Depois do maravilhoso A Árvore da Vida (2011), o diretor
Terrence Malick parece ter se reduzido a uma paródia de si mesmo, transformando
seu estilo de narrativa em uma série de cacoetes a serem repetidos
exaustivamente mesmo que ele não tenha muito o que fazer ou dizer com eles. Já
tinha acontecido no pretensioso e vazio Amor
Pleno (2012) e no intragável Cavaleiro
de Copas (2015). O trailer deste De
Canção em Canção dava a impressão que talvez o diretor fosse retornar à boa
forma de antes, mas o resultado apenas sedimenta sua fixação por meramente
repetir aqueles maneirismos que a essa altura já cansaram.
A trama gira em torno do
"quadrado" amoroso envolvendo o produtor musical Cook (Michael
Fassbender), o músico BV (Ryan Gosling), a aspirante a cantora Faye (Rooney
Mara) e a professora Rhonda (Natalie Portman), mostrando as idas e vindas nos
relacionamentos entre esses personagens. Se você conhece o cinema de Malick, no
entanto, sabe que a trama em si é o que menos importa nos filmes do diretor, já
que o interesse dele é mais produzir provocações e ponderações sobre a natureza
das relações humanas (nesse filme mais sobre namoros e relações afetivas) do
que contar uma história.
Tudo é estruturado de maneira bem
semelhante aos filmes mais recentes do diretor, com uma montagem fragmentada e
rápida, quase que chamando atenção para sua própria artificialidade, sobrepondo
esses fragmentos de imagens com narrações dos próprios personagens, dando a
impressão que estamos vendo o fluxo de consciência daquelas pessoas como se
aquelas imagens e frases seguissem o raciocínio deles e como eles veem e
lembram dos eventos.
Apesar da montagem chamar atenção
para seus próprios artifícios, a câmera de Malick tende a filmar seus
personagens de maneira bastante naturalista, quase como se nos colocasse como
espectadores de um cotidiano real. O elenco é particularmente eficiente em
transmitir esse naturalismo, exibindo uma boa química entre si e através de
suas atuações transmitem muitos dados sobre seus personagens que a narrativa
não dá diretamente. Além disso Ryan Gosling faz valer as aulas de piano que
tomou para fazer La La Land: Cantando Estações (2017) ao aparecer tocando em várias cenas.
A questão é que diferente da
complexa relação do homem com a criação retratada em A Árvore da Vida ou do homem com a guerra em Além da Linha Vermelha (1998), o que Malick tem a dizer sobre
relações afetivas e como elas são difíceis, incoerentes e buscamos no outro
algo que nos falta não é suficiente para sustentar as mais de duas horas de
filme. Antes mesmo que chegue à marca de uma hora já é possível depreender o
que o cineasta tem a dizer e a partir daí o filme passa a correr atrás do
próprio rabo e repete declaração atrás de declaração sobre a incompletude do
homem e como procuramos um sentimento que seja real e nos dê propósito. Toda
vez que você pensa que ele já disse isso de todas as maneiras possíveis, o
filme consegue te surpreender e acha mais outras formas de continuar reiterando
significados que você cansou de saber ao ponto que eu temi que o filme
simplesmente nunca fosse acabar.
Tudo isso é piorado pela natureza
excessivamente expositiva das narrações dos personagens que mastigam de maneira
bem óbvia aquilo que o filme tenta dizer e ocasionalmente chegando ao cúmulo de
descrever aquilo que é claramente possível ver através das imagens. Deste modo,
o filme acaba se tornando um insuportável exercício de paciência.
Ainda há uma tentativa de tecer
uma crítica ao meio do entretenimento, especialmente a música, que é foco do
filme. Há um discurso sobre como toda aquela fama, dinheiro e extravagâncias
não passa de uma performance feita para vender um ideal de sucesso e felicidade
que é simplesmente falso e encenado e que reduz as pessoas a produtos ou meros
atos performáticos. É uma ideia que poderia render algo interessante, mas assim
como o discurso sobre relações amorosas é desperdiçada (assim como a
participação de músicos como Iggy Pop e os integrantes do Red Hot Chilli
Peppers, todos interpretando a si mesmos) ao simplesmente ficar batendo nas
mesmas ideias do início ao fim sem a sensação de que o raciocínio desenvolvido
está indo a algum lugar.
Como de costume na filmografia de
Malick, as imagens da natureza são uma presença constante no filme. Filmada com
reverência, majestade e uma certa dose de encantamento e mistério, a natureza
parece ser para Malick o caminho para ser humano alcançar sua plenitude e
equilíbrio em sua vida. Através da comunhão e do contato com a natureza as
pessoas são capazes de se lembrarem da sua essência e compreender o que lhes é
importante. A questão é que o diretor já disse tudo isso (e melhor) em
trabalhos anteriores como os já citados Além
da Linha Vermelha, A Árvore da Vida ou
mesmo O Novo Mundo (2005). Sim, há um
inegável valor lírico e estético nas imagens construídas pelo filme, mas não é
o suficiente para afastar a sensação de que o filme não tem nada a dizer sobre
elas além de reiterar ideias manjadas.
Cansativo, redundante e raso ao
explorar os temas propostos, De Canção em
Canção mostra que Terrence Malick parece, a despeito da beleza plástica de
suas imagens, ter se tornado refém de seus próprios maneirismos
Nota: 5/10
Trailer
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