Chegando nessa terceira temporada
de Flash, eu torcia para que a série
não tivesse a mesma queda de qualidade que Arrow
experimentou em seu terceiro ano. As duas primeiras temporadas tinham sido bem
bacanas e seria uma pena deixar o nível cair, mas, infelizmente, foi isso que
aconteceu. Não chegou a ser algo intragável como a terceira e quarta temporadas de Arrow, mas ainda assim ficou bem
aquém do que se esperava da série, principalmente conforme ela se dirigia para
abordar de algum modo o arco Ponto de
Ignição (Flashpoint) dos
quadrinhos. Avisamos que o texto a seguir contem SPOILERS.
A trama começa justamente com
Barry (Grant Gustin) impedindo o assassinato da mãe e criando uma nova
continuidade na qual ela está viva e ele nunca virou Flash ou conheceu a equipe
do Star Labs. Aos poucos ele vai percebendo que cometeu um erro ao alterar o
fluxo dos eventos e tenta consertar tudo, mas ao retornar as coisas ao seu
devido lugar, percebe que nem tudo foi restaurado. Em seu novo presente ele e
Iris nunca ficaram juntos, o irmão de Cisco (Carlos Valdes) está morto e um
novo vilão chamado Alquimia está dando poderes àqueles que eram meta-humanos no
universo alternativo criado por Barry. Além disso, Alquimia parece estar
trabalhando para alguém ainda mais nefasto, o autoproclamado deus da velocidade
Savitar.
Repetindo o que já foi feito
Se você esperava que a temporada
inteira fosse girar ao redor do Ponto de Ignição, saiba que isso é resolvido
praticamente já no primeiro episódio da temporada. Tudo bem que as
consequências continuam ao longo dos demais episódios, mas ainda assim parece
um grande desperdício de uma das mais memoráveis tramas do Flash nos
quadrinhos. Do mesmo modo, ao trazer mais uma vez um vilão principal que é um
poderoso velocista que odeia Barry e quer mostrar ao multiverso que é mais o
mais rápido, a trama soa como uma reciclagem de tudo que já vimos nas duas
temporadas anteriores. A corrida contra o tempo para salvar Iris (Candice Patton)
mais uma vez coloca Barry para impedir um evento que pode mudar sua vida para
sempre, apenas substituindo a alteração do passado (o assassinato da mãe) pela
alteração do futuro, mas novamente soa como uma repetição de elementos
familiares.
Os vilões
Não ajuda que o vilão Savitar não
tenha conseguido soar interessante durante boa parte da temporada. O seu visual
mais parecia um design rejeitado para
um filme dos Trasformers e soava como
algo que se esforçava demais para nos dizer "olhem pra mim! olhem como sou
malvado e poderoso!". A narrativa também demorou demais para explicitar
sua motivação, fazendo-o parecer um vilão sem personalidade que apenas queria
derrotar o herói, e quando ela finalmente é revelada, uma trama de vingança bem
tradicional, soa como algo muito simples que não valia tanto mistério. Alquimia
acaba sendo uma oportunidade desperdiçada de trazer um vilão diferente, já que
ele é rapidamente estabelecido como um mero servo de Savitar e o segredo sobre
sua identidade acaba sendo relativamente óbvio uma vez que Julian (Tom Felton)
era o único novo personagem na trama.
A transformação de Caitlin
(Danielle Panabaker) na vilã Nevasca, por sua vez, acaba sendo súbita demais,
com ela desenvolvendo uma espécie de personalidade alternativa maligna no instante
em que recebe seus poderes. Ainda assim oferece conflitos mais interessantes
que os de Savitar ao colocar a equipe Flash para enfrentar um dos seus e sem
saber exatamente como fazer isso. O fato de estarem enfrentando alguém cuja
amizade foi construída ao longo dos dois anos anteriores dava mais peso aos
embates com ela, principalmente porque Barry e Cisco ainda hesitavam em usar
toda sua força para enfrentá-la e ainda tentavam protegê-la, chegando a ocultar
evidências da polícia, por reconhecerem que a amiga ainda estava ali em algum
lugar. Inclusive, conforme a história foi chegando ao fim, a narrativa foi
oferecendo pequenos vislumbres que a velha Caitlin ainda existia em Nevasca,
ajudando a torná-la menos maniqueísta e lhe dando seus próprios dilemas para
enfrentar. Chego a pensar que ela renderia uma "vilã de temporada"
mais interessante que o genérico e repetitivo Savitar.
Os "vilões da semana"
continuam sendo meros pedaços de carne para a Equipe Flash bater e a essa
altura eu já devia ter aceitado que é assim que a série opera, mas não deixa de
ser desapontador o tratamento raso dado antagonistas como o Mestre dos Espelhos
e Abra Kadabra. Ocasionalmente, no entanto, a série consegue criar boas tramas
com vilões recorrentes, como o retorno de Grodd e também uma nova aparição do
Capitão Frio (Wentworth Miller). Miller sabe usar a medida certa de exagero e
canastrice na sua composição de Leonard Snart e acaba fazendo do personagem um
antagonista divertido, principalmente por demonstrar que ele nutre um certo
respeito pelo Flash.
