Em nossa crítica de Ave, César!, novo filme dos irmãos Coen
que simultaneamente parodia e homenageia a Hollywood dos anos de 1940 e 1950,
falamos da natureza altamente referencial do longa e como os diretores se
inspiraram e fizeram graça em cima de personagens e tipos de filmes que
realmente eram feitos naquele período. Assim sendo, resolvemos falar um pouco
das personagens e filmes que compõem o olhar dos Coen sobre a Hollywood das
antigas.
O Chefe de Estúdio
O protagonista do filme é o chefe
de estúdio Eddie Mannix (Josh Brolin), encarregado de resolver os problemas dos
artistas e produções da fictícia Capitol Pictures. Mannix realmente existiu e
assim como no filme era um católico devoto, obcecado por seu trabalho e
costumeiramente tirava seus atores de encrenca. O Mannix real foi chefe de
estúdio da MGM de 1925 até o início da década de 1960 e sob sua batuta foram
feitos filmes como Quo Vadis (1951),
épico sobre um aristocrata romano que aos poucos começa a crer no cristianismo
que inspirou o Ave, César! feito dentro do filme. Essa não é a primeira vez que
Mannix é retratado nos cinemas, em 2006 ele foi vivido por Bob Hoskins em Hollywoodland: Bastidores da Fama, filme
que abordava a misteriosa morte de George Reeves, ator que interpretava o
Superman no seriados dos anos 50, na qual Mannix talvez estivesse envolvido.
Os Musicais Aquáticos
Em dado momento do filme, vemos a
atriz DeAnna Moran (Scarlett Johansson) filmando um número musical na água.
Esse tipo de musical no qual as performances eram na água fizeram bastante
sucesso entre os anos 40 e 50, tendo na atriz e ex-nadadora profissional Esther
Williams seu principal expoente. A personagem de Johansson, no entanto, não
teria sido baseada em Williams, mas, segundo os próprios Coen, em Loretta
Young, que assim como DeAnna teria adotado o próprio filho.
Os Filmes de Marinheiro
O galã Channing Tatum canta a
divertida canção No Dames falando
sobre o tempo que irá passar no mar sem a companhia de mulheres. A cena é uma
referência aos musicais cujos protagonistas eram marinheiros, trazendo complexos
números de dança e contando com a presença muitos artistas associados ao cinema musical do período. O famoso dançarino e ator Fred Astaire, por
exemplo, trabalhou em Nas Águas da
Esquadra (1938), no qual contracenou com Ginger Rogers. A cena, no entanto,
é uma referência mais direta ao filme Marujos
do Amor (1945), estrelado por Gene Kelly, Frank Sinatra e Ann Miller. É em Marujos do Amor, inclusive, que Kelly
faz seu famoso número de dança ao lado do ratinho animado Jerry (de Tom & Jerry).
O Caubói Romântico
Quando pensamos no western da Hollywood clássica
imediatamente imaginamos os filmes dirigidos por John Houston, John Ford ou
Howard Hawks e lembramos dos caubóis durões vividos por atores como John Wayne.
Existia, no entanto, outro tipo de caubói, um mais sensível, tão capaz de
grandes façanhas no tiro ou a cavalo quanto em conquistar as mocinhas com
baladas românticas ao violão. Os principais rostos desse ciclo de filmes foram
Gene Autry e Roy Rogers (em preto e branco na foto acima) e foi Rogers o
principal modelo para o ator Hobie Doyle, interpretado por Alden Ehrenreich.
As Fofoqueiras
No filme Tilda Swinton interpreta
as repórteres gêmeas Thora e Thessaly Tacker. Na Hollywood clássica o colunismo
social também era de fato dominado por duas jornalistas que, diferente de suas
contrapartes ficcionais, não eram gêmeas nem irmãs, mas eram tão eficientes
quanto em levar ao público as principais histórias de bastidores. Elas eram
Hedda Hopper (a esquerda na foto preto e branco) e Louella Parsons (a direita)
e também exibiam a mesma elegância que as personagens do filme. Hopper foi
recentemente retratada em outra produção, Trumbo: Lista Negra (2016), na qual foi interpretada por Helen Mirren (inclusive fizemos uma lista com os atores que interpretar pessoas reais no Oscar desse ano).
Os Stylish Meldoramas
Alguns dos mais prestigiosos produtos
do período retratado no filme dos Coen eram os chamados stylish melodramas. Mirando principalmente o público feminino,
traziam estrelas deslumbrantes, galãs elegantes e sets e figurinos
cheios de sofisticação. Em Ave, César!
o ator Hobie Doyle tenta ser catapultado ao estrelato em um melodrama que
parecia bastante com Sublime Obsessão
(1954) de Douglas Sirk.
O Diretor
Douglas Sirk, por sinal, também é
referenciado pela trama através do personagem de Ralph Fiennes. Da cadência
peculiar de sua fala ao seu terno de tweed,
o Laurence Lauretz de Fiennes é a homenagem dos Coen ao mestre do melodrama,
reconhecido por obras como Desejo Atroz
(1953), Tudo Que o Céu Permite
(1955), Palavras ao Vento (1956) e Imitação da Vida (1959).
Os Épicos de "Espadas e Sandálias"
A principal menção de Ave, César! é aos chamados épicos de
"espadas e sandálias", gênero da produção fictícia estrelada pelo
personagem de George Clooney dentro filme. Esses filmes foram uma resposta de
Hollywood aos chamados filmes peplum
(que em latim significa túnica) italianos, épicos que traziam histórias de
heróis mitológicos ou bíblicos como Hércules e Sansão. Já os épicos
hollywoodianos eram normalmente situados no império romano, normalmente no
período da ascensão do cristianismo, o já citado Quo Vadis (na parte de baixo da foto acima) é a principal obra emulada por Ave, César!, mas outros filmes como Ben Hur (1959) ou Spartacus (1960) também se encaixam na categoria.
Essas foram as principais
referências que conseguimos pegar do filme, mas se perceberem outras menções ou
brincadeiras metalinguísticas venham aqui e contem para nós.
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