segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Crítica - Blindspot: 1ª Temporada

crítica Ponto Cego


crítica Ponto Cego primeira temporada
Uma sacola é deixada no meio de uma rua movimentada em Times Square, Nova Iorque, com uma etiqueta que pede para chamarem o FBI. Imediatamente se pensa em um atentado terrorista, todas as ruas são fechadas e uma unidade anti-bombas é chamada. Ao se aproximarem da sacola, percebem que algo se move dentro dela. A sacola é aberta e de dentro dela sai uma mulher completamente nua, com o corpo coberto por tatuagens que parecem ser recentes e sem nenhuma memória de quem é ou como foi parar ali. As tatuagens parecem conter mensagens sobre crimes e conspirações em progresso ou prestes a acontecer, então o FBI resolve manter a mulher, apelidada de Jane (Jamie Alexander), por perto, principalmente quando ela demonstra experiência em combate, dando a impressão de que ela pode ter sido militar ou membro de alguma agência de inteligência. É com essa premissa cheia de mistério e intriga que inicia a primeira temporada de Blindspot. SPOILERS a partir deste ponto.

Tudo bem, a ideia do indivíduo sem memórias que descobre ser um super agente envolvido em conspirações que mal consegue entender não é exatamente novidade, A Identidade Bourne (2002) que o diga. Ainda assim Blindspot consegue criar um jogo de intrigas que realmente consegue manter a atenção. A trama consegue nos manter incertos quanto ao que está realmente acontecendo quais são os planos para as tatuagens de Jane, tanto os que o FBI tem para ela, quanto os da misteriosa organização que as fez.

Em alguns momentos as tatuagens parecem um bem intencionado aviso sobre crimes que estão acontecendo, mas em outros, principalmente quando os membros da misteriosa organização entram em contato com Jane, elas parecem uma isca para comprometer o FBI. Há um senso constante de que existem forças maiores do que os personagens em jogo, manipulando os eventos e tentando moldar a situação. Inclusive tanto os membros da misteriosa organização que tatuou Jane quanto um sombrio agente da CIA com muito a esconder constantemente tentam abordar, chantagear ou intimidar os membros da equipe de Jane, colocando em xeque as lealdades de cada um deles.

Jamie Alexander (a Lady Sif dos filmes do Thor) é ótima como Jane, uma mulher simultaneamente poderosa e insegura. Alguém que a despeito de suas muitas habilidades físicas e mentais, sente-se fragilizada por não saber quem é e o que exatamente lhe aconteceu. Como já disse, não é exatamente um personagem original, mas Alexander é competente o bastante para tornar Jane uma figura intrigante.

O mesmo no entanto, não pode ser dito do restante dos membros da equipe. O grupo é liderado pelo agente Kurt Weller (Sullivan Stapleton, o Temístocles de 300: A Ascensão do Império) e ele é estoico e durão, mas nada além disso. Stapleton confere intensidade ao personagem, mas não há muito ali exceto pela coleção de clichês do sujeito durão, retraído emocionalmente e com um trauma do passado. Os agentes Reade (Rob Brown) e Zapata (Audrey Esparza) não tem muito espaço para desenvolver suas personalidades e seus arcos também são cheios de lugares-comuns, como o relacionamento amoroso de Reade prejudicado pelo seu trabalho (principalmente quando ameaças de morte são feitas à sua namorada) ou o vício em jogo de Zapata, que obviamente a coloca em maus lençóis.

Melhor sorte tem Marianne Jean-Baptiste faz a durona diretora do FBI Bethany Mayfair, alguém que apesar da imagem íntegra esconde vários segredos que podem arruiná-la e seu arco é um dos poucos interessantes ao tratar do dilema moral da personagem. Já Ashley Johnson (a voz da Ellie de The Last of Us) é adorável como como a energética e inteligente Patterson, responsável pela parte técnica das investigações e por dar suporte ao grupo. Seu arco envolvendo os problemas no seu relacionamento por causa da investigação das tatuagens começa bem clichê, mas aos poucos vai se tornando interessante quando toma alguns rumos inesperados e ela precisa lidar com a própria culpa e luto.

A temporada tenta equilibrar uma estrutura de "caso da semana" com um arco narrativo maior envolvendo a busca de Jane por seu passado, mas nem sempre consegue equilibrar as duas coisas. Alguns episódios trazem casos interessantes e desenvolvimentos significativos do arco maior, mas outros não conseguem fazer a trama principal andar ou não constroem um "caso da semana" interessante (ou falham nos dois). Aqui e ali temos algumas experimentações interessantes, como o episódio do tiroteio na universidade que mostra os eventos do ponto de vista de um determinado personagem, depois volta para contar a história sob a visão de outro e assim vai montando o quebra-cabeça do que está acontecendo.

Incomoda também o foco excessivo em relacionamentos amorosos, principalmente no quanto a narrativa pesa no sentimentalismo ao abordar a relação entre Kurt e Jane. O envolvimento dos dois não convence (em parte por Kurt ser um personagem tão vazio) e parece acontecer mecanicamente, por pura conveniência de roteiro. Piora quando tenta criar um triângulo e depois um quadrado amoroso, inserindo interesses românticos alternativos para os dois, mas deixa óbvio que esses interesses românticos secundários existem somente para tentar criar atrito entre o casal principal.

A temporada traz algumas cenas de ação bem engendradas, embora o excesso de cortes prejudique em alguns momentos. O uso de uma câmera tremida cheia de zoom ins e zoom outs quando não há ação ocorrendo e os personagens estão parados conversando entre si incomoda bastante. A intenção parece ser conferir mais "realismo" aos eventos, dando a impressão de que há um cameraman seguindo os personagens em tempo real e se ajustando ao que acontece durante as filmagens, mas o efeito é o exato oposto. Nem mesmo documentários que seguem seus objetos sem saber o que vai acontecer apresentam hoje esse tipo de enquadramento que balança para todos os lados e o uso disso aqui deixa claro que essa escolha é um dispositivo artificial para forçar uma impressão de maior "realismo". Ou então muitos episódios foram filmados com operadores de câmera que nunca fizeram isso na vida e estavam completamente bêbados durante o expediente.

O final da temporada consegue amarrar bem os mistérios construídos ao longo dos 23 episódios, oferecendo respostas satisfatórias (ainda que algumas sejam previsíveis) ao mesmo tempo que deixa algumas perguntas no ar para nos manter engajados em uma segunda temporada. Há uma sugestão de que o escopo das conspirações pode ser ainda mais amplo, o que é uma faca de dois gumes. Por um lado é compreensível que se queira dar uma sensação de risco, dificuldade e ameaça constante pairando sobre os personagens, por outro criar conspirações cada vez maiores é uma receita fácil de perder a mão, podendo tudo descambar para um exagero risível. De todo modo, o desfecho me manteve interessado o suficiente para acompanhar uma segunda temporada.

A primeira temporada de Blindspot funciona graças a sua interessante protagonista e o manejo competente do mistério e do suspense. Tem alguns problemas de ritmo e um elenco secundário preso em convenções, mas consegue satisfazer quem está à procura de uma boa trama de intrigas.


Nota: 6/10

Trailer

Nenhum comentário: