Capitão Fantástico parecia aquele filme indie padrão sobre uma família excêntrica e desajustada tentado
lidar com as coisas banais do "mundo real", aprendendo não só a
preencherem as lacunas que faltam, mas também a abraçar a própria esquisitice.
Na verdade ele é exatamente isso, mas funciona pelo fato de evitar maniqueísmos
fáceis e não glorificar demais seus personagens, apontando suas falhas e
contradições e permitindo que eles lidem com isso.
Ben (Viggo Mortensen) é um homem
que vive em uma casa na floresta com seus seis filhos. Ele os educa em casa,
ensinando filosofia, política, física e todas as outras disciplinas acadêmicas,
assim como também os ensina a caçar, rastrear e a se virarem na natureza.
Quando sua esposa, que estava internada para tratar de seu distúrbio bipolar,
comete suicídio, ele decide viajar para o enterro, mesmo contrariando o sogro
(Frank Langella) que ameaça prendê-lo caso apareça, já que ele culpa o estilo
de vida alternativo deles como responsável pelo que aconteceu com a filha.
A estrutura lembra um pouco Pequena Miss Sunshine (2006), com essa
família desajustada cruzando o país e sendo obrigada a lidar com sentimentos
que há muito vinham sendo calados. A viagem também vai mostrando o quão
despreparados os filhos de Ben são em lidar com o mundo e as pessoas, à
despeito de todo o conhecimento que possuem. Assim, a utopia em que eles
pareciam viver vai aos poucos sendo desfeita conforme as contradições de Ben
vão sendo confrontadas.
Viggo Mortensen faz de Ben um
homem de valores bem definidos e estritos e que genuinamente pensa que seu
estilo de vida é o melhor. Sua postura e lugar de superioridade moral em que se
coloca, no entanto, por vezes o faz agir com certa soberba e conforme vai
percebendo que seus filhos não são tão adequados para o mundo como pensava, vai
aos poucos enchendo ele de dúvida quanto ao que está fazendo, principalmente
agora sem a esposa.
O filme acerta ao não vilanizar o
avô, que é mostrado como alguém com um afeto real pelos netos e que quer o
melhor para eles. Ainda que a dor da perda da filha o faça culpar Ben por tudo,
ele nunca é alguém que apenas quer prejudicar o protagonista, mas alguém que,
assim como o próprio Ben, tenta fazer aquilo que julga ser o melhor para sua
família. Aqui e ali temos algumas observações sobre o consumismo nos Estados Unidos
e como isso é algo alienante e pouco saudável, inclusive com uma reação
engraçada por parte das crianças ao se espantarem com a quantidade de obesos
nas ruas.
Ocasionalmente, como muitos
filmes indie similares, a narrativa
chega a pesar a mão para ressaltar a esquisitice e o estatuto de desajustados
da família, o que rende alguns momentos cheios de artificialidade. Um exemplo é
a cena em que o ônibus de Ben é parado por um policial e ele pergunta o motivo
daquelas crianças não estarem na escola. Ele poderia tranquilamente dizer que
os estava levando para o funeral da mãe, policial algum provavelmente faria
objeção a isso, mas ao invés disso, os filhos dele fingem ser fanáticos
educados em casa, entoando versos da bíblia e cânticos religiosos. É como se o
filme berrasse para nós "olhem como eles são pouco convencionais e
bizarros" sem nenhuma sutileza.
Assim, Capitão Fantástico acaba funcionando por suas ponderações sobre a
sociedade de consumo e a performance cuidadosa de Viggo Mortensen, ainda que faça
pouco para se distinguir de filmes com abordagem similar.
Nota: 7/10
Trailer:
Gosto dessa artificialidade para a esquisitice indie. Tem seis exageros, mas gostei demais desse filme.
ResponderExcluirOlha, há diferentes níveis de artificialidade. Uma coisa é a artificialidade no nível da encenação, como os planos ultra simétricos do Wes Anderson, que te lembram "isso é um filme", "há um diretor manipulando isso". Outra coisa é ter um roteiro ou construção de personagem artificial, porque aí eles deixam de ser "pessoas possíveis" para se tornarem caricaturas exageradas com as quais fica difícil aderir, principalmente quando o filme demonstra querer sim que eu cole nesses personagens e torça por eles.
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