O
cinema brasileiro tem uma longa tradição na produção de filmes musicais, dos
musicais carnavalescos e chanchadas dos primeiros anos do nosso cinema sonoro,
passando pelos filmes da Jovem Guarda nos anos sessenta aos musicais do chamado
BRock, que traziam músicas e artistas do rock nacional, nos anos oitenta. Nos
últimos anos a produção musical se concentrou no filão das cinebiografias, como
Gonzaga: De Pai Para Filho (2012) ou Tim Maia (2014), nos quais os números de
canto e dança apareciam de modo mais "natural" através das
apresentações dos artistas.
Exemplares
"mais tradicionais" do gênero, nos quais os personagens começam a
cantar e dançar "do nada" para uma melodia que não está ali, tem
aparecido apenas em produções mais independentes como O Que Se Move (2013), que tinha um viés mais dramático ao se
concentrar em pessoas lidando com tragédias pessoais, e neste Sinfonia da Necrópole, que abraça o lado
mais cômico do musical, mas sem deixar de lidar com questões como nossa relação
com a morte ou o processo de urbanização das nossas cidades.
A
trama acompanha Deodato (Eduardo Gomes), um aprendiz de coveiro que tem
dificuldade em se adaptar a sua nova profissão. Sua situação melhora um pouco
com a chegada de Jaqueline (Luciana Paes) chega ao cemitério para fazer um
levantamento das tumbas abandonadas para poder usar os espaços não utilizados
para construir uma espécie de "cemitério vertical" já que não há mais
terreno disponível para os mortos.
A
trama é um comentário irreverente sobre a verticalização e gentrificação das
cidades que cresce incessantemente e empurra para longe aqueles que se colocam
no caminho de sua expansão, incluindo, neste caso, os mortos. Trata também da
desumanização das relações e como pouco a pouco vamos transformando pessoas em
"coisas" ou "objetos" dos quais podemos dispor como bem
entendemos sem nos importarmos em como nossas ações refletem nos outros.
Como
num musical tradicional, as canções servem para explicitar os sentimentos dos
personagens e ajudam a desenvolver as relações entre eles e avançar a trama. Os
números musicais são muitas vezes carregados de humor e irreverência, como no
samba em que os coveiros falam sobre sua profissão ou no divertido momento em
que Deodato canta Evidências de
Chitãozinho e Xororó. Outros, no entanto, são mais introspectivos e servem para
transparecer as angústias dos personagens como a canção de Deodato e Jaqueline
dentro do carro.
As
transições para a entrada das canções são bastante criativas, como o uso de
gotas de chuva para denotar o início de uma melodia ou os movimentos com as pás
dos coveiros servindo como instrumentos musicais. As canções originais do filme
não são exatamente daquelas que ficam na sua cabeça depois da sessão e te dão
vontade de cantar depois, mas funcionam bem no contexto da trama.
Assim
sendo, Sinfonia da Necrópole é um
musical divertido e bastante criativo sobre nossa relação com outras pessoas,
com a morte e com as nossas cidades.
Nota:8/10
Trailer:
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