terça-feira, 19 de julho de 2016

Crítica - A Lenda de Tarzan



Tarzan, criação mais famosa do romancista Edgar Rice Burroughs, já recebeu diversas adaptações para os cinemas, tanto com atores quanto em forma de animação. Este A Lenda de Tarzan tenta trazer o famoso personagem para um novo público, mas apesar de algumas qualidades, há aqui problemas demais para a experiência ser plenamente satisfatória.

A narrativa começa com Tarzan (Alexander Skarsgard), agora usando seu real nome, John Clayton III, já morando na Inglaterra e casado com Jane (Margot Robbie) depois de todas as aventuras vividas na selva. O personagem é levado a voltar à África quando recebe um convite do rei da Áustria para inspecionar suas colônias no Congo e verificar que não há escravidão ou maus-tratos aos nativos e à natureza. O que o protagonista não sabe é que tudo isso é uma armadilha do emissário do rei na colônia, Leon Rom (Christoph Waltz). Rom fez um acordo com o líder tribal Mbonga (Djimon Hounsou) para entregar Tarzan a ele em troca da permissão pela extração de diamantes de suas terras.

O ator Alexander Skarsgard faz uma ótima composição corporal do personagem. Com as mãos constantemente em concha, tal qual um primata, ombros projetados para frente, inflando as bochechas em momentos de raiva, tudo em sua linguagem corpórea remete a um animal. Margot Robbie traz seu carisma habitual para Jane, mas é prejudicada por um texto a faz passar boa parte do filme como refém do vilão. A narrativa até tenta construí-la como uma mulher forte e engenhosa, fazendo-a tentar escapar em algum momento e sempre respondendo às provocações Rom, tanto que ela chega a perguntar "você quer que eu grite como uma donzela?". Isso, no entanto, não muda o fato dela passar a grande maioria do filme como uma mera donzela em perigo a ser resgatada pelo herói. 

Christoph Waltz atua no piloto automático e entrega um vilão sem carisma e que não vai além do clichê do colonizador cruel e inescrupuloso. Samuel L. Jackson, por outro lado, torna seu George Washington Williams um parceiro bastante insólito para Tarzan e é responsável pelos momentos mais divertidos do longa.

As cenas de ação reforçam a força e a bestialidade de Tarzan, mas são prejudicadas pela câmera que parece não saber o que enquadrar e pela montagem abrupta que sequer da o mínimo de coesão espacial para algumas cenas. Um exemplo é a cena em que Tarzan é capturado pelo vilão e começa a ser carregado pela floresta. De repente os inimigos começam a cair mortos e um corte nos mostra George atirando neles, quando a câmera volta para os vilões eles já estão próximos de um barco em um rio sendo que no plano anterior deles não havia nenhum indicativo que eles sequer estavam perto da água ou de um barco.

Outro problema é o uso dos flashbacks que interrompem o fluxo da trama sem trazer nenhuma informação nova ou relevante. Em um dado momento Jane explica a George que o motivo de Mbonga querer Tarzan é por causa do herói ter matado seu filho anos antes, preenchendo a lacuna da motivação do vilão. Assim, quando o filme nos mostra posteriormente um flashback disso acontecendo, sentimos que a narrativa está apenas sendo redundante. O mesmo acontece com os flashbacks da juventude de Tarzan na selva, já que quando eles aparecem outros personagens já tinham dito aquelas informações.

Há também a questão de como o filme representa as populações nativas, que se mostram passivas à dominação estrangeira até que os heróis brancos aparecem para ensiná-los a se unir e lutar contra os colonizadores, quase como se eles fossem incapaz de fazerem isso por si mesmos (eles se unem apenas porque Jane diz a um deles para unir as tribos). É uma visão antiquada e colonialista que reproduz a visão anacrônica das populações africanas como predispostas a serem dominadas. Não estou dizendo que o filme é deliberadamente racista, mas na tentativa de reforçar o heroísmo e altruísmo dos seus protagonistas, acabou acidentalmente reproduzindo um discurso anacrônico que não cabe mais em pleno 2016.

O 3D não acrescenta nada à experiência, já que praticamente só as legendas são tridimensionais, desperdiçando o potencial do recurso em criar imagens vertiginosas e imersivas nas cenas em que Tarzan se balança nos cipós. Além disso ainda prejudica o filme em muitos momentos, pois várias cenas se passam em florestas durante a noite com pouca iluminação e as lentes escuras dos óculos tornam tudo ainda mais escuro. Os efeitos especiais são um pouco irregulares, os animais criados por computação gráfica são convincentes e seus pelos e escamas apresentam texturas bem realistas. Alguns cenários digitais, no entanto, são muito artificiais, como a cena em que Tarzan está em cima de um trem em movimento e fica claro que tudo ali não passa de um grande chroma key e o mesmo ocorre quando ele, George e um grupo de nativos caminham por entre os galhos das árvores procurando vinhas para se pendurarem.

A Lenda de Tarzan tinha potencial para ser uma boa releitura para trazer um personagem clássico a novas gerações, mas os problemas de roteiro e direção acabam não fazendo jus ao elenco carismático.

Nota: 5/10

Trailer:

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