Em seu vigésimo longa-metragem o
direto espanhol Pedro Almodóvar retorna ao seu universo costumaz das neuroses
femininas. Com uma trama sinuosa que muitas vezes flerta com o suspense
investigativo, este Julieta é
fundamentalmente uma história sobre intimista sobre perda, luto e culpa.
Baseado em três contos
interligados da escritora Alice Munro, a trama acompanha Julieta (Emma Suarez/
Adriana Ugarte) uma mulher que está prestes a deixar Madri para ir morar em Portugal
com o companheiro. Seus planos mudam quando ela encontra uma conhecida na rua e
recebe informações sobre a filha, Antía, que não via há mais de uma década,
descobrindo não só que ela está bem, como está casada e tem três filhos. Ao
descobrir tudo isso, ela desiste de viajar e começa a escrever uma "carta/diário"
contando sua vida com o pescador Xoan (Daniel Grao), pai de Antía, sua complexa
relação com a amante dele.
É uma narrativa sobre perda e
ausência, na qual muita coisa acontece off
camera, sutilmente sugerido ao invés de dito, quase como se Julieta
estivesse ausente de sua própria vida e visse seus desdobramentos à distância.
O filme caminha pelas memórias da protagonista como se nos guiasse por uma
investigação e a música ajuda a evocar essa sensação de mistério e suspense
quanto ao que levou o afastamento entre Julieta e a filha.
A filha, aliás, é sempre citada,
mencionada e explicada por outros, mas nunca aparece no presente e pouco é
vista nos flashbacks ao passado. O
incômodo de ouvirmos tanto a seu respeito sem vê-la ajuda a entender o
sentimento de perda e devastação de Julieta, mas as revelações envolvendo o
afastamento delas acaba soando como simples (ainda que crível) demais em
relação a tudo que a trama construiu.
A câmera de Almodóvar está boa
parte do tempo focada no rosto de Julieta e tanto Emma Suarez (que a interpreta
na maturidade) quanto Adriana Ugarte (que a vive na juventude) conseguem
transmitir o tormento emocional da personagem, consumida pelo luto, perda e
sentimento de culpa.
Os elementos visuais típicos da
filmografia do diretor também estão presentes, como as cores em tons intensos,
em especial os usos de vermelho, azul e verde (que refletem a intensidade de
emoções e afetos das personagens), passando por várias referências ao mundo da
arte. Apesar da competente condução de Almodóvar e do texto sutil e enigmático,
Julieta parece não ir muito além do
que a essa altura já é extremamente familiar ao diretor espanhol, não sendo tão
envolvente ou arrebatador quanto seus melhores trabalhos.
Nota: 6/10
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