Nostalgia
pode ser algo perigoso. Quando retornamos a algo que adorávamos quando éramos
mais novos, nem sempre aquilo que encontramos está a altura das memórias
afetuosas que tínhamos daquilo. Esse era exatamente meu medo ao assistir esta
adaptação de O Escaravelho do Diabo,
livro que compunha a famosa coleção Vagalume, bastante famosa na minha época de
garoto com suas histórias de mistério e aventura, mas felizmente a história que
eu lembrava com tanto carinho continua funcionando bem.
A
história se passa na pequena cidade de Vale das Flores clima pacato é quebrado
quando um assassinato deixa todos em polvorosa. O jovem Hugo Maltese (Cirillo
Luna) é morto com uma espada cravada no peito e sua morte parece estar ligada a
uma misteriosa caixa contendo um escaravelho que ele recebeu alguns dias antes.
Vendo que a polícia parece não saber como lidar com o crime, Alberto (Thiago
Rossetti), irmão mais novo de Hugo, resolve ajudar o delegado Pimentel (Marcos
Caruso) na investigação e aos poucos percebem que o criminoso tem um interesse
doentio em escaravelhos e pessoas ruivas.
É
uma típica narrativa de country house
murder ao estilo das histórias de Agatha Christie, nas quais uma
cidadezinha de interior tem seu cotidiano tranquilo perturbado por crimes
brutais que aos poucos vão abrindo antigas feridas e descobrimos que nem todos
ali são tão bonzinhos quanto parecem. O filme demora um pouco para engrenar nos
seus primeiros minutos, mas depois que os assassinatos começam a acontecer, a
narrativa consegue transmitir muito bem a tensão e o perigo constante que
parece rondar os personagens.
Inclusive,
lida bem com as consequências da divulgação da preferência do assassino com os
ruivos da cidade decidindo raspar a cabeça, fugir da cidade ou se enclausurarem
em casa. Os assassinatos são brutais e o filme não se intimida em mostrar
sangue, embora evite uma violência mais explícita, o que é compreensível, já
que é um produto voltado para um público mais jovem. As cenas na oficina do
assassino são realmente macabras, graças à áspera voz do criminoso que soa
verdadeiramente assustadora e também ao ambiente escuro, repleto de insetos que
faz tudo parecer algo sobrenatural ou demoníaco.
Ao
mesmo tempo, também consegue exibir certa leveza que impede que as coisas
fiquem sombrias demais para um público mais novo, seja nos momentos de humor,
como a cena em que Alberto "pilota" a moto do irmão no início, ou no
delicado despertar afetivo do garoto, que se interessa pela colega Raquel
(Bruna Cavalieri)
Marcos
Caruso se sai bem como um delegado pragmático, mas que percebe o peso da idade
sobre si. Suas tentativas de humor, no entanto, nem sempre funcionam,
principalmente quando descobrimos mais para frente que suas trapalhadas e
esquecimentos são frutos de uma doença degenerativa e rir de idosos com
problemas mentais não é muito legal.
O
veterano Jonas Bloch tem uma participação pequena, mas importante como um padre
que parece saber mais do que aparenta, assim como a aparição do
competente Lourenço Mutarelli (que esteve no excelente Que Horas Ela Volta?). O jovem Thiago Rossetti funciona muito bem
nas cenas de humor e tem uma boa química com Bruna Cavalieri, mas é irregular
ao tentar convocar o peso e a gravidade da morte do irmão sobre si e assim um
dos momentos mais dramáticos perde um pouco do impacto.
Assim
sendo, mesmo trabalhando com uma estrutura bastante familiar, O Escaravelho do Diabo consegue trazer um
mistério instigante e bem construído.
Nota
7/10
Trailer:
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