de dominação, instigando o pânico na sociedade para se
manter no controle de tudo.
Deste
modo Zootopia não é apenas uma
aventura ágil e divertida, mas também uma importante metáfora sobre
preconceito, exclusão social e o uso do medo como ferramenta política.
Nota:
8/10
Trailer:
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