Ainda hoje o primeiro Trainspotting: Sem Limites (1996) é um
dos filmes mais marcantes da carreira do diretor Danny Boyle. Há anos se fala
em uma continuação, principalmente depois que Irvine Welsh, autor do livro
homônimo que inspirou um filme, lançou em 2002 uma continuação intitulada Porno. Parecia uma questão de tempo até
que os personagens voltassem aos cinemas, mas uma série de problemas (incluindo
uma briga entre o ator Ewan McGregor e Danny Boyle, que ficaram anos sem se
falar) seguraram o desenvolvimento do projeto. Com esse T2 Trainspotting chegando aos cinemas cerca de quinze anos depois
das primeiras tentativas, ficava a questão se ainda havia algo de relevante a
ser dito com aqueles personagens.
Depois de deixar seus amigos e o
país no fim do primeiro filme, Renton (Ewan McGregor) retorna à sua cidade
Natal e reencontra os antigos amigos Spud (Ewen Bremner) e Simon "Sick
Boy" (Jonny Lee Miller). Depois de vinte anos Spud continua viciado em
heroína e enfrenta problemas por causa disso, tendo se distanciado da esposa e
do filho. Simon ainda tenta viver de pequenos golpes, consumindo drogas e ainda
agindo e se achando um jovem descolado e imaturo apesar de já ter passado dos
quarenta. Renton parece estar com a vida no lugar, mas na verdade não está tão
bem assim e decide ajudar Simon em seu esquema para montar um bordel. Ao mesmo
tempo, o perigoso Begbie (Robert Carlyle) foge da cadeia e busca vingança
contra Renton.
O filme funciona mais como um
grande epílogo ou apêndice ao filme original ao invés de uma continuação
plenamente realizada. O primeiro Trainspotting
é daqueles poucos filmes que são a síntese de uma geração e resistem ao tempo
justamente por capturarem a essência e a verdade daquilo que observa.
Obviamente esse é um feito grande e difícil demais para ser reproduzido, então
é de se esperar que ele não tenha o mesmo impacto e força do original, conforme
o filme confronta esses personagens com as consequências das escolhas que
tomaram.
Renton se tornou um homem um
homem cínico e inseguro, que não entende como sua vida acabou levando-o de
volta à estaca zero. Spud também tenta se reencontrar e retomar o controle de
sua vida, mas ao invés de recorrer aos antigos esquemas, tenta fazê-lo por vias
honestas. Já Simon e Begbie continuam as mesmas pessoas que eram antes, tendo
aprendido praticamente nada com a passagem do tempo, mas aos poucos vão
ganhando ciência do quanto se tornaram patéticos.
De maneira pontual a narrativa consegue
exibir a mesma contundência crítica e verve contracultural do original. Ele
fala da ascensão do conservadorismo na Grã-Bretanha na divertida cena em que
eles invadem um clube conservador, da processo de gentrificação das cidades
através da tentativa de Renton e Simon em vender seu "empreendimento"
como algo que vai restaurar a vizinhança e, claro, no momento em que Renton
apresenta a Veronika (Anjela
Nedyalkova) uma versão atualizada de seu discurso "escolha a
vida", criticando o consumismo, redes sociais e todos os hábitos
cotidianos que usamos para nos entorpecer.
Apesar de lento e demorar de
apresentar qual será o ponto central de sua trama (o esquema do bordel surge
com quase uma hora de projeção), a direção de Boyle continua a instilar euforia
através da montagem e da fotografia, criando imagens que simulam o torpor de
seus personagens (como quando Renton e Simon usam heroína pela primeira vez
depois de anos sem consumi-la). Seu uso da música evoca a sensação de constante
energia que as músicas usadas no primeiro traziam, ao mesmo tempo usar faixas
do The Clash, Blondie e outros só deixa claro o quanto esses personagens estão
parados e presos ao passado. Como não podia deixar de ser, também reutiliza as
canções Lust For Life de Iggy Pop e Born Slippy do Underworld que marcaram o
original.
Trainspotting 2 ecoa o passado e coloca seus personagens para
dialogar com ele e entender como isso os moldou. Às vezes soa como algo
demasiadamente apegado ao que passou e que pouco olha para frente e logicamente
não tem o impacto do filme original, mas ainda assim consegue revisitar e
desenvolver seus protagonistas de uma maneira consistente.
Nota: 6/10
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