Os heróis
Grant Gustin é habitualmente
carismático como Barry, mas aqui fica limitado por um texto que faz o
personagem ficar sorumbático e sisudo durante boa parte da temporada. É
compreensível que ele fique preocupado com o futuro dada a sua visão sobre
Iris, mas ele se torna quase que outro personagem aqui. Felizmente a série
percebe isso e aos poucos vai fazendo o personagem voltar ao otimismo e leveza
de antes nos últimos episódios, em especial o episódio em que ele tem amnésia
que serve para lembrar que é exatamente essa bondade e olhar positivo que
tornam o personagem singular.
Gustin continua exibindo uma
ótima química com o restante do elenco, em especial pela relação paternal
afetuosa e sincera que tem com Joe (Jesse L. Martin) e sua amizade com Cisco,
que é posta à prova quando ele revela que suas ações no Ponto de Ignição
causaram a morte do irmão de Cisco. O ator tambpem teve a oportunidade de
reviver seus dias na série Glee no
divertido episódio musical que serviu de crossover
com a Supergirl (Melissa Benoist, que também foi de Glee) na qual os dois heróis são jogados em uma realidade
alternativa pelo vilão Music Meister (Darren Criss, igualmente oriundo de Glee).
Quem continua sendo o ponto alto
da série é Tom Cavanagh e seus múltiplos personagens, adicionando mais um nesta
temporada em H.R, outro Wells do multiverso. Diferente dos outros Wells
(Wellses?), no entanto, H.R não é efetivamente um cientista, nem é exatamente
um sujeito, mas acaba encontrando sua própria maneira de ajudar o time.
Cavanagh é bem eficiente em criar sujeitos distintos, fazendo de H.R alguém
mais expansivo e enérgico do que as versões mais sérias e compenetradas de
Wells. O personagem acaba construindo uma relação com Cisco que opera no oposto
das ele teve com os Wells anteriores. Se antes eram os Wells que tinham algo a
ensinar para Cisco, agora é Cisco que precisa ensinar H.R a encontrar seu
valor. O arco de H.R acaba sendo justamente esse, o de encontrar um lugar entre
aquelas pessoas extraordinárias e se fazer útil para elas, algo que ele leva às
últimas consequências no que deve ser um dos momentos mais emocionantes do
final dessa temporada.
Iris, por outro lado, é mais uma
vez reduzida a um mero objeto de afeto e uma donzela em perigo a ser resgatada,
não tendo muito o que fazer ao longo da temporada. O fato de ser ela que dá o
golpe de misericórdia no vilão acaba não sendo o suficiente para compensar o
papel passivo que ela teve durante toda temporada. Igualmente mal aproveitado é
Joe, que fica preso em uma subtrama romântica que pouco acrescenta à série e
eventualmente cai no clichê dele tentar terminar com ela para protegê-la dos
perigos de sua vida, o que acaba não durando muito. Wally (Keiynan Lonsdale)
finalmente ganha seus poderes de Kid Flash, mas se inicialmente a trama aponta
que ele será essencial para a derrota de Savitar, com o tempo o personagem
acaba deixado de lado e acaba tendo pouco a fazer além do romance
apressadamente desenvolvido com Jesse Quick (Violett Beane).
Enquanto isso Tom Felton se
mostra uma boa adição ao grupo. Seu Julian inicialmente funciona um colega de
trabalho que antagoniza Barry e se tem alguém que sabe interpretar o rival
invejoso e amargurado de um herói é o eterno Draco Malfoy de Harry Potter (e
como coincidência pouca é bobagem, Julian até se envolve uma busca pela Pedra
Filosofal). Eventualmente ele se junta à equipe Flash, formando uma nova
dinâmica no grupo pelos seus modos secos e falta de traquejo, além da
proximidade crescente com Caitlin. A relação entre ele e Caitlin, por sinal, é
bem mais orgânica e crível do que o romance entre a médica de Jay (Teddy Sears)
na temporada anterior, já que o trauma de ambos em serem controlados por forças
malignas acaba aproximando-os.
O final de temporada
Conforme a temporada foi se
aproximando ao fim e as explicações sobre Savitar começaram a aparecer, a
narrativa foi perdendo o controle de toda a sua construção sobre viagens no
tempo e universos alternativos ao ponto que parecia que qualquer coisa estava
valendo e "Força da Aceleração" virou uma muleta narrativa para resolver
qualquer coisa de qualquer jeito. Isso inclui o episódio final quando Savitar é
impedido de matar Iris e ainda assim não desaparece, tendo algum tempo extra,
sabe-se lá porque, antes de ser apagado da existência.
O embate final com Savitar, por
outro lado, acabou sendo mais satisfatório que o decepcionante confronto com
Zoom na temporada anterior, com Barry, Wally e Jay Garrick (John Wesley Shipp)
enfrentando Savitar enquanto Cisco e Cigana (Jessica Camacho) lutavam contra
Nevasca. Ainda que ocasionalmente alguns "dublês digitais" soem um
pouco artificiais, a série continua a apresentar efeitos especiais
relativamente bons para uma produção televisiva, incluindo os personagens
completamente computadorizados como Grodd e Tubarão Rei.
Com muita coisa parecendo uma
repetição de temporadas anteriores, um vilão desinteressante e muitos
personagens mal aproveitados, a terceira temporada de Flash só funciona pelo carisma dos protagonistas e o laço sincero
de amizade que vai construindo entre eles. Só resta torcer para que a próxima
temporada seja melhor.
Nota: 6/10
Trailer
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