Tarzan, criação mais famosa do romancista Edgar Rice Burroughs, já recebeu diversas adaptações para os cinemas, tanto com atores quanto em forma de animação. Este A Lenda de Tarzan tenta trazer o famoso personagem para um novo
público, mas apesar de algumas qualidades, há aqui problemas demais para a
experiência ser plenamente satisfatória.
A narrativa começa com Tarzan
(Alexander Skarsgard), agora usando seu real nome, John Clayton III, já morando
na Inglaterra e casado com Jane (Margot Robbie) depois de todas as aventuras
vividas na selva. O personagem é levado a voltar à África quando recebe um
convite do rei da Áustria para inspecionar suas colônias no Congo e verificar
que não há escravidão ou maus-tratos aos nativos e à natureza. O que o
protagonista não sabe é que tudo isso é uma armadilha do emissário do rei na
colônia, Leon Rom (Christoph Waltz). Rom fez um acordo com o líder tribal
Mbonga (Djimon Hounsou) para entregar Tarzan a ele em troca da permissão pela
extração de diamantes de suas terras.
O ator Alexander Skarsgard faz uma
ótima composição corporal do personagem. Com as mãos constantemente em concha,
tal qual um primata, ombros projetados para frente, inflando as bochechas em
momentos de raiva, tudo em sua linguagem corpórea remete a um animal. Margot
Robbie traz seu carisma habitual para Jane, mas é prejudicada por um texto a
faz passar boa parte do filme como refém do vilão. A narrativa até tenta
construí-la como uma mulher forte e engenhosa, fazendo-a tentar escapar em
algum momento e sempre respondendo às provocações Rom, tanto que ela chega a
perguntar "você quer que eu grite
como uma donzela?". Isso, no entanto, não muda o fato dela passar a
grande maioria do filme como uma mera donzela em perigo a ser resgatada pelo
herói.
Christoph Waltz atua no piloto
automático e entrega um vilão sem carisma e que não vai além do clichê do
colonizador cruel e inescrupuloso. Samuel L. Jackson, por outro lado, torna seu
George Washington Williams um parceiro bastante insólito para Tarzan e é
responsável pelos momentos mais divertidos do longa.
As cenas de ação reforçam a força
e a bestialidade de Tarzan, mas são prejudicadas pela câmera que parece não
saber o que enquadrar e pela montagem abrupta que sequer da o mínimo de coesão
espacial para algumas cenas. Um exemplo é a cena em que Tarzan é capturado pelo
vilão e começa a ser carregado pela floresta. De repente os inimigos começam a
cair mortos e um corte nos mostra George atirando neles, quando a câmera volta
para os vilões eles já estão próximos de um barco em um rio sendo que no plano
anterior deles não havia nenhum indicativo que eles sequer estavam perto da
água ou de um barco.
Outro problema é o uso dos flashbacks que interrompem o fluxo da
trama sem trazer nenhuma informação nova ou relevante. Em um dado momento Jane
explica a George que o motivo de Mbonga querer Tarzan é por causa do herói ter
matado seu filho anos antes, preenchendo a lacuna da motivação do vilão. Assim,
quando o filme nos mostra posteriormente um flashback
disso acontecendo, sentimos que a narrativa está apenas sendo redundante. O
mesmo acontece com os flashbacks da
juventude de Tarzan na selva, já que quando eles aparecem outros personagens já
tinham dito aquelas informações.
Há também a questão de como o
filme representa as populações nativas, que se mostram passivas à dominação
estrangeira até que os heróis brancos aparecem para ensiná-los a se unir e
lutar contra os colonizadores, quase como se eles fossem incapaz de fazerem
isso por si mesmos (eles se unem apenas porque Jane diz a um deles para unir as
tribos). É uma visão antiquada e colonialista que reproduz a visão anacrônica
das populações africanas como predispostas a serem dominadas. Não estou dizendo
que o filme é deliberadamente racista, mas na tentativa de reforçar o heroísmo
e altruísmo dos seus protagonistas, acabou acidentalmente reproduzindo um
discurso anacrônico que não cabe mais em pleno 2016.
O 3D não acrescenta nada à
experiência, já que praticamente só as legendas são tridimensionais,
desperdiçando o potencial do recurso em criar imagens vertiginosas e imersivas
nas cenas em que Tarzan se balança nos cipós. Além disso ainda prejudica o
filme em muitos momentos, pois várias cenas se passam em florestas durante a
noite com pouca iluminação e as lentes escuras dos óculos tornam tudo ainda
mais escuro. Os efeitos especiais são um pouco irregulares, os animais criados por
computação gráfica são convincentes e seus pelos e escamas apresentam texturas
bem realistas. Alguns cenários digitais, no entanto, são muito artificiais,
como a cena em que Tarzan está em cima de um trem em movimento e fica claro que
tudo ali não passa de um grande chroma
key e o mesmo ocorre quando ele, George e um grupo de nativos caminham por
entre os galhos das árvores procurando vinhas para se pendurarem.
A Lenda de Tarzan tinha potencial para ser uma boa releitura para trazer um personagem clássico a novas gerações, mas os problemas de roteiro
e direção acabam não fazendo jus ao elenco carismático.
Nota: 5/10
Trailer:
Nenhum comentário:
Postar um comentário