Depois da ótima ficção-científica
Expresso do Amanhã e suas ponderações
sobre as relações de poder que pautam a sociedade, o diretor Bong Joon-Ho volta
a flertar com ficção-científica para produzir um comentário social neste Okja. Dessa vez ele volta suas atenções
para a indústria alimentícia através de uma típica história sua uma criança e
seu animal/criatura de estimação.
A trama se passa em um futuro
próximo, quando uma empresa, liderada por Lucy Mirando (Tilda Swinton),
descobre uma nova espécie de leitão gigante, que requer pouco alimento e deixa
pouca excreção. O animal tem potencial de revolucionar a pecuária e como
estratégia de divulgação, a empresária espalha seis espécimes em 26 países ao
redor do mundo para que em dez anos, quando os animais estiverem crescidos,
decidam qual o melhor e façam uma grande apresentação do animal. Dez anos
depois, a garota Mikha (Seo-Hyun Ahn) vive nas montanhas da Coreia do Sul ao
lado do avô e sua superleitoa Okja. Quando Okja é declarada a vencedora da
competição Mikha acaba indo junto para Nova Iorque, mas se vê no meio do embate
entre a empresa de Mirando e um grupo de ativistas por direitos dos animais.
O filme não tem pressa em começar
estabelecendo o laço entre a garota e a leitoa, deixando claro o quanto o
animal significa pela menina e o afeto que ela tem pela criatura. Essa calma na
construção será importante, já que a partir do momento em que Okja é levada
para os Estados Unidos, a coisa começa a se mover muito mais rápido. Como os
momentos de maior peso dramático se baseiam nos sentimentos da garota pela
leitoa, seria difícil que o filme funcionasse sem que percebêssemos esse afeto
de maneira tão palpável no início. Essa adesão à dupla principal é resultado
também da energia e sinceridade da garota Seo-Hyun Ahn, bem como os competentes
efeitos especiais que criam Okja.
Há um claro viés farsesco no modo
como Joon-Ho conduz sua narrativa, da música ágil que muitas vezes parece
evocar humor e ironia, passando pelas caracterizações exageradas dos ativistas
e dos empresários. Tilda Swinton faz de Lucy uma mulher imatura e desesperada
por atenção e seus figurinos infantilizados e enormes dentes brilhantes
contribuem para essa caricatura. Do mesmo modo, o biólogo interpretado por Jake
Gyllenhaal é um sujeito igualmente patético com sua voz aguda, sempre vestindo
shorts e a mesma necessidade por atenção. Nem mesmo os ativistas escapam desse
senso de ridículo que o filme busca imprimir em seus personagens, com um deles
sendo tão radical em sua recusa por alimentos vindos das grandes produtoras que
fica às portas de desmaiar de fome.
Conforme a trama se aproxima do
desfecho, no entanto, vai deixando a abordagem farsesca de lado conforme eles
invadem as fazendas de Mirando para resgatar Okja. Nesse momento, o filme adota
um tom mais sério e denuncista para falar sobre o modo como a carne animal é
produzida e comercializada, tentando também fazer os vilões, em especial a irmã
de Lucy (também Tilda Swinton) em figuras ameaçadoras. É compreensível que o
filme abandone a farsa ao mostrar imagens de maus tratos contra animais, afinal
tudo é deprimentemente próximo demais da realidade para ser tratado como
deboche, mas ainda assim parece que entramos em um filme completamente
diferente quando isso acontece, dada a brusca variação tonal, fazendo as ideias do filme perderem parte de seu impacto e força.
Assim sendo, Okja acerta na construção emocional entre a menina e sua leitoa,
pincelando essa jornada com um olhar crítico sobre o capitalismo industrial,
embora o tom do filme nem sempre se mantenha consistente.
Nota: 7/10
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